Consulta nº 089/07

EMENTA: ICMS. CONTRIBUINTE DE FATO. ILEGITIMIDADE PARA PLEITEAR JUNTO À FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL. COMPENSAÇÃO. EXIGÊNCIA DE LEI ESTADUAL QUE A AUTORIZE, CONFORME ESTABELECE O ART. 170 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL.

DOE de 11.04.08

01 - DA CONSULTA.

A consulente devidamente qualificada nos autos, tem como atividade o comércio varejista e atacadista de supermercados e hipermercados, compreendendo o comércio de gêneros alimentícios em geral e demais mercadorias passíveis de venda em supermercados e hipermercados, bem como a importação e exportação de produtos.

Para bem realizar o seu objeto social, consome em seus estabelecimentos grande quantidade de energia elétrica, a qual é adquirida na concessionária deste Estado, Celesc - Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A.

Na condição de consumidora de energia elétrica, estava sendo onerada pelo ICMS incidente não só sobre a energia elétrica consumida em seus estabelecimentos, mas também sobre o denominado e hoje extinto “encargo de capacidade emergencial – ECE (seguro apagão)”, e sobre os custos decorrentes dos contratos de ‘demanda reservada de potência’ firmados com aquela concessionária.

Por entender indevido o pagamento de ICMS incidente sobre a demanda de reserva de potência e sobre o encargo emergencial, por não corresponder a um efetivo consumo de energia elétrica, impetrou Mandado de Segurança, cujo acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, restou ementado da seguinte forma:

‘TRIBUTÁRIO. ENERGIA ELÉTRICA. ICMS. BASE DE CÁLCULO. IMPOSSIBILIDADEDE A DEMANDA RESERVADA DE POTÊNCIA E DO ENCARGO DE CAPACIDADE EMERGENCIAL INTEGRAREM-NO. INEXISTÊNCIA DE CIRCULAÇÃO DA ‘MERCADORIA’, FATO GERADOR DO TRIBUTO. 

‘[...] é   que a base de cálculo do ICMS sobre energia elétrica deve ser o valor daquela efetivamente consumida, e não daquela disponibilizada ao usuário através de ‘demanda reservada de potência’, porque só em relação à primeira ocorre a transferência (circulação) da mercadoria, que é o fato gerador do tributo’(Agravo de Instrumento n. 2005.021683-5, de Blumenau, rel. Des. Jaime Ramos).

Assim, entende que a partir da decisão judicial deverá lançar em sua escrita fiscal a título de crédito de imposto pago indevidamente, o valor do ICMS corrigido monetariamente desde a data de seu recolhimento, em conformidade com o art. 100 da lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, combinado com o art. 77 da lei nº 5.983, de 29 de novembro de 1981.

Em vista do disposto, declara não restar dúvidas de que cabe atualização monetária aos créditos em comento, nos termos do § 1º do art. 74 da lei nº 5.983, de 1981. Entretanto, a UFIR foi extinta pela Lei Federal nº 10.522, de 19 de julho de 2002, sendo substituída, para fins de atualização monetária de débitos frente à União, pela SELIC. 

Com base na legislação em vigor, a consulente entende que deverá aplicar aos créditos ao qual faz jus por determinação judicial, os juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação, e de Custódia – SELIC para títulos federais.

Em razão disso, vem a esta Comissão perguntar se é correto aplicar a taxa SELIC para fins de atualização monetária dos créditos judicialmente reconhecidos. Em não sendo possível, que lhe seja informado o índice de correção monetária aplicável ao caso e a sua base legal.

 Por fim declara que não se encontra sob procedimento fiscal iniciado ou já instaurado para apurar fatos que se relacionem com a matéria objeto da consulta, nem está intimada a cumprir qualquer obrigação atinente à matéria consultada. Tampouco obteve decisão anterior proferida em consulta ou litígio em que a matéria tenha sido discutida. 

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

Código Tributário Nacional, arts.  165 e 170;

Lei nº 5.983, de 27 de novembro de 1981, art. 69;

Lei nº 3.938, de 26 de dezembro de 1966;

Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984;

Decreto nº 1.942, de 22 de dezembro de 2000.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

Inicialmente cabe ressaltar que relativamente ao ICMS a consulente não figura no pólo passivo da relação tributária. Sua participação, no caso, é a de consumidor. O contribuinte, de quem o Estado exige o tributo é a CELESC.

