CONSULTA:  027/08

EMENTA: ICMS. IMPORTAÇÃO. REMESSA DE MERCADORIA DO RECINTO ADUANEIRO PARA O ESTABELECIMENTO INDUSTRIALIZADOR E DO ESTABELECIMENTO INDUSTRIALIZADOR DIRETAMENTE PARA O ESTABELECIMENTO ADQUIRENTE, SEM QUE A MERCADORIA RETORNE AO ESTABELECIMENTO ENCOMENDANTE. POSSIBILIDADE, RESPEITADOS OS PROCEDIMENTOS FISCAIS PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA ESTADUAL.

ICMS. DIFERIMENTO. O BENEFÍCIO PREVISTO NO REGIME ESPECIAL ABRANGE TÃO-SOMENTE OS PRODUTOS ALI ESPECIFICADOS.

ICMS. IMPORTAÇÃO. GOZA DO MESMO TRATAMENTO DISPENSADO AO PRODUTO NACIONAL A MERCADORIA IMPORTADA DE PAÍS SIGNATÁRIO DE ACORDO DE QUE O BRASIL TAMBÉM SEJA PARTE QUE CONTENHA CLÁUSULA DE NÃO DISCRIMINAÇÃO.

           

 

 

 

01 - DA CONSULTA.

 

                          A consulente, devidamente qualificada nos autos, atua no ramo de importação, fabricação e comercialização de adubos e fertilizantes utilizados na agricultura. Grande parte das matérias primas que utiliza na fabricação de fertilizantes são de origem estrangeira, as quais por sua natureza física e volumes significativos chegam ao território nacional por transporte marítimo, que é moroso.

                          Sendo assim, uma vez que pretende remeter matéria-prima e material de embalagem para estabelecimento de terceiros em outra unidade da Federação, com a finalidade de industrialização, a consulente tem a intenção de efetuar o despacho aduaneiro da mercadoria no estado onde está situado o estabelecimento industrializador. Assim, após o despacho aduaneiro, a mercadoria será remetida pela consulente diretamente para industrialização. Dessa forma, reduz o tempo de entrega da mercadoria e os custos de transporte, conseqüentemente o custo do fertilizante.

                          Pelo Regime Especial de que é detentora, está autorizada a importar, com diferimento do ICMS devido por ocasião do desembaraço aduaneiro de matéria-prima, material secundário ou intermediário destinado à industrialização em território catarinense, nos termos do art. 10, II, § 15 do Anexo 3.

                          Em relação à importação de matéria-prima relacionada no art. 10, I, do Anexo 3, aplica-se o benefício ainda que a entrada da mercadoria no território brasileiro e a industrialização subseqüente ocorram em outra unidade da Federação, hipótese em que o imposto referente a operação de importação fica diferido para a etapa seguinte a do retorno ao estabelecimento importador da mercadoria industrializada, conforme disposto no § 15 do artigo citado.

                          No que tange às mercadorias relacionadas no art. 10, I do Anexo 3, a consulente entende que poderá importá-las e promover sua industrialização em outra unidade da Federação, mantendo-se o benefício do diferimento até a posterior saída das mercadorias industrializadas do estabelecimento da consulente.

                          Contudo, ressalta que nem todos os insumos que serão utilizados estão relacionados naquele dispositivo. Existem outros insumos utilizados na fabricação de fertilizantes sujeitos à isenção nas saídas realizadas no mercado interno, tais como: ácido nítrico, ácido sulfúrico, ácido fosfórico, fosfato natural bruto e enxofre, que estão disciplinados no art. 29, II do Anexo 2. Considerando que esses produtos são de uso primordial para a produção de fertilizantes, a consulente deverá também importá-los para industrialização que poderá ser realizada por estabelecimento situado em outra unidade da Federação.

                          Ocorre que o Regime Especial prevê diferimento para o ICMS devido na importação, quando se tratar de matéria-prima, material secundário ou intermediário destinados à industrialização no território catarinense. Assim, a consulente entende que, caso remeta os insumos relacionados no art. 29, II do Anexo 2 para industrialização em outra unidade da Federação, poderá incorrer em desrespeito aos requisitos estabelecidos para fruição do benefício previsto no Regime Especial.

             Observa, também, que, de acordo com o art. 33, I do Anexo 2, as saídas de fertilizantes realizadas pela consulente estão contempladas com isenção nas operações internas e conforme o disposto no inciso II do mesmo artigo está prevista redução de base de cálculo nas saídas interestaduais, o que impossibilita a utilização de créditos do ICMS eventualmente pago na importação de insumos a serem industrializados em outro Estado.

