EMENTA: ICMS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. BENEFÍCIO CONCEDIDO COMO FORMA ALTERNATIVA DE APURAÇÃO DO IMPOSTO, A SER ADOTADA A CRITÉRIO EXCLUSIVO DO CONTRIBUINTE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO SIMULTÂNEA COM A FORMA DE APURAÇÃO NORMAL, MEDIANTE APROVEITAMENTO DE CRÉDITOS PELAS ENTRADAS.
CORREÇÃO MONETÁRIA. DESCABIMENTO. REDUÇÃO INDEVIDA DO IMPOSTO A RECOLHER.

CONSULTA Nº: 78/2001

PROCESSO Nº: GR11 57.566/01-1

01. CONSULTA

A empresa acima identificada, prestadora de serviços de transporte coletivo, dirige-se à COPAT formulando consulta sobre a possibilidade de aproveitamento proporcional de créditos em função de suas entradas, tendo em vista sua opção pela redução da base de cálculo do imposto, conforme previsto nos Convênios ICMS 46/89, 38/89 e 89/89.

Prevêem esses Convênios, e de igual modo a legislação que implementou suas disposições no estado, que esse benefício somente seja aplicado mediante opção do contribuinte, visto que tem a finalidade de substituir a sistemática normal de apuração do imposto, realizada pelo confronto periódico entre débitos e créditos do imposto.

Entende a consulente, no entanto, que tais disposições contrariam o princípio da não cumulatividade, pelo que se estaria diante de disposição inaplicável, por ser inconstitucional.

Afirma ainda que, mesmo com a aplicação do benefício, não pode perder o ICMS seu caráter de imposto não cumulativo. Em função disso, entende ter direito, mesmo fruindo do favor fiscal, a promover o creditamento pelas entradas na mesma proporção em que devido o tributo em suas operações. Seu direito ao crédito, assim, somente encontraria limite na proporção direita da redução da base de cálculo da incidência.

Argumenta que os mencionados convênios estabelecem verdadeira vedação à compensação do imposto, provocando com isso aumento indevido do tributo a recolher, situação não permitida pela Constituição Federal.

Também apresenta a consulente extensa argumentação em defesa da possibilidade de correção monetária de saldos credores do imposto que, em função da inexistência de débitos suficientes para sua absorção, sejam, na forma prevista pela legislação, transferidos para períodos seguintes de apuração.

Alega a necessidade de recomposição do valor patrimonial do direito de crédito, verificável apenas mediante a correção monetária, aduzindo que a não permissão desta implicaria a não realização efetiva do princípio da não cumulatividade. Também sustenta que a não permissão da correção de saldos credores ofenderia o princípio da isonomia, dado que os créditos tributários, de que o Estado é credor, são corrigidos.

Diante da inexistência de norma que preveja a correção monetária, propõe seja essa "lacuna da lei" suprida com recurso à equidade.

Após o recurso a uma miríade de insistentes argumentos em defesa de seu entendimento, dentre os quais incluem-se algumas transcrições de posições doutrinárias favoráveis à possibilidade de aproveitamento extemporâneo de créditos, a consulente elabora uma longa lista de questionamentos, em relação aos quais pretende obter a manifestação da Comissão. Solicita, assim, resposta às seguintes perguntas:

a) qual a classificação técnica concedida por essa Secretaria ao serviço de transporte coletivo?

b) quais os critérios legais de apuração do ICMS devido?

c) qual o tratamento contábil e fiscal que deverá ser concedido ao ICMS na etapa anterior?

d) o tratamento concedido pelo estado ao crédito do ICMS sobre o transporte preserva o princípio da não cumulatividade?

e) há alguma diferenciação de tratamento quanto ao tempo de utilização dos créditos?

f) em sendo a não cumulatividade um princípio constitucional, em que dispositivo legal se estriba o fisco para impor restrições ao crédito proporcional?

g) existe alguma restrição legal que faça a distinção entre o tributo efetivamente cobrado ou o tributo devido?

h) diante da disposição constitucional do art. 155, § 2°, I, tem o contribuinte a obrigação de fiscalizar o efetivo recolhimento do tributo, para só então merecer o direito compensatório?

i) caso positiva a resposta à questão anterior, não estaria havendo uma inversão de valores, estando investido o contribuinte de deveres exclusivos do Estado?
j) em se tratando o ICMS de tributo não cumulativo, a vedação ao direito de recuperação de créditos extemporâneos não seria uma forma transversa de negar o direito constitucional assegurado?

l) a não recuperação de valores apurados, com a devida correção monetária, não estaria provocando o enriquecimento sem causa do Estado, vedado pelo art. 964 do Código Civil?

m) que diferenciação e qual o dispositivo legal que especifica as diferenças entre os créditos imediatos e os extemporâneos?

n) o direito de compensação de créditos encontra limitações legais de caráter prescritivo ou decadencial?

o) inexistindo qualquer disposição que limite a compensação no tempo, é direito do contribuinte lançar a crédito valores não escriturados e não aproveitados à época de sua ocorrência?

p) são a analogia e os princípios legais de direito suficientes para embasar seu procedimento, ou existe na legislação algum dispositivo específico a regular a matéria?

q) há vedação expressa que proíba a correção monetária de créditos escriturados extemporaneamente?