O que ocorre com o ICMS sobre a energia elétrica é um exemplo de repercussão tributária. A empresa concessionária do serviço de distribuição de energia elétrica é autorizada a cobrar do usuário ou adquirente de energia elétrica o valor do Imposto de Circulação de Mercadorias devido na operação de venda ou fornecimento da energia.

Trata-se das figuras do contribuinte de direito e do contribuinte de fato. Apenas o primeiro interessa ao Direito Tributário. Apesar de presumivelmente suportarem o ônus tributário, os chamados contribuintes de fato são pessoas estranhas à relação jurídica tributária.

A titularidade do dever jurídico de recolher o tributo é do contribuinte de direito e sobre ele é que o Estado pode exigir o cumprimento da prestação. Tanto é verdade que o direito positivo brasileiro reconhece apenas o contribuinte de direito, como pólo passivo da relação jurídica tributária, que apenas ele tem o direito de pleitear repetição das quantias recolhidas ao Erário, a título de tributo, pagas indevidamente ou a maior que o devido (CTN, art. 165). O contribuinte de fato só interessa ao direito para evitar locupletamento de quem pleiteia restituição de tributos cujo ônus repercutiu sobre terceiro (art. 166):

A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, a transferência do respectivo encargo financeiro, somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.

O professor Hugo de Brito Machado, em sua obra Comentários ao Código Tributário Nacional, leciona. “Em se tratando de ação de repetição de indébito, tem predominado na jurisprudência o entendimento segundo o qual o denominado contribuinte de fato não tem legitimidade processual”.   E segue:

“...aquele que apenas economicamente sofre com a incidência do tributo não tem relação jurídica  de qualquer natureza com  a  Fazenda Pública, não possuindo qualquer  direito a ser contra ela reclamado” (pp. 402/403).

Ademais, ressalte-se que a compensação do ICMS só é permitida se existir lei estadual que a autorize, conforme exige expressamente o art. 170 do Código Tributário Nacional - CTN.

Sendo assim, resta prejudicado o questionamento quanto à utilização da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, embora esta Comissão entenda conveniente tecer algumas considerações a respeito.

Conforme estabelece o Capítulo VI da Lei nº 5.983, de 27 de novembro de 1981, a referida taxa é utilizada como juros moratórios, não como índice de correção monetária. 

O Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário - RNGDT, aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, em seu art. 82, § 2º dispõe que na restituição de quaisquer créditos tributários pagos indevidamente, os valores serão atualizados monetariamente.

Acontece que o índice de correção monetária utilizado pelo Estado, a Unidade Fiscal de Referência – UFIR, foi extinto pela Medida Provisória Federal nº 1973-67, de 26 de outubro de 2000 e, a partir daí, o Estado deixou de fixar um novo índice de correção. Apenas determinou a conversão dos valores expressos UFIR para moeda corrente nacional, com base no último índice fixado para a unidade fiscal de referência, congelado em 1º/12/2000.

Assim estabelece o Decreto nº 1.942, de 22 de dezembro de 2000, em seu art. 1º, in verbis:

Art.1º A partir de 27 de outubro de 2000, os débitos fiscais de qualquer natureza e quaisquer outros valores referidos na legislação tributária estadual expressos em UFIR serão convertidos para a moeda corrente nacional com base no valor de R$ 1,0641, fixado pela Portaria nº 488, de 23 de dezembro de 1999, do Ministério da Fazenda, como expressão monetária daquela para o exercício 2000.

Já o art. 82, § 1º do RNGDT, dispõe que a restituição vence juros não capitalizáveis de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado da decisão definitiva que a determinar.

Isto posto, responda-se à consulente que além de faltar-lhe legitimidade para pleitear a pretendida compensação junto à Fazenda Pública Estadual, a compensação só é possível se existir lei estadual que a autorize, conforme dispõe o art. 170 do CTN.

À superior consideração da Comissão. 

GETRI, 15 de outubro de 2007.

Alda Rosa da Rocha

AFRE IV – matr. 344171-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na sessão do dia 8 de novembro de 2007.

       Alda Rosa da Rocha                                                   Almir José Gorges

       Secretária Executiva                                                  Presidente da Copat