CONSULTA Nº 008/2011

EMENTA: CONSULTA. DESCARACTERIZAÇÃO. A APRESENTAÇÃO DE CONSULTA RELATIVA À MATÉRIA QUE SEJA OBJETO DE MEDIDA DE FISCALIZAÇÃO JÁ INICIADA, SOB A MODALIDADE DE ACOMPANHAMENTO, NÃO ATENDE O REQUISITO PREVISTO NO ARTIGO 152-C, INCISO III, ALÍNEA “E”, DO REGUMENTO DAS NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO, DO ESTADO DE SANTA CATARINA. EM FACE DA SUA INADMISSIBILIDADE, O MÉRITO DO PEDIDO NÃO PODE SER ANALISADO E, POR CONSEQUÊNCIA, A CONSULTA NÃO PRODUZ OS EFEITOS PRÓPRIOS DO INSTITUTO.

DOE de 15.04.11

01 - DA CONSULTA

A Consulente tem como atividade principal o comércio atacadista de produtos alimentícios em geral e é detentora de regime especial de tributação, autorizando a importação de mercadorias com diferimento do ICMS e, respectivamente, crédito presumido a ser apropriado por ocasião das saídas subseqüentes para comercialização, com base no artigo 10, do Anexo 3 e artigo 15, inciso IX, do Anexo 2, ambos do Regulamento do ICMS/SC.

Declara preliminarmente que a consulta não se enquadra nos impedimentos do artigo  152-C, do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário – RNGDT/SC.

Esclarece que em face das suas atividades comerciais, realiza habitualmente importações e aquisições de mercadorias no mercado interno, as quais são comercializadas no território nacional ou exportadas.

Como a Consulente é detentora de regime especial que a permite apropriar-se de crédito presumido, calculado sobre o valor do imposto devido por ocasião das saídas, requer manifestação acerca da possibilidade de utilizar, cumulativamente com este benefício, outros créditos decorrentes de entradas de bens e mercadorias no estabelecimento. Destaca que o pedido tem por fundamento a absoluta inexistência de vedação na Legislação Tributária do Estado de Santa Catarina, para utilizar os referidos créditos na conta gráfica a título de abatimento do valor dos débitos relativos às operações de saídas.

A consulta foi informada pela GERFE de origem, conforme determina o artigo 152-B, § 2°, II, do RNGDT/SC, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984. A autoridade fiscal informante demonstra que a Consulente é empresa que estava em procedimento de monitoramento e, posteriormente, de acompanhamento, pelo Grupo Especialista Setorial – GES, que identificou irregularidade na escrita fiscal, referente à matéria consultada.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

RICMS/SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 28 de agosto de 2001, Anexo 2, artigo 15, inciso IX e Anexo 3, artigo 10.

Lei 3.938, de 26/12/66, artigo 111-A.

Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário – RNGDT/SC, artigo 152-C e 152-D.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

Inicialmente há que se observar que embora a Consulente declare expressamente que atende os requisitos de admissibilidade para a utilização deste instituto, evidencia-se impedimento em recebê-la e analisá-la de forma a produzir os efeitos que lhe são próprios.

É que dentre as restrições indicadas no artigo 152-C, do RNGDT/SC, figura em seu inciso III, alínea “e”, a vedação de o contribuinte proceder consulta relativa à matéria sobre a qual se encontra submetido à medida de fiscalização.

Deste modo, adverte-se preliminarmente à Consulente que o pedido formulado a esta Comissão não será objeto de análise, em face da restrição contida no artigo 152-C, inciso III, alínea “e”, do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário, do Estado de Santa Catarina que dispõe:

“Art. 152C.  Não será recebida ou analisada consulta que verse sobre:

III – matéria que:

e) seja objeto de medida de fiscalização já iniciada;”

O objetivo da norma é evitar que depois de identificada infração à legislação tributária pelo Fisco, posteriormente ao início de ação fiscal, da qual o sujeito passivo é cientificado, possa valer-se indevidamente desta prerrogativa para usufruir os efeitos previstos no artigo 152-D, do mesmo diploma legal:

“Art. 152D. A protocolização de consulta, quando formulada pelo sujeito passivo, produz os seguintes efeitos a partir daquela data:

I – suspende o prazo para pagamento do tributo, em relação ao fato objeto da consulta, até 30 (trinta) dias, após a data da ciência da resposta correspondente;

II – impede, durante o prazo fixado no inciso I, o início de qualquer medida de fiscalização, com relação ao consulente, destinada à apuração de infrações referentes à matéria consultada; e

III – se formulada dentro do prazo legal para pagamento do crédito, não correrão juros moratórios.”