02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Código Tributário Nacional, art. 108;

RICMS/01, Anexo 2, art. 25;

RICMS/89, Anexo IV, art. 10.

03. FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

A despeito da demasiadamente extensa exposição que faz a consulente de seus argumentos, e da variedade dos questionamentos formulados - muito repetitivos em alguns pontos e em geral formulados de forma muito pouco clara e objetiva - a matéria consultada pode ser resumida a duas questões principais, às quais se reportam todas as dúvidas expressadas pela consulente.

A primeira e principal delas é a relativa à possibilidade de aproveitamento de créditos pela consulente, tendo em vista sua declarada opção pela tributação de suas operações na forma prevista no art. 10 do Anexo IV do RICMS/89. O dispositivo referido estabelece, na redação que lhe é dada pela alteração 45ª, promovida pelo Decreto n° 3.782, de 30 de agosto de 1989, vigente de 1° de março de 1989 a 31 de dezembro de 1996, uma redução da base de cálculo do ICMS, como meio para uma redução da carga tributária do imposto incidente sobre as prestações de serviço de transporte.

Como propõe uma forma alternativa de tributação dessas operações, o dispositivo exclui a possibilidade de aplicação cumulativa da forma tradicional de apuração do imposto, realizado pelo confronto entre a totalidade de débitos e a de créditos que o contribuinte haja incorrido em determinado período. Assim dispõe o dispositivo em questão:

Art. 10. Fica concedida redução de base de cálculo do ICMS nas prestações de serviços tributadas de transporte, de tal forma que a incidência do imposto resulte nos percentuais abaixo indicados:

I - até 30 de abril de 1989 (Convênios ICM 46/89 e ICMS 25/89):

a) serviços de transporte rodoviário, observado o disposto no inciso seguinte - 5%;

b) serviços de transportes isentos ou não sujeitos à incidência do Imposto sobre Transportes em 27 de fevereiro de 1989 - zero.

II - de 1° a 31 de maio de 1989:

a) no transporte de passageiros - 5,1%;

b) no transporte de carga - 6,0% (Convênio ICMS 38/89);

III - no mês de junho (Convênio ICMS 38/89):

a) prestações com alíquotas de 17% ou 12% - 9%;

b) prestações com alíquotas de 8% - 6,5%;

IV - a partir do mês de julho (Convênio ICMS 38/89):

a) prestações com alíquotas de 17% - 13,6%;

b) prestações com alíquotas de 12% - 9,6%;

c) prestações com alíquotas de 8% - 7,2%;

§ 1° A redução da base de cálculo será aplicada opcionalmente, pelo contribuinte, em substituição ao sistema de tributação previsto na parte geral deste Regulamento.

§ 2° O contribuinte que optar pelo benefício previsto neste artigo não poderá utilizar créditos fiscais relativos a entradas tributadas.

§ 3° O benefício previsto neste artigo não se aplica às prestações de serviço de transporte aéreo (Convênio ICMS 38/89).

Como visto, § 1° do art. 10 do Anexo IV diz somente ter lugar a aplicação da referida redução da base de cálculo caso o contribuinte opte por essa forma alternativa de tributação das prestações de serviço de transporte, caso em que será esta aplicada em substituição ao sistema de tributação normal, ao qual já se fez referência.

A consulente, no entanto, opõe-se ferozmente ao dispositivo, acusando-o de inconstitucional, por desrespeitar o princípio da não cumulatividade, ao estabelecer vedação ao aproveitamento de créditos.

Contudo, deve-se observar que o dispositivo não veda que créditos sejam aproveitados. Apenas propõe que, em função de um julgamento deixado inteiramente a cargo do contribuinte, esses créditos sejam substituídos pela redução da base de cálculo proposta.

Vale ressaltar, portanto, o caráter opcional do benefício, cuja adoção depende única e exclusivamente dos interesses do contribuinte, a quem é dada a faculdade de decidir sobre a oportunidade e conveniência de optar pelo regime simplificado, inclusive quanto à sua manutenção.

