EMENTA:  ICMS. SERVIÇO DE TRANSPORTE. A COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE BILHETE DE PASSAGEM É DOS ESTADOS QUE DETÊM A COMPETÊNCIA PARA INSTITUIR O IMPOSTO.
SEGURO DE ACIDENTES PESSOAIS FACULTATIVO. SE FOR COBRADO DO USUÁRIO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE, INTEGRA A BASE DE CÁLCULO. ATOS NORMATIVOS DE HIERARQUIA INFERIOR NÃO PODEM MODIFICAR DISPOSIÇÕES DE LEI COMPLEMENTAR.

CONSULTA Nº: 30/2002

PROCESSO Nº: PSEF 89136/01-2

01 - DA CONSULTA

         A consulente, entidade representativa das empresas do setor, pede orientação quanto ao procedimento que deve adotar relativamente ao seguro de acidentes pessoais facultativo.

         Conforme dispõe a Lei Complementar n° 87/96, art. 13, § 1°, II, "a", integra a base de cálculo do ICMS o valor correspondente a seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição.

         Entretanto, a Norma Complementar n° 08/98 do Decreto n° 2.521/98, aprovada pela Portaria n° 396 do Ministro dos Transportes, proíbe expressamente que o seguro de acidentes pessoais facultativo seja comercializado no bilhete de passagem.

         Ora, a legislação expressamente define o bilhete de passagem como único documento fiscal nas operações de transporte rodoviário de passageiros. Assim, falece às empresas de transporte de passageiros documento fiscal idôneo "que embase o valor do seguro facultativo cobrado do usuário".

         Isto posto, a consulente pede manifestação expressa sobre a matéria, considerando que o art. 37, XVIII, da Constituição Federal outorga precedência da administração fazendária sobre os demais setores administrativos.

         O 16° DRF do DNER, a fls. 4, esclarece que "todos os passageiros dos serviços interestaduais e internacionais, estão cobertos com o seguro de responsabilidade civil, no valor de R$ 1.200.772,67 (hum milhão, duzentos mil, setecentos e setenta e dois reais e sessenta e sete centavos) por veículo e por evento, já incluídos no valor da passagem".

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Lei Complementar n° 87, de 13 de setembro de 1996, art. 13, § 1°, II, "a";

RICMS-SC/01, Anexo 5, arts. 95 a 99 e 138;

Convênio SINIEF 6/89.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

         Inicialmente devemos observar que o mencionado seguro de acidentes pessoais é facultativo. Ou seja, pode ou não ser cobrado, a critério do usuário. Caso este opte por não fazer o seguro, não há nada a ser integrado à base de cálculo do imposto e, por conseguinte nada a constar do bilhete de passagem ou de qualquer outro documento.

         O informativo da 16ª DRF sugere que o seguro de acidentes pessoais facultativo é supérfluo, podendo ser dispensado, já que os passageiros estariam cobertos, nas viagens interestaduais e internacionais, por seguro de responsabilidade civil, já incluídos no valor da passagem.

         Contudo, se o usuário optar pelo seguro de acidentes pessoais facultativo este deve integrar a base de cálculo do ICMS, por imposição da Lei Complementar n° 87/96.

         A questão que aflige a consulente é que com a proibição de comercializar, no bilhete de passagem, o indigitado seguro, fica sem documento fiscal próprio onde constar o valor do seguro. Ora, já que o seguro, se cobrado do passageiro, integra a base de cálculo do ICMS e o documento fiscal respectivo deve identificar os elementos que compõe a respectiva base de cálculo, então o valor do seguro deve necessariamente constar do bilhete de passagem.

         Resta indagar da competência do Ministério dos Transportes em dispor sobre o bilhete de passagem que é um documento fiscal, criado para fins de cobrança e fiscalização do ICMS e impresso mediante autorização das autoridades fazendárias estaduais.

         Antes de mais nada, devemos considerar que um diploma normativo infra legal, no caso uma portaria ministerial, não pode opor-se a uma lei complementar, sob pena de subverter o princípio da hierarquia das normas. "É evidente que, em face da hierarquia que preside a autoridade dos diplomas legais, um regulamento não pode contrariar uma lei stricto sensu" (Limongi França, Hermenêutica Jurídica, 1999, p. 114). No mesmo sentido, milita o autorizado magistério de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito, 1988, p. 136):

         "Prevalece, nos casos de antinomia evidente, a Constituição Federal sobre a Estadual, e esta contra o Estatuto orgânico do município; a lei básica sobre a ânua e a ordinária, ambas, por sua vez, superiores a regulamentos, instruções e avisos; o Direito escrito sobre o consuetudinário."

         Se a lei complementar, votada pelo Congresso Nacional, cuja aprovação depende de quorum qualificado, manda incluir o seguro na base de cálculo do imposto, não pode um ato monocrático de ministro de Estado proibir a sua inclusão no documento fiscal relativo ao respectivo fato gerador da imposição tributária.

         Nessa altura deve ficar perfeitamente claro que o bilhete de passagem é um documento fiscal, cujo uso, preenchimento e características são disciplinadas pela legislação tributária. Com efeito, o bilhete de passagem rege-se pelo disposto nos arts. 95 a 99 do Anexo 5 do RICMS-SC, aprovado pelo Decreto n° 2.870, de 27 de agosto de 2001. A impressão do bilhete de passagem sujeita-se a controle e autorização da administração tributária estadual, mediante Autorização para Impressão de Documentos Fiscais - AIDF, conforme arts. 96, X, e 138 do diploma legal citado.

         Finalmente, a previsão do bilhete de passagem consta do Convênio SINIEF n° 6/89, celebrado pelo Ministro da Fazenda e os secretários de fazenda ou finanças dos Estados e do Distrito Federal, com fundamento no art. 199 do Código Tributário Nacional, que modificou o Convênio do Rio de Janeiro, de 1970.

         Isto posto, responda-se à consulente:

         a) se o seguro de acidentes pessoais facultativo for efetivamente cobrado do usuário do serviço de transporte, ele integra a base de cálculo do ICMS;

         b) o documento fiscal próprio para registrar a ocorrência do fato imponível é o bilhete de passagem, documento este criado pelos Estados para fins de cobrança e fiscalização do ICMS e impresso mediante autorização da administração tributária estadual;

         c) a competência para legislar sobre bilhete de passagem é dos Estados que detém a competência para instituir e cobrar o ICMS;

         d) atos normativos infralegais, como portarias ministeriais, não podem contrariar disposições de lei complementar, face ao princípio da hierarquia dos atos normativos.

À superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 14 de fevereiro de 2002.

Velocino Pacheco Filho

FTE - matr. 184244-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia   2 de outubro de 2002.

Laudenir Fernando Petroncini                                                    João Paulo Mosena

       Secretário Executivo                                                          Presidente da Copat