              Outro ponto, a ser considerado é o fato de os insumos importados serem provenientes de países signatários do GATT, Acordo Geral de tarifas Aduaneiras e Comércio, incorporado à legislação brasileira por intermédio da Lei nº 313, de 1948, que em seu artigo III, item 4, assim determina:

              Tratamento Nacional ou tocante à tributação e regulamentação internas.”

              4. Os produtos de território de uma parte contratante que entrem no território de outra parte contratante não usufruirão tratamento menos favoráveis que o concedido a produtos similares de origem nacional, no que diz respeito ás leis, regulamento e exigências relacionadas com a venda, oferta para venda, compra, transporte, distribuição e utilização no mercado interno. Os dispositivos deste parágrafo não impedirão a aplicação de tarifas de transporte interna diferenciais, desde que se baseiem exclusivamente na operação econômica dos meios de transporte e não na nacionalidade do produto.”

               Nesse sentido, a consulente entende que se os insumos importados pela consulente gozam de isenção nas saídas internas, igual tratamento deve ser conferido ao produto importado oriundo dos países signatários do GATT. Entendimento que decorre do disposto no art. 98 do Código Tributário Nacional, que assim dispõe: “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna e serão observados pela que lhes sobrevenha.”

            Diante do exposto, vem a esta Comissão perguntar se:

                                    l. Poderá importar as mercadorias relacionadas no art. 10, I do Anexo 3 e após liberação, remetê-las diretamente do recinto alfandegário para estabelecimento industrializador em outra unidade Federada, mantendo o benefício do diferimento do imposto de importação até a posterior saída das mercadorias industrializadas  do estabelecimento da consulente?

            2. É possível o estabelecimento industrializador de outra unidade da Federação remeter a mercadoria diretamente para o adquirente situado nesse Estado, sem que a mercadoria retorne fisicamente ao estabelecimento da consulente (importador)?

            3. O diferimento previsto no Regime Especial (art. 10, II e § 15 do Anexo 3) não se aplica às mercadorias importadas que não estiverem relacionadas no inciso I daquele artigo?

            4. A isenção prevista no art. 29, do Anexo 2, às saídas internas de ácido nítrico, ácido sulfúrico, ácido fosfórico, fosfato natural bruto e enxofre estende-se à importação desses produtos quando forem oriundos de países signatários do GATT – Acordo Geral de tarifas Aduaneiras e Comércio?

            Por fim, declara que a matéria objeto da consulta não motivou a lavratura de notificação fiscal e que não está submetida à medida de fiscalização.  

 

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

                       

                       Constituição Federal art. 155, § 2º, IX, “a”

                       RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870/01, Anexo 2, art. 29 e 33, I; Anexo 3, art. 10, I, II § 15; Anexo 6, Capítulo III;

                       Código tributário Nacional, arts. 98 e 111, II.

 

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

 

            Inicialmente cabe ressaltar que enquanto acontece o trâmite deste processo de Consulta, o Regime Especial de que a consulente é detentora sofreu alteração para estabelecer claramente que a concessão do benefício abrange tão-somente a importação das mercadorias relacionadas no inciso I do art. 10 do Anexo 3,  cuja ementa apresenta-se nos seguintes termos:

1. ICMS – REGIME ESPECIAL PARA IMPORTAR OS INSUMOS AGROPECUÁRIOS RELACIONADOS NO INCISO I DO ART. 10 DO ANEXO 3, COM DIFERIMENTO DO ICMS DEVIDO POR OCASIÃO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO, DESTINADOS À INDUSTRIALIZAÇÃO, AINDA QUE A ENTRADA NO TERRITÓRIO NACIONAL OCORRA PELO PORTO DE PARANAGUÁ-PR E A INDUSTRIALIZAÇÃO SUBSEQÜENTE OCORRA NO ESTADO DO PARANÁ, HIPÓTESE EM QUE O IMPOSTO REFERENTE À OPERAÇÃO DE IMPORTAÇÃO FICA DIFERIDO PARA A ETAPA SEGUINTE A DO RETORNO AO ESTABELECIMENTO IMPORTADOR DA MERCADORIA INDUSTRIALIZADA, NOS TERMOS DO ART. 10, INCISO I, C/C § 15 DO ANEXO 3. CÓD. SAT 75.