Por serem sistemas alternativos (confronto entre débitos e créditos versus redução da base de cálculo), são mutuamente excludentes. É inadmissível, ao contrário do que pretende a consulente, que o contribuinte se utilize simultaneamente de ambas as formas de apuração do imposto.

Mais ainda quando pretende beneficiar-se apenas da parte que lhe é favorável do benefício, ignorando o ônus imposto pela legislação para sua fruição. Ou seja, pretende reduzir a base de cálculo do imposto, e também aproveitar o crédito oriundo de entradas tributadas, ainda que proporcionalmente à redução. Isso é absurdo, haja vista que a redução é permitida justamente em substituição àqueles créditos.

Mesmo sendo proporcional à redução à base de cálculo do imposto, o aproveitamento dos créditos, na hipótese, mostra-se inaceitável, pois o benefício é alternativo ao regime de apuração normal. Se o contribuinte decidiu abandonar esse regime normal de apuração, fica impossibilitado o aproveitamento de todo e qualquer crédito, dada sua substituição pela redução da base de cálculo.

Não se trata da proibição ao aproveitamento do crédito, mas da substituição deste por um benefício que igualmente reduz a carga tributária a que sujeitas as prestações de serviço de transporte.

Não há que se falar, portanto, em ofensa ao princípio da não-cumulatividade e muito menos em prejuízo ao contribuinte. A não-cumulatividade visa evitar a bi-tributação ou ainda a tributação em cascata, de forma que o imposto incidente sobre uma mercadoria em suas várias etapas de circulação nunca será superior à aplicação da alíquota sobre seu preço final.

Vale lembrar que o volume de créditos proporcionado normalmente por suas entradas for tal que supere a vantagem oferecida pela redução da base de cálculo, nada impede a consulente de permanecer sob o regime normal de apuração do imposto, abatendo dos débitos incorridos nas prestações realizadas os créditos por suas entradas. Basta, para isso, que não opte pelo regime alternativo estabelecido pelo art. 10 do Anexo IV do RICMS/89.

Se a não-cumulatividade visa, mediante a compensação do imposto devido com o imposto pago nas operações anteriores, impedir que na operação subsequente se tribute integralmente a mercadoria ou serviço, este objetivo fica assegurado pela redução da base de cálculo, uma vez que, indiretamente, proporciona uma redução do imposto a recolher ainda maior que aquela que os créditos proporcionariam.

Para demonstrar a correção desse entendimento, e afastar absoluta e definitivamente as pretensões da consulente, deve-se lembrar que essa é a posição tomada, por unanimidade dos votos de seu Tribunal Pleno, pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1.502-8, em que se pretendia a declaração da inconstitucionalidade precisamente do dispositivo combatido pela consulente. Lê-se na ementa do referido acórdão, de que é relator o Min. Ilmar Galvão:

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONVÊNIOS ICM N° 46/89 E ICMS N° 38/89 (PARÁGRAFO ÚNICO DAS RESPECTIVAS CLÁUSULAS SEGUNDAS), QUE ESTARIAM A IMPEDIR O PRESTADOR DE SERVIÇO DE TRANSPORTE RODOVIÁRIO DE UTILIZAR CRÉDITOS FISCAIS RELATIVOS A ENTRADAS TRIBUTADAS, COM OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, DA NÃO-CUMULATIVIDADE E DA COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ESTADUAL. REQUERIMENTO DE CAUTELAR.

"Dispositivo que, ao revés, se limita a estabelecer compensação automática para a redução da carga tributária operada por efeito da cláusula anterior, como parte do sistema simplificado de contabilização e cálculo do tributo incidente sobre as operações sob enfoque, constituindo, por isso, parte do sistema idealizado e posto à livre opção do contribuinte.

"Assim, eventual suspensão de sua vigência, valeria pela conversão do referido sistema em simples incentivo fiscal não objetivado pelos diplomas normativos sob enfoque, transformado, por esse modo, o Supremo Tribunal Federal em legislador positivo, papel que lhe é vedado desempenhar nas ações da espécie.

"Conclusão que desveste de qualquer plausibilidade os fundamentos da inicial".

Do voto condutor do acórdão, destaca-se o seguinte excerto:

"Desnecessário grande esforço interpretativo para concluir que se está diante de medida que objetivou tão-somente simplificar o trabalho contábil do contribuinte e, ao mesmo tempo, facilitar a tarefa de fiscalização, a cargo dos agentes da Fazenda.

"Optando pelo novo sistema, recolhe o contribuinte o ICMS calculado à base de apenas 5%, mas, em compensação, fica impedido de efetuar lançamentos relativos a créditos fiscais, pelas entradas tributadas.

