EMENTA: ICMS/ISS. - A FABRICAÇÃO DE MATRIZES SERIGRÁFICAS SOB ENCOMENDA CARACTERIZA-SE COMO INDUSTRIALIZAÇÃO, CONSEQUENTEMENTE, A VENDA DESTES PRODUTOS RESULTA EM OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA, FATO QUE SE SUBSUME EM HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ICMS, RESTANDO IN CASU  AFASTADA A  INCIDÊNCIA DO ISS.

01-  DA CONSULTA.

A Consulente acima identificada, devidamente qualificada nos autos deste processo de consulta, informa que tem como atividade a industrialização, comercialização, importação e exportação de matrizes serigráficas planas e rotativas, e,  tem como principais clientes as indústrias de cerâmicas, que utilizam as matrizes produzidas pela consulente na fabricação de pisos e azulejos.

 Acrescenta que, segundo seu entendimento, a fabricação dessas matrizes serigráficas caracteriza-se industrialização, razão pela qual vem submetendo as operações de saída à incidência do IPI e do ICMS.

Apesar de a Lei Complementar nº 116/01 não trazer expressamente a atividade serigrafia em sua lista de serviços, o município de Cocal do Sul está afirmando que essa atividade deve se submeter à incidência do ISS.

Frente ao impasse criado entre o entendimento da consulente no sentido de que a atividade que desenvolve deve ser submetida à incidência do IPI e do ICMS e o do fisco municipal que a atividade deve se submeter à incidência do ISS, indaga a esta Comissão qual entendimento está correto.

A autoridade fiscal, no âmbito da Gerência Regional em Joinville, analisou as condições formais de admissibilidade do pedido, não se manifestando sobre os argumentos esposados pela consulente.

É o relatório, passo à análise.

02 - DA LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.

Lei complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, art. 2º;

Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, lista anexa, item 14.13;

RIPI, aprovado pelo Decreto Federal nº 4.544, de 26 de dezembro de 2002, arts. 2º, 3º e 4º.

03 – DA FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA.

O entendimento esposado pela Consulente está correto, ou seja, as operações de saída de matrizes serigráficas submetem-se a incidência do ICMS.

O fundamento desta conclusão reside na resposta a seguinte indagação: Qual a atividade desenvolvida pela consulente? Ou seja: a fabricação de matrizes serigráficas sob encomenda trata-se de industrialização (IPI) ou de prestação do serviço (ISS)?

Por primeiro, registre-se que o conceito de serviços vem da economia, onde o trabalho é um dos fatores de produção. De fato, o trabalho, aplicado à produção, pode dar como resultado duas classes de bens: i) bens materiais ou mercadorias; e ii) bens imateriais, conhecidos, estrito senso, como serviços.

Focalizando, especificamente, o trabalho humano como um serviço lato sensu conclui-se que este é um fator indispensável na produção de quaisquer bens ou mercadorias, sendo, portanto, um fator de produção indispensável ao processo industrial. Ou seja, toda industrialização (transformação, beneficiamento, acondicionamento, etc) se efetiva, indubitavelmente, pela ação do trabalho humano (serviço lato sensu) que, agregando valor à matéria-prima básica, transforma-a num produto final acabado (bens materiais ou mercadorias) pronto para o uso ou consumo.

O Superior Tribunal de Justiça analisando conflito entre o IPI (industrialização) e o ISS (prestação de serviço) apresentado no REsp nº 395633/RS, cujo relatório é da lavra da Eminente Ministra Eliana Calmon, decidiu pela preponderância do IPI, nas hipóteses em que o trabalho humano é aplicado sobre matéria-prima para a produção de um bem ou mercadorias, conforme se apura na ementa abaixo:

TRIBUTRIO - IPI - PRODUTO INDUSTRIALIZADO - MÓVEIS SOB ENCOMENDA
 AFASTAMENTO DA INCIDNCIA DO ISS.
1. Constitucionalmente, é o IPI imposto prioritário para incidir em todas as matérias-primas que, trabalhadas, têm sua destinação alterada.
2. A fabricação de móveis de madeira não se confunde com as artes gráficas de impressos personalizados, em que prepondera sob o material a prestação de serviço.
3. A incidência do IPI é tão rigorosa, que até mesmo as madeiras polidas e serradas são geradoras de IPI, segundo a jurisprudência do STF.
4. Recurso improvido.

Extrai-se ainda, do sapiente voto da relatora, o seguinte: Assim limita-se a controvérsia em saber o que é preponderante na atividade da empresa: o caráter pessoal no fornecimento dos móveis (prestação de serviço) ou a transformação que modifica a natureza e finalidade do produto (industrialização).
              (...)
            A incidência do IPI é tão prioritária que a jurisprudência do STF já está assentada no entendimento de que a exação é devida na madeira serrada, no peixe vivo acondicionado, nos camarões cozidos e congelados, na carne congelada, em prova inconteste quanto ao rigor do conceito de mercadoria industrializada.

Mutatis mutantis, infere-se que o mesmo raciocínio jurídico aplica-se ao caso em análise, pois a consulente transforma a matéria-prima em um novo produto, ou seja, a atividade da consulente consiste na transformação de tecido, adesivo, tintas, etc, em moldes serigráficos de acordo com o pedido do cliente; atividade essa que se consubstancia em processo industrial.

