CONSULTA N° 044/2010
EMENTA: ICMS. VENDA DE MATO EM PÉ. CORTE E RETIRADA DAS ÁRVORES POR CONTA DO COMPRADOR. INCIDÊNCIA. CONTRATO ATÍPICO. AS ÁRVORES CONSTITUEM-SE EM BENS MÓVEIS POR ANTECIPAÇÃO, DESDE A DATA EM QUE CELEBRADO O CONTRATO. A OPERAÇÃO DEVE SER DOCUMENTADA COM NOTA FISCAL EMITIDA PELO VENDEDOR. PRECEDENTES.
01 - DA CONSULTA
A consulente informa que se dedica ao comércio atacadista de madeira e
produtos derivados. Em suas atividades pode vender tanto toras de madeira já
cortadas como “mato em pé”, cabendo ao adquirente extrair e retirar a madeira. Nessa
última hipótese entende que não ocorre circulação de mercadorias, posto que as
árvores (antes de cortadas) são bens imóveis, aderindo ao solo onde se encontram
(CC, art. 44). Traz à colação resposta do Estado de São Paulo à Consulta
526/2001:
“A árvore só se tornará mercadoria a partir do momento em que for
cortada, sendo que a incidência do imposto ocorrerá na saída da madeira de
eucalipto (do estabelecimento onde se encontravam plantadas as árvores em pé)
já cortada ou descascada, quando, aí sim, estará configurada uma operação
relativa à circulação de mercadorias”.
A informação fiscal a fls. 45-46, após discutir a presença dos
requisitos de admissibilidade da consulta, manifesta-se contrariamente à
pretensão da consulente, invocando manifestação desta Comissão, consubstanciada
na resposta a Consulta Copat 67/2009.
02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, arts.
1º, I, 3º, I, 4º, I, “a”; Anexo 3, art. 4º, II, ou art. 8º, IX; Anexo 5, arts.
32, I, e 33, I.
03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
A competência cometida aos Estados pela Constituição Federal foi para
tributar “operações relativas à circulação de mercadorias”. Desse modo, o fato
gerador do imposto somente estará caracterizado se o negócio jurídico envolver
“circulação” (mudança de titularidade da coisa) e “mercadoria” (coisa móvel
adquirida para fins de revenda). Portanto, a identificação da coisa vendida,
objeto do contrato, como móvel ou imóvel é fundamental para definir o
respectivo tratamento tributário.
Com efeito, somente coisa móvel pode caracterizar-se como mercadoria.
Não sendo coisa móvel, não há que se falar em incidência do ICMS. O novo Código
Civil (2002) define, em seu artigo 79, como imóveis “o solo e tudo quanto se
lhe incorporar natural ou artificialmente”. Desse modo, as árvores, enquanto em
pé e enraizadas no solo, teriam a natureza de coisas imóveis.
De outro modo, conforme art. 82 do CC, seriam móveis “os bens
suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração
da substância ou da destinação econômico-social”.
Ora, apesar de aderirem ao solo, os frutos pendentes, os cereais ainda
não ceifados e as árvores em pé podem ser removidos sem alteração de sua destinação
econômico-social. Sob esse aspecto o direito brasileiro os tem considerado como
“móveis por antecipação”. Nesse sentido, a Primeira Turma do Supremo Tribunal
Federal, decidiu que “as árvores destinadas ao corte, para finalidade
industrial, convertem-se em móveis” (RE 57.935 PR; DJ 23-06-1965; RTJ vol 33,
pp. 551)
A matéria já foi enfrentada por esta Comissão, na resposta à Consulta
67/2009, como lembrou oportunamente a autoridade fazendária local em suas
informações, verbis:
Cuida-se de operação de venda de “mato em pé”, ou seja, as arvores são
alienadas de forma destacada da propriedade imobiliária.
Dispõe o art. 79 do Código Civil que são bens imóveis o solo e tudo
quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente. Nesse caso estão as
árvores que deitam raízes no solo e assim a ele se incorporam. Porém, no caso
em tela, foi celebrado contrato atípico de compra e venda em que as árvores são
vendidas ainda enraizadas no solo, conservando o vendedor a propriedade do
solo. Compete ao comprador retirar as árvores do local, inclusive promovendo o
seu abate e demais providências necessárias. Na hipótese, as árvores
constituem-se em bens móveis por antecipação, desde a data em que concluído o
contrato. “Apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos podem ser
objeto de negócio jurídico” (CC, art. 95). Nessa condição, a transmissão da
propriedade dá-se por simples tradição. Nesse
sentido, leciona Washington de Barros Monteiro (Curso de Direito Civil. 35ª ed.