2. APLICA-SE ESTE BENEFÍCIO SOMENTE AOS INSUMOS AGROPECUÁRIOS RELACIONADOS NO INCISO I DO ARTIGO 10 DO ANEXO 3: HERBICIDAS, AMÔNIA, URÉIA, SULFATO DE AMÔNIO, NITRATO DE AMÔNIO, NITROCÁLCIO, MAP (MONO-AMÔNIO FOSFATO) DAP (DI-AMÔNIO FOSFATO), CLORETO DE POTÁSSIO, ADUBOS SIMPLES E COMPOSTOS, FERTILIZANTES E DL METIONINA E SEUS ANÁLOGOS.

3. O REGIME ESPECIAL FICA CONDICIONADO À REALIZAÇÃO DAS IMPORTAÇÕES ATRAVÉS DOS:

a) PORTOS, AEROPORTOS OU PONTOS DE FRONTEIRA ALFANDEGADOS, SITUADOS NESTE ESTADO; OU, QUANDO POR VIA TERRESTRE, PERMITIDA A ENTRADA POR OUTRA UNIDADE DA FEDERAÇÃO, DESDE QUE ORIUNDA DE PAÍS MEMBRO OU ASSOCIADO DO MERCOSUL; OU

b) PORTO DE PARANAGUÁ-PR.

           A consulente pretende realizar a importação de mercadoria por meio de porto situado no estado do Paraná, em razão de o estabelecimento que efetuará a industrialização dessa mercadoria situar-se naquele Estado.  Para isso, quer saber se é possível encaminhar a mercadoria importada diretamente do Recinto Aduaneiro, para aquele estabelecimento industrializador, mantendo-se o benefício do diferimento do ICMS, relativo à operação de importação das mercadorias especificadas no Regime Especial de que é detentora.                            

                        Da leitura do RICMS-01/SC, Anexo 3, inciso I e § 15 do art. 10, resta cristalino o entendimento de que o diferimento do ICMS devido na importação dos produtos relacionados no inciso I é concedido, ainda que a consulente remeta a mercadoria importada para ser industrializada em unidade Federada diversa.

                        Ora, se a legislação possibilita a remessa da mercadoria importada para industrialização em estado diverso daquele do importador, não há como entender que a remessa dessa mercadoria só possa ocorrer após a entrada física da mercadoria importada no estabelecimento da consulente. Sendo o caso, após efetuar o desembaraço aduaneiro, a consulente procederá à entrada fictícia da mercadoria no estabelecimento importador e, na seqüência, efetua a remessa dessa mercadoria para industrialização, em conformidade com o disposto no art. 71, I, “b” do Anexo 6, consignando no documento fiscal que a mercadoria sairá do Recinto Aduaneiro.

                        No que se refere à possibilidade de o diferimento previsto no Regime Especial estender-se à importação de produtos não previstos no art. 10, I, tem-se que o benefício deve ser utilizado nos estritos termos do Regime Especial que é concedido com base no § 15 do art. 10 do Anexo 3, que prevê o benefício do diferimento somente na importação das mercadorias relacionadas no inciso I do art. 10.

                         Sobre a possibilidade de o estabelecimento industrializador encaminhar a mercadoria industrializada diretamente ao estabelecimento adquirente, sem que a mercadoria retorne ao estabelecimento encomendante, a legislação tributária estadual prevê a hipótese no Capítulo III, do Título II do Anexo 6 do regulamento do ICMS/SC.

                         Já quanto ao benefício do art. 29 do Regulamento, que prevê isenção para as saídas internas dos produtos relacionados no inciso II, estender-se à importação dessas mercadorias, quando procedentes de países signatários do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio – GATT, tem-se que essa conclusão está fulcrada no enunciado do art. 98 do Código Tributário Nacional que assim dispõe: “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.”

                        O Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio - GATT - General Agreement on Tarifs and Trade é um conjunto de regras e normas de comércio, internacionalmente aceitas, instituídas na primeira negociação multilateral de comércio, em 1947, e revistas ao longo de um total de sete rodadas multilaterais até 1994 (Rodada Uruguai), quando foi então englobado pela estrutura da Organização Mundial do Comércio (OMC). Tem como ideal o livre comércio e, para tanto, assume como parâmetro central de atuação a não-discriminação, através da observância das regras da nação-mais-favorecida e do tratamento nacional.

