CONSULTA N° 003/2010

EMENTA: CONSÓRCIO DE EMPRESAS. FALTA DE PERSONALIDADE JURÍDICA IMPEDE QUE O CONSÓRCIO ASSUMA A CONDIÇÃO DE SUJEITO PASSIVO TRIBUTÁRIO. CADA EMPRESA CONSTITUINTE DO CONSÓRCIO RESPONDE PELOS TRIBUTOS RELATIVOS AOS ATOS QUE PRATICAR.

NO CASO DA CONSTRUÇÃO DE SUBESTAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA, POR CONSÓRCIO FORMADO POR EMPREITEIRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL E FORNECEDORA DE EQUIPAMENTOS ELÉTRICOS, INCIDEM DOIS IMPOSTOS: O ISS PELA OBRA DE CONSTRUÇÃO CIVIL E O ICMS PELO FORNECIMENTO DE EQUIPAMENTO, TENDO COMO DESTINATÁRIO DOS MESMOS A CONTRATANTE.

01 - DA CONSULTA

Informa a consulente que tem por objeto social, entre outras coisas, a venda de equipamentos destinados à produção, transmissão e utilização de energia, tais como turbinas, transformadores, disjuntores, cubículos blindados, equipamentos para proteção e controle de estações etc.

Em 20 de junho de 2008, a Celesc Distribuição S/A, sociedade de economia mista, promoveu concorrência pública para a construção da Subestação Florianópolis Agronômica e ampliação e reforma da subestação Ilha Centro e outras obras correlatas.

Como a consulente não atua no setor de construção civil, constituiu consórcio com empresa de engenharia para poder participar do certame, conforme permitido pelo edital.

Ao final, formula a seguinte consulta a esta Comissão:

a) está correto o entendimento da consulente acerca da incidência do ICMS sobre o fornecimento de equipamentos, tanto de procedência estrangeira como de fabricação nacional, no âmbito do contrato celebrado com a Celesc?

b) caso contrário, qual seria o correto enquadramento tributário com relação ao faturamento dos equipamentos objeto do contrato em referência, bem como o respectivo embasamento legal aplicável.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976, arts. 278 e 279;

Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, arts. 2°, I, parágrafo único, I, 4°, I e IX, 5°, I, “a” e “d”, 8° e 10, I e V;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 5, art. 2°, § 9°.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

A Concorrência n° 201/2008, da CELESC, teve por objeto a execução das obras civis e de montagem eletromecânica, do empreendimento denominado subestação Florianópolis Agronômica, sob o regime de empreitada integral.

Focalizemos inicialmente a hipótese do certame ser vencido por uma única empresa, tanto para a execução das obras de construção civil, quanto do fornecimento do equipamento elétrico necessário. A hipótese é de incidência pura do ISS, de competência municipal, relativa à execução de obra de construção civil, prevista no item 7.02 da Lista de Serviços, anexa à Lei Complementar 116/2003. A base de cálculo do ISS seria o preço cobrado do tomador do serviço, ou seja, o valor total da empreitada.

Nos termos do § 2° do art. 1° do referido pergaminho, fica afastada a incidência do ICMS, de competência estadual, “ainda que sua prestação envolva o fornecimento de mercadoria”. Somente incidiria o ICMS no caso da ressalva contida no próprio item da Lista: fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviço, fora do local da prestação dos serviços”, o que não é o caso.

Qualquer fornecimento de equipamentos por terceiro estaria sujeito ao ICMS, mas teria por destinatário o prestador do serviço que, no caso, seria consumidor final dos referidos equipamentos. Isto no caso da licitação ter sido ganha por uma única empresa.

Entretanto, não foi isso que aconteceu. A licitação não foi ganha por uma só empresa, mas pelo Consórcio formado pelas empresas Siemens Ltda e Grantel Engenharia.

Os consórcios de empresas rege-se pelos arts. 278 e 279 da Lei 6.404, de 15 de dezembro de 1976. Com efeito, dispõe o art. 278 que “as companhias e quaisquer outras sociedades, sob o mesmo controle ou não, podem constituir consórcio para executar determinado empreendimento”. No entanto, ressalva o § 1° desse artigo que “o consórcio não tem personalidade jurídica e as consorciadas somente se obrigam nas condições previstas no respectivo contrato, respondendo cada uma por suas obrigações, sem presunção de solidariedade”.