Para elucidar a amplitude desta vedação parte-se da análise do significado do  termo “fiscalizar” que, segundo o Dicionário Aurélio, tem o sentido de “vigiar, (...) submeter a atenta vigilância, (...) exercer o ofício de fiscal”. No Direito Tributário, por muito tempo, a ação de fiscalizar foi interpretada restritivamente, para circunscrever-se apenas ao ato de constituir o crédito tributário pelo Fisco, mediante aplicação de multa e exigência do tributo, quando devido.

As ações fiscais eram essencialmente de caráter punitivo e se restringiam à constituição do crédito tributário pela autoridade fiscal, quando identificadas irregularidades de natureza tributária, com fundamento no artigo 142 do Código Tributário Nacional. Não havia possibilidade de o contribuinte sanear irregularidades espontaneamente após o início de medida de fiscalização, em face do impedimento previsto no parágrafo único, artigo 138, do mesmo diploma legal. Por conseqüência, ao Fisco competia agir nos estritos limites da norma legal, não lhe sendo permitido autorizar o cumprimento da obrigação tributária, depois de constatada infração à legislação tributária.

Hodiernamente, no Estado de Santa Catarina, a ação de fiscalizar denota uma amplitude que transcende à concepção meramente punitiva, para considerar também ações fiscais preventivas, em razão de uma mudança de paradigma, fundada em lei.

No contexto da Legislação Tributária estadual, a abrangência deste instituto pode ser compreendida através da apreciação das normas estabelecidas na Lei 3.938, de 26/12/66, no Título IV, em seu Capítulo I, sob a designação, “Fiscalização”.  Neste Capítulo, merece destaque a instituição de nova sistemática de atuação fiscal, ampliando as  medidas de fiscalização para contemplar, além do usual procedimento de constituição do crédito tributário, as modalidades de monitoramento e de acompanhamento.

A inclusão destas modalidades no referido Capítulo teve o propósito de qualificá-las como novas medidas de fiscalização. Esta estruturação está de acordo com as disposições da Lei Complementar nº 95/98, que disciplina a técnica de elaboração das normas jurídicas. Da análise do  artigo 11, inciso III, alínea “c”, denota-se que a reunião de disposições comuns num determinado capítulo, visa dar-lhes coerência lógica, delimitando seu conteúdo. As medidas de fiscalização foram incorporadas ao Capítulo mediante a inclusão do artigo 111-A, através da Lei nº 14.967/09, definindo-as como ações auxiliares de fiscalização,  nos seguintes termos:

“§ 1º Considera-se ação auxiliar:

I - de monitoramento a observação e a avaliação do comportamento fiscal-tributário do sujeito passivo, mediante controle corrente do cumprimento de obrigações a partir da análise de dados econômico-fiscais apresentados ao Fisco, sem que haja solicitação de novas informações; e

II - de acompanhamento a observação e a avaliação do comportamento fiscal-tributário do sujeito passivo, mediante controle corrente do cumprimento de obrigações a partir da análise de informações solicitadas pelo Fisco para esse fim ou obtidas mediante visitação in loco, verificação de documentos e registros por amostragem, levantamento de indícios ou processamento e análise de dados e indicadores.”

Estabelecendo uma ordem lógica, no monitoramento a autoridade procede à análise preliminar de informações, com o propósito de certificar a regularidade das obrigações tributárias. Se encontrados indícios de descumprimento da legislação tributária, a ação é convertida em acompanhamento. Nesta fase, ocorrendo a comprovação da prática de infração, é facultado ao sujeito passivo a regularização da obrigação tributária, sujeitando-se apenas à multa de caráter moratório, se for o caso. Por fim, se não ocorrer o cumprimento da obrigação, o Fisco dá início ao procedimento de constituição do crédito tributário.