"Trata-se, portanto, de um benefício vinculado, mal ou bem, tão-somente às obrigações acessórias do contribuinte (escrituração de livros, etc.), sendo de presumir, dado o caráter facultativo de que, obviamente, se reveste a opção, que não importou redução de imposto, compensada que resultou a redução da alíquota, operada pela via indireta da redução da base de cálculo, pela eliminação dos créditos fiscais, valores que a lógica faz supor equivalentes.

"Assim sendo, é fora de dúvida que a declaração de inconstitucionalidade tão-somente do parágrafo, como pretendido pela Autora, importaria a transformação de simples processo simplificado de cálculo do imposto em substancial redução do tributo, com o que estaria o próprio Supremo Tribunal, acaso deferida a cautelar, a conceder incentivo fiscal, substituindo-se, por esse modo, ao legislador e, o que seria ainda mais grave, em campo dos mais delicados, porque sujeito ao princípio estrito da legalidade.

"Trata-se de constatação por si só suficiente para desvestir de qualquer plausibilidade os fundamentos da inicial (alegação de ofensa aos princípios da isonomia, da não-cumulatividade e da competência tributária estadual), levando ao indeferimento da cautelar."

É desnecessário qualquer acréscimo aos argumentos já acima expendidos, todos confirmados por essa decisão do Pretório Excelso, que tratou a matéria de forma definitiva. A situação tratada no acórdão é, como se pode observar, idêntica à que é objeto da presente consulta. Pode-se então concluir, com empréstimo dos termos em que vazado o voto condutor do acórdão, que os argumentos e conclusões defendidos pela consulente revelam-se desvestidos de qualquer plausibilidade. Dessa forma, tem-se que, ao contrário do que afirma a consulente, está incorreta sua forma de proceder, uma vez que não lhe assiste o direito de aproveitamento de créditos do ICMS em função de suas entradas, de forma simultânea à fruição da redução da base de cálculo do imposto estabelecida pelo art. 10 do Anexo IV do RICMS/89.

A respeito, deve-se ainda observar que a partir de 1° de janeiro de 1997, o benefício fiscal em apreço sofreu as alterações decorrentes da aprovação do Convênio ICMS 106/96. Ao invés de uma redução de base de cálculo, o benefício, ainda alternativo ao sistema normal de apuração do imposto, passou a consistir em um crédito presumido do ICMS. Nessa mesma forma, o benefício é atualmente tratado pelo art. 25 do Anexo 2 do RICMS/01.

A concessão de crédito, em lugar da redução da base de cálculo, não modificou o resultado final do benefício, relativamente ao montante do tributo a pagar pelo contribuinte optante. O benefício proporcionado pela antiga redução de base de cálculo é exatamente o mesmo auferido com o crédito presumido.

Seja na forma de redução de base de cálculo, seja na de crédito presumido, a resposta à consulta, elaborada à luz da legislação vigente à época da consulta, não sofre alteração, aplicando-se, pelos mesmos fundamentos, à nova configuração do benefício.

Correção monetária de créditos

O segundo tema da extensa consulta ora analisada diz respeito à possibilidade de correção monetária de créditos do imposto não aproveitados em época oportuna, ou que, embora lançados nos livros próprios, não tenham sido absorvidos pelo volume insuficiente de débitos gerados pelos negócios do contribuinte. Também neste caso, as ponderações e conclusões encampadas pela consulente são equivocadas.

A rigor, a análise e resposta a essa parte da consulta fica desde logo prejudicada pela constatação de que à consulente não assiste o direito de aproveitamento dos créditos pretendidos, sobre os quais incidiria, segundo seu entendimento, a correção monetária. Não havendo, pois, o crédito a ser corrigido, desnecessário perquirir acerca do próprio direito à correção. Desaparece o aspecto secundário, acessório, na ausência do principal a que se refere. Apesar disso, convém que sejam feitas algumas observações a respeito, a título de esclarecimento da matéria.

A questão já foi apreciada pela COPAT, em resposta à Consulta nº 18/96, cuja ementa vem expressa nos seguintes termos, que demonstram a incorreção do entendimento da consulente:

"ICMS. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO CRÉDITO FISCAL. INCABIMENTO. REDUÇÃO INDEVIDA DO IMPOSTO A RECOLHER."

Da fundamentação do referido parecer merece destaque o seguinte excerto:

"O ICMS apurado na forma da lei torna-se dívida do contribuinte para com o Estado. Ocorrendo, no mundo fático, a hipótese descrita na norma como fato gerador do imposto, nasce a obrigação de recolher o tributo. Não sendo recolhido, no prazo legal, sobre esse crédito tributário (crédito da Fazenda Pública contra o sujeito passivo), passa a incidir atualização monetária, como forma de preservar a receita pública devida e não paga.