Conforme dispõe o parágrafo único do art. 279, o “contrato de consórcio e suas alterações serão arquivados no registro do comércio do lugar da sua sede, devendo a certidão do arquivamento ser publicada”.

Ora, por não ter personalidade jurídica, o consórcio não pode ser sujeito de deveres ou direitos. Ele não fatura, não apura lucro, não contrata. Em suma, não mantém relação pessoal e direta com a situação descrita em lei como fato gerador de tributo (CTN, art. 121, parágrafo único, I). O consórcio não pode ser contribuinte, nem pode ser-lhe atribuída responsabilidade pelo recolhimento de tributo (CTN, art. 121, parágrafo único, II).

O sujeito passivo tributário, portanto, será cada uma das empresas que constitui o consórcio que respondem pelos tributos relativos às operações ou prestações que realizarem. Assim, a empresa responsável pelo fornecimento de equipamentos é responsável pelo ICMS correspondente aos materiais que fornecer. Por outro lado, a responsabilidade pelo ISS cabe à empresa responsável pela obra de construção civil que executar.

Comunga do mesmo entendimento a Receita Federal do Brasil que, para pacificar a matéria, baixou a Instrução Normativa 834, de 26 de março de 2008, que dispõe em seu art. 2° que “às receitas, custos, despesas, direitos e obrigações decorrentes das operações relativas às atividades dos consórcios aplica-se o regime tributário a que estão sujeitas as pessoas jurídicas consorciadas”. Ao que acrescenta o art. 4°: “O faturamento correspondente às operações do consórcio será efetuado pelas pessoas jurídicas consorciadas, mediante a emissão de Nota Fiscal ou Fatura próprios, proporcionalmente à participação de cada uma no empreendimento”.

Em síntese, o propósito da CELESC foi de contratar alguém, mediante licitação pública, para construir subestação de energia elétrica. Esse propósito poderia ser atingido de duas maneiras: por uma só empresa ou por um consórcio. No caso da execução por uma só empresa, ela adquire os equipamentos necessários de terceiros e constrói a subestação. Sobre esse negócio único incide apenas o ISS.

Porém, no caso de execução por um consórcio, o objeto continua sendo o mesmo: a construção da subestação. O negócio continua sendo único, mas o responsável é o consórcio, constituído por várias empresas e não mais uma só empresa.

A diferença entre uma e outra situação é que o consórcio não tem personalidade jurídica e, portanto, não pode assumir a condição de contribuinte. Note-se que a obrigação tributária, compreendendo os sujeitos passivo e ativo da relação, a base de cálculo e alíquota, é matéria reservada à lei. Na verdade, a matéria é de reserva absoluta da lei, ou seja, nem ao menos pode ser delegada ao Executivo. A fortiori, a obrigação tributária não pode ser modificada por contrato, edital ou outro instrumento diverso de lei, editada pela pessoa jurídica de direito público competente para instituir o tributo.

Nesse caso, cada um dos participantes do consórcio responde pelos tributos relativos aos atos que participar. No caso em tela, a um dos participantes cabia a execução da obra de construção civil, conforme contrato de formação do consórcio, e ao outro, o fornecimento do equipamento elétrico para ser instalado na subestação. Os atos praticados pelo primeiro constituem fato gerador do ISS e os atos praticados pelo segundo, fato gerador do ICMS.

Assim, para todos os efeitos, a responsabilidade pela construção da subestação é do consórcio, mas do ponto de vista tributário, temos dois fatos geradores distintos: a execução de obra de construção civil e uma operação de circulação de mercadorias, cujo destinatário é a contratante da obra, ou seja, a CELESC.