Deve considerar, também, o fato de a produção industrial, via de regra, destinar-se ao comércio. Aduz-se às razões da análise o ensinamento de Aires Fernandino Barreto sobre a distinção entre os campos de incidência do ICMS e do ISS:

“...[é] critério de demarcação dos campos de incidência do ICMS e do ISS os conceitos de atividade-meio e de atividade-fim. No caso do ICMS, a utilidade disponibilizada ao consumidor é um bem material (mercadoria) que não pode ser separado, para fins de tributação, das atividades-meio incorridas. O fornecimento da mercadoria ao fornecedor final envolve uma série de serviços que beneficiam a esse mesmo consumidor, mas que não se constituem em fatos geradores distintos. Pelo contrário, subsumem-se na atividade preponderante da empresa, o fornecimento da mercadoria.
            Alvo de tributação é o esforço humano prestado a terceiros como fim ou objeto. Não as suas etapas, passos ou tarefas intermediárias, necessárias a obtenção do fim. Não a ação desenvolvida como requisito ou condição do facere (fato jurídico posto no núcleo da hipótese de incidência do tributo).
           As etapas, passos, processos, tarefas, obras, são feitas, promovidas, realizadas “para” o próprio prestador e não “para terceiros”, ainda que estes os aproveitem (já que, aproveitando-se do resultado final, beneficiam-se das condições que o tornam possível).
                   (...)
         Em conclusão, somente podem ser tomadas, para sujeição ao ISS (e ao ICMS) as atividades entendidas como fim, correspondentes à prestação de um serviço integralmente considerado. No caso específico do ISS, podem decompor um serviço – porque previsto, em sua integridade no respectivo item específico da lista da lei municipal – nas várias ações meio que o integram, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo, independente. Isso seria uma aberração jurídica, além de constituir-se em desconsideração à hipótese de incidência desse imposto.”
(ISS – Atividade-Meio e Serviço-Fim. Revista Dialética de Direito Tributário n° 5, São Paulo: Oliveira Rocha, fevereiro/ 1996, pp. 72 a 97):

Ademais, indaga-se: O negócio realizado entre a consulente e as empresas encomendantes, é a entrega da matriz de serigrafia ou o serviço de sua confecção?

Considerando o processo fabril descrito pela consulente, constata-se que ela fabrica uma mercadoria (matrizes serigráficas) para ser vendida à empresa encomendante.

Aliás, é esse o entendimento desta Comissão em caso semelhante já analisado, conforme se apura na Consulta nº 65/95, cuja ementa está assim emoldurada:

EMENTA: A FABRICAÇÃO DE JANELAS ESTÁ SUJEITA AO ICMS, POIS CARACTERIZA INDUSTRIALIZAÇÃO, MESMO SENDO REALIZADA COM MATERIAIS DE TERCEIROS (ENCOMENDANTES). JÁ A CONFECÇÃO E MONTAGEM DE JANELAS NO CANTEIRO DE OBRAS, É CARACTERIZADO COMO SERVIÇO, ESTANDO NO CAMPO DE INCIDÊNCIA DO ISS, DESDE QUE COMPROVADA A PRESTAÇÃO MEDIANTE CONTRATO DE ADMINISTRAÇÃO, EMPREITADA OU SUB-EMPREITADA.

De outro norte, deve-se destacar o fato de a Lei Complementar nº 116/03 não trazer expressamente em sua lista de serviço a atividade de serigrafia, o que impede os municípios de cobrarem o ISS sobre esta atividade. Segundo a balizada doutrina de Ives Gandra da Silva Martins, “a lista de serviços é taxativa, não podendo ser ampliada por analogia, a teor do art. 97 do CTN (somente a lei pode estabelecer a instituição de tributos, ou a sua extinção) que, no art, 108, § 1º preceitua: O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei. (...) Não cabe, portanto, interpretação analógica para estabelecer obrigação tributária e definir fato gerador de tributo” (in O ISS e a LC 116, Coordenador Valdir de Oliveira. São Paulo: Dialética. 2003. Pág. 195).

Dessa forma, é legítimo afirmar que os municípios não poderão exigir o ISS sobre a atividade de serigrafia estribados na analogia com outras prestações de serviço que entendem a ela semelhantes. E isso se dá, simplesmente, pelo fato de que essa atividade não figura no rol taxativo da lista de serviços anexa a Lei Complementar nº 116/03.

Registre-se que as atividades que, possivelmente, possam ser tidas como semelhantes à de serigrafia estão arroladas no item 13, in verbis:

13 – Serviços relativos à fonografia, fotografia, cinematografia e reprografia.

13.01 – (VETADO)

13.02 – Fonografia ou gravação de sons, inclusive trucagem, dublagem, mixagem e congêneres.

13.03 – Fotografia e cinematografia, inclusive revelação, ampliação, cópia, reprodução, trucagem e congêneres.

13.04 – Reprografia, microfilmagem e digitalização.

13.05 – Composição gráfica, fotocomposição, clicheria, zincografia, litografia, fotolitografia.

Assim sendo, infere-se que deve prevalecer no caso em tela o disposto na Lei Complementar nº 87/96, que dispõe sobre as normas gerais do ICMS, cujo artigo 2º, inciso IV determina:

Art. 2° O imposto incide sobre:

IV - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não compreendidos na competência tributária dos Municípios;

Pelo exposto, responda-se à consulente que a fabricação de matrizes de serigrafia sob encomenda caracteriza-se como processo de industrialização, ex vi do RIPI, artigos 2º a 4º e, conseqüentemente, a venda destes produtos resulta em operação de circulação de mercadorias, fato que se configura hipótese de incidência do ICMS, restando afastada, in casu, a incidência do ISS.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 08 de fevereiro de 2007.

Lintney Nazareno da Veiga

AFRE – Mat. 191402.2

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia  08 de fevereiro de 2007.

Alda Rosa da Rocha                                                    Renato Vargas Prux

Secretária Executiva                                                    Presidente  da COPAT