                     Não-discriminação é um dos pilares do sistema multilateral de comércio desde 1947. Está contido nos art. I e III do GATT de 1994. O art. I estabelece o princípio da nação-mais-favorecida, pelo qual um país é obrigado a estender aos demais Membros qualquer vantagem ou privilégio concedido a um dos Membros. Já o art. III estabelece o princípio do tratamento nacional que impede tratamento diferenciado entre produto nacional e importado, quando o objetivo for discriminar o produto importado desfavorecendo a competição com o produto nacional.

                   A matéria já foi exaustivamente tratada na Resolução Normativa 028/1999, cuja ementa transcrevemos:

ICMS. TRATAMENTO TRIBUTÁRIO NA IMPORTAÇÃO DE PEIXE E FILÉ DE PEIXE, CONGELADOS, DE PAÍSES MEMBROS DO MERCOSUL OU ALALC. OS TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS APROVADOS PELO CONGRESSO NACIONAL E PROMULGADOS PELO PRESIDENTE DA REPÚBLICA PREVALECEM SOBRE A LEGISLAÇÃO INTERNA. TRATAMENTO ISONÔMICO ÀS MERCADORIAS NACIONAIS, IN CASU, ISENÇÃO, OBSERVADO AS EXCEÇÕES CONSTANTES NO DISPOSITIVO ISENTIVO. ICMS - IMPORTAÇÃO.

                  Nesse sentido é o entendimento da Comissão Permanente de Assuntos Tributários, exarado no parecer COPAT nº 40, de 2000, eis a ementa:

EMENTA: ICMS. IMPORTAÇÃO. GOZA DO MESMO TRATAMENTO DISPENSADO AO PRODUTO NACIONAL A MERCADORIA IMPORTADA DE PAÍS SIGNATÁRIO DE ACORDO DE QUE O BRASIL TAMBÉM SEJA PARTE QUE CONTENHA CLÁUSULA DE NÃO DISCRIMINAÇÃO.

      O Superior Tribunal de Justiça, analisou a questão e em decisão proferida pela 2ª turma que julgou o Recurso Especial nº 416077 / SP - 2002/0021853-5 (jul.: 27/06/2006, DJ 02.08.2006 p. 232), assim decidiu:

“RECURSO ESPECIAL. ART. 105, INCISO III, ALÍNEAS "A" E "B" DO INCISO III, DO
ART. 105 DA CF. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. TRIBUTÁRIO.
ICMS. COMINHO IMPORTADO DE PAÍS SIGNATÁRIO DO GATT. ISENÇÃO. SÚMULA N. 20 DO STJ.
1. O prequestionamento dos dispositivos legais tidos como violados é requisito indispensável à admissibilidade do recurso especial.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça posicionou-se no sentido de que "o cominho in natura, importado para comercialização, sem sofrer nenhum processo de industrialização, está isento do ICMS, pois há similar nacional isento" (REsp n. 63.879/SP, Segunda Turma, relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 9.10.2000).
3. "A mercadoria importada de país signatário do GATT é isenta do ICM, quando contemplado com esse favor o similar nacional" – Súmula n. 20 do STJ.
4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

                       

                       Isto posto, responda-se à consulente que:

            a) a mercadoria importada pode ser remetida diretamente do recinto alfandegário para o estabelecimento industrializador e, após industrializada, o estabelecimento industrializador poderá remetê-la diretamente para o adquirente, sem que a mercadoria retorne fisicamente ao estabelecimento encomendante, desde que respeitados os procedimentos fiscais previstos na legislação tributária estadual;

          b) o diferimento previsto no Regime Especial abrange tão-somente os produtos ali especificados;

          c) se ocorrer a importação de mercadoria relacionada no art. 29, II do Regulamento, e esta for originária de país signatário de acordo que proíba o tratamento discriminatório, do qual o Brasil faça parte, como é o caso do Tratado de Assunção e do GATT - General Agreement on Tarifs and Trade, a mercadoria importada deve sofrer tratamento idêntico ao previsto para a nacional. Isso implica, inclusive, que a fruição dos benefícios fiscais estará sujeita às mesmas restrições, condições e requisitos impostos ao produto nacional.

 

                         

          À superior consideração da Comissão.

 

                        GETRI, 14 de setembro de 2007.

 

 

 

 

Alda Rosa da Rocha

AFRE IV – matr. 344.171-7

 

            De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na sessão do dia 17 de abril de 2008.

                       

 

      Alda Rosa da Rocha                                                         Almir José Gorges

      Secretária Executiva                                                        Presidente da Copat