Consulta nº 002/08

EMENTA: ICMS. O INSTITUTO TRIBUTÁRIO DO DIFERIMENTO, ORIGINALMENTE, NÃO É BENEFÍCIO FISCAL, MAS SIM TÉCNICA FISCAL APLICADA NO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA.

 O DIFERIMENTO PREVISTO NO RICMS/SC, ANEXO 3, ART. 4º, I, É EXTENSIVO A TODAS AS OPERAÇÕES INTERNAS REALIZADAS ENTRE PRODUTORES RURAIS, NÃO DESTINADAS AO CONSUMO FINAL.

 DOE de 11.04.08

01 - DA CONSULTA.

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo, informa a esta Comissão que atua no ramo de beneficiamento e comercialização de arroz, e tendo em vista haver comercialização de arroz em casca entre produtores rurais e, posteriormente com a consulente, sobre estas operações indaga:

a) a primeira operação de venda de um produtor para outro, que irá vender ou depositar na cooperativa, é diferida?

b) a segunda operação entre o produtor adquirente e a cooperativa, também é diferida?

c) se a primeira operação é diferida, como deverá o produtor adquirente proceder com relação ao ICMS deferido?

d) se houverem diversas operações entre produtores rurais até a venda ou depósito na cooperativa, qual o tratamento tributário correto?

A autoridade fiscal que analisou o processo no âmbito da Gerência Regional de Araranguá afirma que, nas operações entre produtores rurais, excetuando a primeira e a última operação, deverá ser recolhido o ICMS diferido na etapa anterior, pois entende que o diferimento é um beneficio fiscal devendo a legislação tributária a ele pertinente ser interpretada literalmente. (fls. 04 e 05).

É o relatório, passo à análise. 

02 - DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

 RICMS/SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 1º de setembro de 2001, Anexo 3, art. 1º, I, art. 4º, I,  e 8º, I.

03 - DA FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA. 

Inicialmente, deve-se registrar que, segundo a melhor doutrina, o diferimento, em sua concepção original, não é beneficio fiscal, mas sim técnica de arrecadação tributária. Citam-se, a seguir, algumas posições doutrinárias.

"O diferimento é a técnica de tributação estribada no feitio polifásico do ICMS. Não se confunde com nenhum tipo de Benefício fiscal. (COELHO, Sacha Calmon Navarro, Curso de Direito Tributário Brasileiro. 3ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 598.)

"Diferimento é a designação de um complexo de normas que fixa um dado regime tributário. (...) é instituto que se refere à obrigação tributária." (ATALIBA, Geraldo e GIARDINO, Cléber. ICM – Linhas Mestras Constitucionais – O Diferimento. In Revista de Direito Tributário – 23-24, p. 119.)

"O diferimento é o não recolhimento do ICMS em determinada operação ficando adiado para etapa posterior. Por esta técnica, o pagamento do imposto incidente sobre a saída de determinada mercadoria (no caso do ICMS) é transferido para as etapas posteriores de sua circulação." (BASTOS, Celso Ribeiro. Lei Complementar – Teoria e Comentários. 2ª ed. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999.)

"Diferimento não é benefício fiscal; não retira as operações do campo da incidência do imposto; apenas transfere para etapa futura da circulação o momento do lançamento tributário." (Consultoria Tributária – SP.)

A palavra diferimento deriva do verbo diferir, que segundo o vernáculo, significa adiar, retardar. É nesta acepção que a palavra é utilizada na linguagem técnico-tributária para designar o instituto tributário da substituição tributária para trás ou regressiva.

Esse instituto por sua vez, segundo Eduardo Sabbag, é a postergação (adiamento) do recolhimento do tributo para momento posterior à ocorrência do fato gerador. Assim, adia-se o pagamento do ICMS por mera conveniência da administração tributária, uma vez que o contribuinte substituído não dispõe de aparato fiscal ou contábil para efetuá-lo, razão pela qual o ônus tributário recai sobre o substituto legal tributário. (in Elementos do Direito Tributário. 8ª Ed. São Paulo: Premier - Máxima. 2006. Pág. 182).

Sobre este embasamento teórico e sob a luz de uma interpretação teleológica, inferi-se que o diferimento concedido aos produtores rurais não se trata de benefício fiscal, mas sim de técnica fiscal de arrecadação.

Ora, cediço a deficiência técnico-contábil dos produtores rurais para administrar o ICMS, mormente frente à não-cumulatividade que matiza este imposto, daí por que, a  administração tributária, transferir o encargo tributário relativo ao ICMS incidente sobre as operações internas com produtos primários para o primeiro contribuinte não produtor que intervier na cadeia de comercialização ou industrialização. 

Tem-se, portanto, que qualquer produto primário, mesmo que tenha sido objeto de diversas etapas circulatórias realizadas entre produtores rurais dentro do estado, poderá ter diferido o ICMS devido até a sua saída do estado, bem como, até a saída destinada a consumidor final, ou a entrada em estabelecimento comercial ou industrial estabelecido neste estado, pois quando este promover nova saída submeterá o produto ou seus derivados à tributação.  

Assim, havendo novo diferimento, após uma entrada também diferida, a responsabilidade do contribuinte pelo imposto incidente na operação que realiza, juntamente com o relativo à operação anterior, de que tenha decorrido a entrada da mercadoria em seu estabelecimento, transfere-se ao destinatário próxima operação tributada, nos termos do art. 1º do Anexo 3 do RICMS/01, in verbis:

Art. 1º. Nas operações abrangidas por diferimento, fica atribuído ao destinatário da mercadoria a responsabilidade pelo recolhimento do imposto na condição de substituto tributário.

§ 1º. O imposto devido por substituição tributária subsumir-se-á na operação tributada subseqüente promovida pelo substituto.

Aliás, é esse o entendimento desta Comissão, conforme se apura no precedente exarado da  Consulta nº 46/03, cuja ementa está assim emoldurada, in verbis:

EMENTA: ICMS. DIFERIMENTO. LEITE “IN NATURA”. TRATAMENTO APLICÁVEL INCLUSIVE À NOVA SAÍDA, NÃO DESTINADA A CONSUMIDOR FINAL, PROMOVIDA PELO DESTINATÁRIO DE OPERAÇÃO CUJO IMPOSTO FORA TAMBÉM DIFERIDO.

Frente ao exposto, responda-se à consulente que o diferimento previsto no RICMS/SC, Anexo 3, art. 4º, I, é extensivo a todas operações internas, não destinadas ao consumo final, realizadas entre produtores rurais, e que a saída do último produtor rural interveniente para cooperativa de que faça parte também será diferida consoante inteligência do art. 8º, I do anexo acima citado.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis,  28 de fevereiro de 2008.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402-2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do 28 de fevereiro de 2008.

        Alda Rosa da Rocha                                                       Almir José Gorges

        Secretária Executiva                                                     Presidente da Copat