São Paulo: Saraiva, 1997, p. 146):
“As árvores, enquanto ligadas ao solo, são bens imóveis por
natureza (art. 43, I). Entretanto, se destinam ao corte, para transformação em
lenha ou carvão, ou outra finalidade industrial, convertem-se em móveis.
O fim que se tem em vista, na compra e venda de mata, é, pois, decisivo.
Destinada à derrubada, o que se vende é a árvore abatida, a madeira cortada.
Não se trata assim de bem imóvel, mas de bens móveis por antecipação”.
Não discrepa desse entendimento a Colenda 3ª Turma do Superior Tribunal
de Justiça, que decidiu, no julgamento do Recurso Especial 23.195-8 PR, Relator
o Min. Eduardo Ribeiro, em 9 de novembro de 1993: “Alienado o bem para ser
destacado do imóvel, sendo a intenção dos contratantes exatamente proceder a
essa separação, de que resultará a mobilização física, muito de aceitar-se que,
desde a feitura do contrato, móveis já se considerem”.
Com a celebração do contrato, conforme informa a consulente, o vendedor
extraiu a competente nota fiscal relativa ao valor total da mata. Já o transporte
das toras do local de extração para o estabelecimento da consulente deverá ser
documentado com notas fiscais da própria consulente (Notas Fiscais, modelo 1 ou
1-A), nos termos dos arts. 32 e 39 do Anexo 5 do RICMS.
O art. 4º, II, do Anexo 3, prevê o diferimento,
para etapa subseqüente do ciclo de comercialização da mercadoria, do imposto
relativo à saída de estabelecimento agropecuário de madeira em toras, extraído
de florestas cultivadas, acompanhada da respectiva Guia Florestal. Já o art. 8º, IX, do mesmo anexo, prevê o diferimento do
imposto relativo à saída de madeira entre estabelecimentos inscritos no
cadastro do ICMS, localizados na área de abrangência da Zona de Processamento
Florestal – ZPF, instituída pela Lei 10.169/1996.
No caso da venda do mato em pé, há circulação jurídica (mudança da
titularidade das árvores), mas não há circulação física, o que somente se dará
em momento posterior como o abate e retirada das árvores. Trata-se, nesse
último caso, de nova operação que deve ser documentada com nota fiscal de
emissão do comprador.
O diferimento previsto no art. 4º, II, refere-se mais propriamente à
operação de saída das toras resultantes das árvores abatidas. Contudo, a venda
do mato em pé somente é alcançada pelo imposto por que o contrato visa o abate
e retirada das árvores. Somente nessa perspectiva é que são consideradas coisas
móveis por antecipação. Por decorrência lógica, o diferimento atinge também a
operação de venda do mato em pé, desde que presentes os requisitos de (i) saída
de estabelecimento agropecuário, (ii) extração de florestas cultivadas e (iii)
emissão de Guia Florestal.
No caso do art. 8º, IX, o diferimento depende apenas dos
estabelecimentos estarem inscritos no cadastro de contribuintes do ICMS e
estarem localizados na ZPF.
Posto isto, responda-se à consulente:
a) as árvores em pé (antes do corte), vendidas separadamente do solo em
que se encontram, para fim de abate, são consideradas bens
móveis por antecipação, desde a data da celebração do contrato que as alienou;
b) tratando-se de bens móveis, incide o ICMS sobre a venda de árvores em
pé;
c) por conseguinte, a alienante das árvores
deve emitir nota fiscal, para documentar o respectivo negócio jurídico;
d) o imposto relativo à operação poderá ser diferido, nos termos do art.
4º, II, ou do art. 8º, IX, ambos do Anexo 3, conforme
o caso.
À superior consideração da Comissão.
Getri, em Florianópolis, 29 de junho de 2010.
Velocino Pacheco Filho
AFRE – matr. 184244-7
De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado
pela Copat na Sessão do dia 26 de agosto de 2010.
Alda Rosa da Rocha Francisco
de Assis Martins
Secretária Executiva
Presidente da Copat