EMENTA: ICMS. GALVANOPLASTIA DE OBJETOS DESTINADOS À INDUSTRIALIZAÇÃO OU COMERCIALIZAÇÃO. CARACTERIZADA A INDUSTRIALIZAÇÃO POR ENCOMENDA. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO ESTADUAL.

INCIDÊNCIA DO ISS, DE COMPETÊNCIA DOS MUNICÍPIOS, EXCLUSIVAMENTE QUANDO O ENCOMENDANTE FOR O PRÓPRIO CONSUMIDOR.

 

CONSULTA Nº: 16/06

D.O.E. de 19.09.06

01 - DA CONSULTA

             Informa a consulente que atua no ramo de industrialização para outras empresas, prestando serviços de galvanoplastia em geral, beneficiando produtos e suas partes que estão na etapa de produção ou de comercialização dos encomendantes.

             A dúvida da consulente reside no fato da galvanoplastia constar expressamente do item 14 da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 56/87, bem como no item 14.05 da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03, como sujeita à incidência do imposto sobre serviços, de competência municipal. Sucede que o primeiro dos textos citados excetuava expressamente a incidência do imposto municipal, quando os objetos submetidos ao referido processo se destinassem à industrialização ou à comercialização. O item 14.05 da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 não contém idêntica disposição.

             Ao final, formula a seguinte consulta a esta Comissão: a galvanoplastia passa a sujeitar-se exclusivamente ao ISS, mesmo quando o produto destinar-se à comercialização ou à industrialização, ou deverá continuar recolhendo o ICMS nesta última hipótese.

             A autoridade fiscal, em suas informações às fls. 30 a 32, sumariza a questão, ressaltando que o item 72 da lista de serviços da LC 56/87 ressalvava o beneficiamento de objetos não destinados à industrialização ou comercialização, garantindo assim a incidência do ICMS. Porém, a nova lista de serviços, da LC 116/03, não contém tal ressalva, o que levou os Municípios a cobrar o ISS inclusive quando o beneficiamento se insira no processo de industrialização. Conclui sustentando que a ressalva deve ser entendida como presente implicitamente, para preservar a aplicação do princípio da não-cumulatividade, de corte constitucional. Argumenta a mencionada autoridade:

“Sob o aspecto econômico, para uma compreensão ampla da matéria, há que se entender a terceirização de serviços dentro da cadeia produtiva. O fenômeno da terceirização pode ser entendido como movimento oposto à verticalização e acompanha o crescimento exponencial da própria cadeia produtiva, acarretando a especialização das diversas etapas pelas quais passa o processo de industrialização. Assim, cada agente econômico executa uma etapa específica do processo, assegurando, desta forma, a especialização e ganhos qualitativos e de produção em escala.

É relevante ressaltar que essa segmentação da cadeia produtiva, com a intervenção de diversos agentes econômicos, não descaracteriza a natureza econômica e jurídica do objeto, que uma vez concluída, resultará no produto final e acabado para o consumo. Nesse aspecto, em prevalecendo o imposto municipal, é forçoso admitir que a terceirização passou a onerar, via tributação do ISS, o produto final em relação à verticalização. Dessa forma, mantidas todas as demais variáveis constantes, haverá inegável acréscimo de custo ao produto final.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

             RICMS-SC, aprovado pelo Decreto nº 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, art. 27, I; Anexo 3, art. 8º, X.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

             Cuida-se na presente consulta da delimitação entre as respectivas esferas de competência impositiva dos Estados e dos Municípios. A Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 1988, cometeu aos Estados competência para instituir imposto sobre “operações relativas à circulação de mercadorias” (art. 155, II) e aos Municípios, competência para tributar “serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar” (art. 156, III). Os serviços compreendidos na competência tributária dos Estados são os de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

             A segunda restrição constitucional ao exercício da competência tributária dos Municípios (além do art. 155, II) é que precisam estar “definidos” em lei complementar, ou seja, que constem expressamente da “lista de serviços” (definição denotativa).

             Sucede que o item 72 da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 56/87, excluía da incidência do tributo municipal “os objetos não destinados à industrialização ou comercialização”. Porém, o item 14.05 da lista de serviços anexa à Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, não contém ressalva semelhante.

LC 56/87

“72 – Recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos não destinados à industrialização ou comercialização.”

LC 116/03

“14.05 – Restauração, recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos quaisquer.”