O que distingue fundamentalmente as duas novas modalidades é que enquanto no monitoramento o Fisco utiliza somente dados disponíveis em seus arquivos, no acompanhamento, inclui-se a análise de informações e documentos requisitados de ofício ao contribuinte. Deste modo, em regra, o monitoramento é realizado sem o conhecimento do sujeito passivo, ao passo que o acompanhamento exige, necessariamente, a ciência do contribuinte acerca das verificações fiscais que serão realizadas e das irregularidades eventualmente encontradas posteriormente.

Destarte, a expressão “fiscalização” contempla atualmente os procedimentos de monitoramento, de acompanhamento e de constituição do crédito tributário.

Em razão disso, a Portaria 120/2007, ao dispor nos artigos 5º e 6º sobre a execução dos procedimentos fiscais planejados, manteve esta ordem lógica ao estabelecer que a formalização das medidas de fiscalização deve ocorrer mediante a emissão de termo denominado, ORDEM DE FISCALIZAÇÃO – OF, que compreende as ações de monitoramento, acompanhamento ou destinadas à constituição do crédito tributário de diversos contribuintes.

“Art. 5º - Os procedimentos fiscais decorrentes do planejamento das atividades de fiscalização serão formalizados pela Ordem de Fiscalização - OF ou pela Ordem de Serviço - OS, aplicativos disponibilizados no módulo Fiscalização do Sistema de Administração Tributária da Secretaria de Estado da Fazenda - S@T.

Art. 6º - A OF será emitida nos seguintes casos:

I – ações auxiliares de monitoramento;

II – ações auxiliares de acompanhamento;

III – ações de fiscalização destinadas a constituição de crédito tributário, sempre que o procedimento fiscal contemplar mais de um estabelecimento de sujeito passivo;

IV – quaisquer ações de fiscalização, quando realizadas no âmbito dos Grupos Especialistas Setoriais.”

Todavia, como se inferiu, o sujeito passivo apenas é cientificado das medidas de fiscalização, quando submetido à ação fiscal de acompanhamento ou de constituição do crédito tributário. É que ambas as modalidades demandam o conhecimento do contribuinte sobre os procedimentos a que está sendo submetido e o cumprimento das exigências legais que deve atender, como, a prestação de informações e entrega de livros e documentos ao Fisco.

Portanto, evidencia-se que se na fase de monitoramento o sujeito passivo não tem conhecimento da ação fiscal, não pode haver impedimento à utilização do instituto da consulta para dirimir dúvida acerca da aplicação da Legislação Tributária. Por outro lado, a questão se altera na fase de acompanhamento, porque há comunicação formal ao contribuinte, circunscrevendo as verificações que serão realizadas e, durante o procedimento, as irregularidades acaso encontradas e as medidas saneadoras que pode adotar, seguidas do  pagamento do tributo e multa moratória, quando for o caso.

Se a autoridade fiscal que preside a ação fiscal de acompanhamento, identifica e informa a determinado sujeito passivo, conduta considerada irregular, o faz com base na interpretação oficial da Administração Tributária, vez que deve agir nos estritos limites da legalidade. Por este prisma, a relação Fisco-contribuinte é idêntica àquela em que ocorre na constituição do crédito tributário, divergindo apenas quanto aos aspectos procedimentais e à multa aplicável, que se reduz a de caráter moratório.

Feitas estas ponderações, cabe analisar ainda a questão sob a ótica do Código de Direitos e Deveres do Contribuinte, instituído pela Lei Complementar 313, de 11/12/05, que dispõe em seu artigo 9º:

“A Administração Tributaria assegurará aos contribuintes o pleno acesso às informações acerca das normas tributárias e à interpretação que oficialmente lhes atribua.” (Grifo nosso)

A exigência visa afastar a obscuridade, garantir a segurança jurídica e fortalecer a confiança nas normas legais vigentes.

