CONSULTA Nº  023/2009.

EMENTA:  ICMS. NAS OPERAÇÃOES DE LEASEBACK OCORRE CIRCULAÇÃO ECONÔMICA OU JURÍDICA EM VIRTUDE DE TRANSFERÊNCIA DA TITULARIDADE DO BEM DO ATIVO PERMANENTE OBJETO DA TRANSAÇÃO, O QUE CARACTERIZA, SEGUNDO ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO E JURISPRUDENCIAL, O ASPECTO MATERIAL DO FATO GERADOR DO ICMS. CONSEQUENTEMENTE, SE A OPERAÇÃO NÃO SE ENQUADRAR EM NENHUMA DAS HIPÓTESES DE ISENÇÃO PREVISTAS NO RICMS/SC, ANEXO 2, ART, 35, A OPERAÇÃO SERÁ TRIBUTADA.

DOE de 08.07.09

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo, informa que em 28/07/2008 importou da Espanha um “torno de repuxo modelo SIEMENS 840D” para integrar em seu ativo imobilizado no valor de 240.650,00 "€, cujo pagamento foi feito por ocasião do embarque da mercadoria (Doc.fls. 21), e o ICMS devido pela importação, no valor de R$ 65.017,94, foi destacado na nota fiscal de entrada nº 000526 emitida 29/09/2008 (fls. 22).

 

Acrescenta que efetuou operação de leaseback com BB Leasing S.A. Arrendamento Mercantil com sede em Brasília, DF, e que, em razão de cláusula contratual, teve que transferir juridicamente a propriedade do “torno de repuxo modelo SIEMENS 840D” para a instituição financeira; e para formalizar a transferência emitiu em 21/10/2008 a nota fiscal-fatura nº 442.328 no valor R$ 826.407,85, com destaque do ICMS no valor de R$ 140.409,28. (fls. 24).

 

Após aduzir extensa argumentação doutrinária e jurisprudencial afirma: Deste modo, compreende a Consulente que, deve ser estornado o crédito tributário lançado pelo próprio contribuinte, uma vez que na operação realizada não ocorreu o fato gerador do ICMS, pois, não houve a saída física da mercadoria, requisito para a configuração da incidência do ICMS.”.

 

Entretanto, afirma ter dúvida sobre a ocorrência ou não do fato gerador do ICMS na transferência decorrente da operação de leaseback razão por que solicita a esta Comissão que se manifeste sobre a interpretação correta dos arts. 2º e 4º da Lei Estadual nº 10.297/96.

 

A autoridade fiscal no âmbito da Gerência Regional analisou os pressupostos de admissibilidade do pedido, concluindo que o fato de a consulente ter apresentado a consulta em “papel”, não utilizando o sistema S@T para formulá-la, a mesma não poderá ser recebida, motivo pelo qual sugere o arquivamento do presente processo sem análise do mérito.

 

É o relatório, passo a análise.

 

02     -  LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

 

Constituição Federal, art. 155, II;

Lei Complementar nº 86, de 13 de setembro de 1996, art. 3º, VIII;

RICMS/SC, aprovado pelo Dec. nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, art. 35. 

 

03     -  FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

 

Preliminarmente, deve-se destacar que a resposta correspondente ao questionamento não será encontrada na simples interpretação literal dos arts. 2º e 4º da Lei Estadual nº 10.297/96, como expôs a consulente, mas sim através do entendimento doutrinário e jurisprudencial  concernente à expressão ‘circulação de mercadoria’, a qual consubstancia-se no núcleo do aspecto material da hipótese de incidência do ICM(S).

Tratadistas de renome emprestaram à aludida expressão o sentido de negócio jurídico bilateral, consensual, da compra e venda ou qualquer outro negócio jurídico de que se irradie a circulação econômica e não meramente física. Como exemplo cita-se o ensinamento de José Nabantino Ramos: O conceito de circulação, in RDP, V. 2, Ed. Revista dos Tribunais, p. 36;  de Pontes de Miranda: Comentários à Constituição de 1967, tomo II, Editora Revista dos Tribunais, p. 49; e de Kiyoshi Harada: apud in http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7323.

Através deste “argumento de autoridade” pode-se afirmar que é pacífico em doutrina  a expressão circulação jurídica ou econômica como aquela que envolve transferência de titularidade da mercadoria.