             A questão colocada pela consulente é se, a partir da edição da LC 116/03, incide apenas o ISS nas prestações referidas no item 14.05, com exclusão da incidência do ICMS, ou a restrição contida no item 72 “in fine” está implícita no item 14.05, como entende a autoridade fiscal.

             O fato é que a redação da antiga LC 56/87 é mais adequada à preservação do princípio da não cumulatividade, prestigiado pela Constituição Federal mesmo em relação aos novos impostos criados no exercício da competência residual. De fato, o art. 154, I, permite à União instituir, mediante lei complementar, impostos não previstos no texto constitucional, desde que sejam não cumulativos.

             A tese da tributação exclusiva pelo ISS do beneficiamento de objetos que se destinem à comercialização ou industrialização leva à cumulatividade do imposto, pois os insumos tributados pelo ICMS, utilizados no beneficiamento, não se transmitem ao destinatário (encomendante) do beneficiamento, cujo produto final será tributado novamente pelo ICMS, por ocasião da sua comercialização ou industrialização.

             Sérgio Pinto Martins ( Manual do ISS. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p.31) distingue a natureza da prestação de serviço nos seguintes termos:

“A circulação econômica implica, sempre, processo de passagem de um bem econômico de uma pessoa para outra, com a respectiva transmissão da utilidade econômica (bem econômico). Na circulação de bens imateriais (serviços), diferentemente do que ocorre na circulação de bens materiais (mercadorias), inexiste defasagem entre as etapas da produção, da circulação e do consumo. Em geral, os bens imateriais são consumidos no momento em que são produzidos. Há coincidência no tempo nas etapas da produção, da circulação e do consumo.”

Prossegue o mesmo autor (p. 37):

“Os serviços, à evidência, pertencem ao grupo dos bens imateriais ou incorpóreos, da res incorporales. Quando se presta um serviço a terceiro, oferece-se um bem imaterial, não se lhe entregando um bem material.”

“Qualquer bem econômico, material ou imaterial, não possui, por si próprio, como qualidade essencial, a natureza de produto, de mercadoria ou de serviço. Conforme a natureza do bem (se material ou imaterial) e a etapa do circuito econômico que esteja atravessando (se a da produção, da circulação ou do consumo), referido bem receberá a denominação de ‘produto’, ou de ‘mercadoria’ ou de ‘serviço’, de acordo com as duas variáveis citadas.”

(....)

“Tais bens recebem a denominação de: produto, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da ‘produção’; mercadoria, quando tenha a natureza de bem material e esteja na etapa econômica da ‘circulação’; ou serviço, quando tenha a natureza de bem imaterial e esteja na etapa econômica da ‘circulação’.”

             No caso em tela, a atividade desenvolvida pela consulente – galvanoplastia – pode caracterizar tanto uma “prestação de serviço” quanto uma industrialização por encomenda. Será prestação de serviço quando o encomendante for o próprio consumidor. Será industrialização para terceiros quando o seu objeto se destine à industrialização ou comercialização, até chegar ao consumidor final.

             Para ficar caracterizada a prestação de serviço, deve haver o fornecimento de bem incorpóreo que se consome no momento de sua produção.

             A legislação do Imposto sobre Produtos Industrializados (Decreto nº 87.981/82) define “industrialização” nos seguintes termos:

“Art. 3º Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como (Leis nº 4.502/64, artigo 3º, parágrafo único, e 5.172/66, artigo 46, parágrafo único):

“I – a que, exercida sobre matéria-prima ou produto intermediário, importe na obtenção de espécie nova (transformação);”

“II – a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);”

             O que distingue a prestação de serviços da industrialização, portanto, é a destinação do produto beneficiado. No primeiro caso, o encomendante é o próprio consumidor; a prestação do serviço confunde-se com o seu consumo. No segundo caso, o produto sofrerá ainda outras etapas de industrialização ou comercialização, até chegar ao consumidor final.

             Posto isto, responda-se à consulente:

             a) a galvanoplastia constitui industrialização para terceiros quando destinar-se à comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda – sujeita-se exclusivamente à incidência do ICMS;

             b) porém, incide exclusivamente o ISS quando o encomendante for o próprio consumidor o que caracteriza o fornecimento de bem imaterial que se consome no momento de sua produção.

À superior consideração da Comissão.

             Getri, em Florianópolis, 24 de janeiro de 2006.

Velocino Pacheco Filho

AFRE – matr. 184244-7

             De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia 21 de fevereiro de 2006.

Josiane de Souza Corrêa Silva                                             Vera Beatriz S. Oliveira

Secretário Executivo                                                            Presidente da Copat