No caso em apreciação, consta nos autos (fls. 63) a informação da autoridade fiscal de que a Consulente estava sob ação fiscal de monitoramento e, posteriormente, de acompanhamento, com o propósito de obter a regularização do imposto devido, em face da constatação de irregularidade. Informa ainda que como a empresa exerce a atividade de importação de mercadorias, faz parte da carteira de contribuintes do  Grupo Especialista Setorial – GES que realiza ações fiscais relativas ao comércio exterior, denominado GESCOMEX (fls. 57).

Neste caso, a competência para informar o contribuinte acerca da interpretação oficial da legislação tributária, em atendimento à exigência da LC 313/05, está contida na Portaria SEF nº 120, de 10/08/07, que disciplinou a organização e funcionamento dos GES:

“§ 3º - Cabe aos GES a promoção de instrumentos de fiscalização preventiva e de combate à sonegação tributária, devendo (...) incentivar o cumprimento voluntário das obrigações principais, através da disponibilização ao contribuinte de pleno acesso às informações acerca das normas tributárias e à interpretação que oficialmente lhes atribui a Administração Tributária, antes de iniciar ações de fiscalização para constituição de crédito tributário (art. 9º da Lei Complementar nº 313, de 22.12.05).” (Grifo nosso)

A conclusão que se extrai é de que nas ações fiscais realizadas pelos Grupos Especialistas Setoriais, compete-lhes informar aos contribuintes qual a interpretação oficial da Administração Tributária durante as fases de monitoramento e acompanhamento. Na situação em análise, em que segundo a autoridade fiscal informante,  a Consulente encontrava-se submetida à ação fiscal de acompanhamento, as irregularidades encontradas foram-lhe informadas, permitindo-lhe, inclusive, recolher o imposto e acréscimos legais, com aplicação da multa de caráter moratório.

Como se asseverou, a falta de regularização das infrações praticadas pelo sujeito passivo, seja relativa à obrigação tributária principal ou acessória, implica em imediato início de procedimento de constituição de crédito tributário. Por conseguinte, se fosse permitir que na fase de acompanhamento o contribuinte pudesse exercer a capacidade postulatória da consulta, sobre fato circunscrito à medida de fiscalização, restaria comprometida a funcionalidade desta ordem lógica legalmente instituída.

Não é por demais ressaltar que a vedação prevista no artigo 152C do RNGDT/SC, no tocante à matéria que seja objeto de medida de fiscalização ou que tenha motivado a lavratura de notificação fiscal contra o consulente, tem por objetivo não submeter à análise da COPAT tema em que o contribuinte recebeu a interpretação oficial das autoridades fiscais durante a medida de fiscalização. A discordância em relação à interpretação do Fisco, utilizada para fundamentar a exigência fiscal, pode ser argüida administrativamente após a constituição do crédito tributário, em fase de reclamação ao Julgador de Processos Fiscais ou em recurso ao Tribunal Administrativo Tributário.

Portanto, não há que se cogitar a possibilidade de utilização do instituto da consulta, em primeiro, porque estava em andamento ação que se caracteriza como medida de fiscalização e, segundo, porque a informação acerca da interpretação sobre eventual dúvida da legislação tributária, neste caso, é dos Grupos Especialistas Setoriais, como se asseverou.  

Isto posto, responda-se à Consulente que estando a empresa submetida à medida de fiscalização, sob a modalidade de acompanhamento, cujos fatos da verificação fiscal referem-se à matéria objeto da demanda, o mérito do pedido não pode ser analisado e, por conseqüência, a consulta não produz os efeitos previstos no artigo 152-D, do Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário do Estado de Santa Catarina.

É o parecer que se submete à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

COPAT, em Florianópolis, 16 de janeiro de 2011.

Joacir Sevegnani

AFRE IV – Matr. 184.933-6

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 02 de março de 2011, ressalvando-se, a teor do disposto no art. 11 da Portaria SEF 226/01, que as respostas a consultas poderão ser modificadas a qualquer tempo, nas seguintes hipóteses: a) por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente; b) em decorrência de legislação superveniente; e, c) pela publicação de Resolução Normativa que veicule entendimento diverso.

Marise Beatriz Kempa                                               Francisco de Assis Martins

Secretária Executiva                                                  Presidente da COPAT