EMENTA: ICMS. EMPRESA DE TRANSPORTE. EMISSÃO DE CONHECIMENTO RODOVIÁRIO DE CARGAS POR OUTRAS EMPRESAS (AGENTES). IMPOSSIBILIDADE.
O CONTRIBUINTE NÃO PODE, SEM A DEVIDA AUTORIZAÇÃO LEGAL, ADOTAR PROCEDIMENTO DIVERSO DO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA, SOB PENA DE COMETER ILÍCITO FISCAL PASSÍVEL DE IMPOSIÇÃO DE PENALIDADE.

CONSULTA Nº: 26/03

PROCESSO Nº: GR06 40.254/02-0

01 - DA CONSULTA

         A consulente é empresa estabelecida neste Estado no ramo de transporte rodoviário de cargas, operando em toda Região Sul e Região Sudeste do País. Informa que possui agentes em treze cidades de Santa Catarina e rotas que interligam estas cidades entre elas, bem como aos demais Estados do Sul e Sudeste. Tais agentes são empresas devidamente constituídas e localizadas nessas cidades e que prestam serviço de coleta e entrega das mercadorias transportadas. Cada agente, por ocasião da assinatura do contrato, recebe um software que permite-lhe acessar o servidor da consulente, em Caçador, e emitir conhecimentos de frete. Cada agente também recebe uma caixa de formulários contínuos de conhecimentos de frete, com os dados da matriz em  Caçador.

         A consulente justifica a sistemática adotada com os seguintes argumentos:

         “Nosso entendimento é de que, por nossa atividade ser de transporte de cargas, podemos iniciar a atividade em qualquer local neste Estado ou em outros Estados cumpridas é claro as determinações da legislação e emitidos os devidos documentos o que acontece em todas as nossas operações. Vejam que a Seção IV do RICMS/SC trata justamente do estabelecimento e prevê em vários parágrafos que o veículo é uma extensão do estabelecimento, justificando assim também nosso procedimento.

         Ao nosso ver cada caminhão poderia levar nas viagens um bloco de conhecimentos de fretes e emiti-lo sempre que inicie uma prestação de serviço de frete. O que nós utilizamos é apenas uma automatização desta emissão em certos pontos do Estado (nossos Agentes) para agilizar todo nosso processo.

         A apuração do imposto é feita em nossa sede, através do sistema automatizado.”

         A autoridade fiscal, em suas informações de fls. 10 a 13, manifesta-se contrário ao procedimento adotado pela consulente, justificando sua posição nos seguintes termos:

         “Os argumentos legais elencados pelo consulente não justificam seus procedimentos. O artigo 70 da parte geral do RICMS-SC veda a saída dos documentos fiscais do estabelecimento, exceto quando solicitado pelo fisco. O agente não é estabelecimento do consulente, portanto não é habilitado legalmente para portar e emitir os documentos fiscais deste. A alegação da agilização de procedimentos somente não autorizam o procedimento adotado.”

         A mesma autoridade fiscal sugere ainda que o sistema operacional da consulente poderá ser solucionado via regime especial, concedido nos termos do art. 1° do Anexo 6 do RICMS-SC, que “concilie os interesses do fisco com os do contribuinte”.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

         RICMS-SC/01, arts. 5 e 70;

         Anexo 5, art. 63;

         Anexo 6, art. 1°.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

         Equivocou-se a consulente na correta interpretação dos dispositivos regulamentares invocados que não lhe permitem estender o conceito de “estabelecimento”, que tem um significado preciso na legislação tributária, para abranger os seus agentes (empresas distintas da consulente). Examinemos, pois, os argumentos.

         À previsão geral e abstrata do fato gerador no antecedente da norma tributária, a doutrina chama de “hipótese de incidência” para distinguir da sua concreção no mundo fenomênico que recebe o nome de “fato imponível”. A hipótese de incidência (fato gerador) compreende vários aspectos, a saber: aspecto material, espacial, temporal e pessoal. O aspecto espacial da hipótese de incidência vem descrito no art. 4°, II, “a”, do Regulamento do ICMS. ele diz onde se considera ocorrido o fato gerador do imposto, ou seja, o local onde iniciada a prestação e qual o estabelecimento responsável, se existente. Ele não supre a existência do estabelecimento. Da mesma forma, o art. 3°, V, determina o aspecto temporal da hipótese de incidência e também não oferece supedâneo para o entendimento proposto.

         Também o art. 12 do Anexo 7 do Regulamento, que trata da possibilidade de se ter uma única numeração para os formulários contínuos, refere-se a “empresa que possui mais de um estabelecimento no Estado”. Se os agentes fossem estabelecimentos, aplicar-se-ia a regra do art. 12, mas não o contrário. Não se pode querer argumentar que os agentes são estabelecimentos com fundamento no art. 12. A consulente incorre no sofisma elementar conhecido como petição de princípio.

         Finalmente, quando a legislação tributária diz que o veículo é uma extensão do estabelecimento, não o faz em caráter geral, mas reporta-se a situações específicas. Assim, o § 4° do art. 5° do RICMS considera extensão do estabelecimento “o veículo utilizado em vendas fora do estabelecimento”. Cuida-se da hipótese em que o comerciante carrega com mercadorias um veículo, próprio ou afretado, e passa a realizar vendas ao longo do percurso do veículo. Para tanto, o veículo porta documentos do estabelecimento do qual ele é extensão, para documentar as referidas vendas. O dispositivo não pode ser ampliado de modo a transformar outras empresas em filiais da consulente.

         Conforme dispõe o art. 5° do RICMS, “estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias”. Não pode ser considerado, para os fins da legislação tributária, estabelecimento de empresa diversa da consulente. A consulente não está exercendo suas atividades naquele local. Outra empresa é que está exercendo a atividade de agenciamento.

         Nesse caso, como observa apropriadamente a autoridade fiscal informante, o art. 70 do RICMS veda expressamente a retirada dos documentos fiscais do “estabelecimento” do contribuinte, salvo para entregá-los na repartição fazendária quando solicitado ou quando retirados pela autoridade para fins de verificação fiscal. A única exceção prevista está no § 2° que permite a retirada por escritório contábil, desde que “credenciado” pelo fisco.

         A legislação tributária estabelece um modus operandi a ser seguido pelo contribuinte. Constitui as “obrigações tributárias acessórias” a que se refere o § 2° do art. 113 do Código Tributário Nacional e que tem por objeto “as prestações positivas ou negativas previstas no interesse da arrecadação ou fiscalização dos tributos”. O contribuinte não pode, unilateralmente, sem a prévia concordância do fisco, adotar outro procedimento diverso do previsto. Se o fizer estará cometendo infração tributária e ficará sujeito à sanção respectiva. Adverte o § 3° do mesmo artigo citado que “a obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária”.

         Isto posto, responda-se à consulente:

         a) não é permitida a emissão e o uso dos documentos fiscais da consulente por empresa diversa (agente) posto que esta não se caracteriza como “estabelecimento” da consulente;

         b) a adoção de procedimento diverso do previsto na legislação tributária constitui infração passível de sanção.           

         À superior consideração da Comissão.

         Getri, em Florianópolis, 8 de janeiro de 2003.

Velocino Pacheco Filho

FTE - matr. 184244-7

         De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia  28 de abril de 2003.

Laudenir Fernando Petroncini                                               Anastácio Martins

Secretário Executivo                                                            Presidente da Copat