A bem da verdade, essa duplicidade de obrigações tributárias somente poderia ser resolvida de lege ferenda pelo Estado, mediante previsão de tratamento tributário específico aos consórcios, no caso de prestação de serviço e fornecimento de materiais. Contudo, a legislação estadual é omissa a esse respeito. A única disposição relativa aos consórcios encontra-se no art. 2°, § 9°, do Anexo 5 do RICMS-SC e trata da concessão de inscrição estadual aos consórcios de empresas, mas não cuida da obrigação tributária principal.

As expectativas da Celesc Distribuição S/A, em relação ao cumprimento do edital é irrelevante para o deslinde da questão, pois – frisemos mais uma vez – obrigação tributária é matéria sob reserva absoluta da lei e que não pode ser modificada por edital ou contrato administrativo. Pelo contrário, é o edital e o contrato que devem observar as disposições da legislação tributária.

Ora, conforme instruções da própria empresa aos participantes do certame, a fls. 58, havia previsão expressa de consórcios de empresas:

“4.1. Poderão participar da presente Licitação, empresas de forma isolada ou em consórcio, que demonstrem capacidade para a condução e realização do objeto desta Licitação, conforme condições estabelecidas no item 5 dessas instruções”.

Além disso, as mesmas instruções, fls. 63, previam que o consórcio poderia compreender empresas que fossem estritamente fornecedoras de equipamentos: “as empresas integrantes do consórcio como fornecedores de equipamentos estarão dispensada de apresentar os documentos relacionados no subitem 6.2.4, letras “b”, “c” e “d”.” O teor dos itens citados é o seguinte:

b) A proponente deverá apresentar comprovação de capacitação técnica para execução das obras objeto da licitação, através de atestados fornecidos por pessoas jurídicas de direito público ou privado, devidamente registradas no CREA, que comprove a execução pela proponente de obras de construção e montagem eletromecânica de subestação de transformação de energia elétrica na tensão de, no mínimo, 138 kV;

c) A proponente deverá apresentar registro de inscrição no CREA – Conselho Regional de Engenharia Arquitetura e Agronomia, do Estado em que estiver sediada. Deverá também apresentar Certidão de Pessoa Jurídica expedida pelo CREA – Conselho Regional de Engenharia Arquitetura e Agronomia, com validade na data desta licitação, comprovando que possui como Responsável Técnico pelo menos um profissional de engenharia com formação em engenharia elétrica;

d) A proponente deverá apresentar comprovação, através de Acervo Técnico expedido pelo CREA – Conselho Regional de Engenharia Arquitetura e Agronomia, de que os Responsáveis Técnicos da Empresa, individualmente ou em conjunto, detém atestado de responsabilidade técnica pela execução de obras de subestação de transformação de energia elétrica na tensão de o mínimo 138 kV;

Assim, as próprias instruções aos concorrentes distinguem claramente entre o membro do consórcio encarregado pela obra de construção civil e o que apenas fornece equipamento. A este último, é dispensada a comprovação de capacitação técnica, subentendendo-se que não terá a seu cargo a execução da obra.

Além disso, o Anexo I do contrato de constituição do consórcio, fls 80 a 82, do qual a licitante tinha prévio conhecimento, especifica claramente as responsabilidades de cada uma das consorciadas: fornecimento de equipamentos ou obra de construção civil, respectivamente.

Posto isto, responda-se à consulente:

a) embora o objeto da licitação seja único, a execução por consórcio de empresas, com atribuições diversas, implica diversidade de tratamento tributário;

b) consórcio de empresas não tem personalidade jurídica o que o impede de ser sujeito passivo tributário;

c) cada empresa constituinte do consórcio responde pelos tributos relativos aos fatos geradores que praticar;

d) no caso da construção de subestação de energia elétrica, por consórcio formado por empreiteira de construção civil e fornecedora de equipamentos elétricos, incidem dois impostos: o ISS pela obra de construção civil e ICMS pelo fornecimento de equipamento, tendo como destinatário dos mesmos a contratante.

À superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 3 de dezembro de 2007.

Velocino Pacheco Filho

AFRE – matr. 184244-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 29 de janeiro de 2010.

Alda Rosa da Rocha                                                                 Edson Fernandes Santos

Secretária Executiva                                                                 Presidente da Copat