Esse conceito também está consagrado na jurisprudência do STF (RE 70.616-SP, RTJ-58/360; RE 72.541-MG, RTJ-61/230; RE 72.412-SP, RTJ-61/804; RE 74.852-SP, RTJ-64/538; RE 55.434-SP, RTJ-67/439). Confere-se este entendimento no extrato parcial do acórdão exarado no AgReg 934667, julgado pelo STJ em 04/11/2008, o qual encontra fundamento em precedente do STF, in verbis:

2. É que, em 30.05.2007, o E. Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, julgou o RE n.º 461.968 interposto pela ora Embargada contra decisão proferida pela E. 2.ª Turma do Superior Tribunal de Justiça e, por unanimidade, negou-lhe provimento. Em seu voto, o Exmo. Sr. Ministro Eros Grau, relator do feito, ressaltou que "a circulação tal como constitucionalmente estabelecido (art. 155, II) há de ser jurídica, vale dizer, aquela na qual ocorre a efetiva transmissão dos direitos de disposição sobre a mercadoria, de forma tal que transmitido passe a ter poderes de disposição sobre a coisa (mercadoria)".

De destacar que, ao vender “torno de repuxo modelo SIEMENS 840D” a consulente deixou de ser a proprietária do mesmo, transferindo-o juridicamente para o BB Leasing, ocorrendo nesta operação circulação econômica ou jurídica do referido bem; e, como é cediço, na operação de leaseback têm-se duas operações concomitantes, isto é, a venda do bem para a instituição financeira e o arrendamento mercantil do mesmo bem ao antigo proprietário, não havendo, por óbvio, a necessidade da circulação física do bem, pois, o alienante/arrendatário já se encontra com a posse do bem objeto do arrendamento mercantil. 

Convém analisar a matéria também pelo viés legislativo. Vejamos o que dispõe a Lei Complementar n° 87/96, que rege atualmente os conceitos e regras gerais aplicáveis ao ICMS:

Art. 3° - O imposto não incide:

VIII – operações de arrendamento mercantil, não compreendida a venda do bem arrendado ao arrendatário;

Ora, a clara dicção da parte in fine do inciso acima transcrito afasta qualquer resquício de dúvida sobre a matéria, e autoriza afirmar que na venda do bem arrendado ao arrendatário no final do contrato de arrendamento mercantil (leasing) ocorrerá o fato gerador do ICMS, mesmo não havendo circulação física do bem, mas somente a circulação econômica ou jurídica, pois, por ocasião da alienação a posse do bem já estará com o arrendatário/adquirente.

Verifica-se, nos posicionamentos doutrinário, jurisprudencial e legislativo acima demonstrados, que o fator preponderante no aspecto material do fato gerador do ICM(s)  é a circulação econômica ou jurídica da mercadoria; o que  afasta de per se toda a argumentação esposada pela consulente quanto à necessidade da saída física da mercadoria para caracterização do fato gerador do ICMS.

Ademais, constata-se no caso vertente dos autos, que a operação de leaseback ocasionou a circulação econômica ou jurídica do “torno de repuxo modelo SIEMENS 840D”, bem este que permaneceu menos de um mês no ativo permanente da consulente, fato que afasta a aplicação do benefício fiscal previsto no RICMS/SC, Anexo 2, art. 35, II, “a”, in verbis:

Art. 35. Fica isenta a saída de bem adquirido para integrar o ativo permanente (Convênios ICMS 70/90 e 151/94):

II - para destinatário estabelecido em outro Estado:

b) a qualquer título, quando ocasional e ocorrida após o uso normal a que se destinava no estabelecimento remetente, considerando-se como tal o decurso de período não inferior a 12 (doze) meses;

Invertendo-se o foco, pode-se afirmar que qualquer operação de venda do ativo permanente que não se enquadre nas hipóteses de isenção previstas na legislação tributária deverá ser submetida à tributação do ICMS.

Pelo exposto, responda-se à consulente que na operação de leaseback ocorre o fato gerador do ICMS em virtude da circulação econômica ou jurídica do bem do ativo imobilizado, razão por que está é correto o procedimento por ela adotado, ou seja, a emissão da nota fiscal com o correspondente destaque do ICMS devido na operação de venda do ativo imobilizado. 

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 28 de maio de 2009.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 28 de maio de 2009.       

 

                     Alda Rosa da Rocha                                                   Anastácio Martins

                    Secretária Executiva                                                   Presidente da COPAT