"Diversa é a situação do crédito fiscal que, no entendimento pacífico da doutrina, não é verdadeiramente um crédito no sentido obrigacional do termo, mas mero direito de abater o imposto que incidiu em etapas anteriores de comercialização, para fins de cálculo do montante devido. A variação, no tempo, do valor da moeda não é considerada nesse cálculo, sob pena de desvirtuar o próprio princípio da não-cumulatividade, onerando a mercadoria com acréscimo de valor maior que o efetivamente recolhido a título de imposto. O interesse privado (do contribuinte) não prevalece sobre o interesse coletivo (do Estado e dos consumidores).

"O Excelso Pretório, em remansosa jurisprudência "tem timbrado no estabelecer a dicotomia entre o direito de crédito e restituição de indébito" (Min. Otávio Gallotti, no RE n° 105.084). Isto porque, na repetição do indébito, há, de fato, uma dívida do Estado para com o contribuinte, originada do pagamento indevido. Por isso mesmo, é devida a atualização monetária desde a data do recolhimento indevido.

"O próprio STF, em numerosos julgados, tem entendido não caber atualização monetária do crédito fiscal, ao menos nos casos de reconhecimento de direito do crédito em operações isentas, anteriormente à Emenda Passos Porto (ver, entre outros, ERE 104.963-4, RE 105.867-6, RE 106.604-1, RE 106.629-6, RE 107.110-9, RE 108.230-5, RE 108.328-0, RE 108.699-8, RE 109.115-1, RE 109.204-1, RE 109.377-3, Ag.Rg. 109.476-1, RE 109.841-4, RE 110.215-2, RE 110.233-1, RE 110.320-5, RE 110.617-4 etc.)"

Também aqui, as pretensões da consulente encontram obstáculo intransponível em jurisprudência sedimentada do Supremo Tribunal Federal, por decisões de suas Primeira e Segunda Turmas, que confirmam o entendimento da COPAT, expresso no parecer acima transcrito. Citem-se como exemplo da orientação da Corte Suprema os seguintes julgados:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. ICMS. CORREÇÃO MONETÁRIA DO DÉBITO FISCAL. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA ISONOMIA E AO DA NÃO-CUMULATIVIDADE. IMPROCEDÊNCIA.

"1. Crédito do ICMS. Natureza meramente contábil. Operação escritural, razão pela qual não se pode pretender a aplicação da atualização monetária.

"2. A correção monetária do crédito do ICMS, por não estar prevista na legislação estadual, não pode ser deferida pelo Judiciário sob pena de substituir-se o legislador em matéria de sua estrita competência.

"3. Alegação de ofensa ao princípio da isonomia e ao da não-cumulatividade. Improcedência. Se a legislação estadual somente prevê a correção do débito tributário e não a atualização do crédito, não há que se falar em tratamento desigual a situações equivalentes.

"3.1. A correção monetária incide sobre o débito tributário devidamente constituído, ou quando recolhido em atraso. Diferencia-se do crédito escritural - técnica de contabilização para a equação entre débito e crédito -, a fim de fazer valer o princípio da não-cumulatividade.

"Recurso extraordinário conhecido e provido." (RE 224026/SP, STF, 2ª T, Rel. Min. Maurício Correia)

"TRIBUTÁRIO. ICMS. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. PRETENDIDA CORREÇÃO DOS CRÉDITOS ACUMULADOS, EM HOMENAGEM AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA E DA NÃO-CUMULATIVIDADE.

"O sistema de créditos e débitos, por meio do qual se apura o ICMS devido, tem por base valores certos, correspondentes ao tributo incidente sobre as diversas operações mercantis, ativas e passivas realizadas no período considerado, razão pela qual tais valores, justamente com vista à observância do princípio da não cumulatividade, são insuscetíveis de alteração em face de quaisquer fatores econômicos ou financeiros.

"De ter-se em conta, ainda, que não há falar, no caso, em aplicação do princípio da isonomia, posto não configurar obrigação do Estado, muito menos sujeita a efeitos moratórios, eventual saldo escritural favorável ao contribuinte, situação reveladora, tão-somente, de ausência de débito fiscal, este sim sujeito a juros e correção monetária, em caso de não recolhimento  no prazo estabelecido.

"Recurso não conhecido." (RE 195.643-7 RS, STF, 1ª T, j. 24/04/98, un., Rel.: Min. Ilmar Galvão, LEX 240: 181)

Resta claro, portanto, o descabimento da atualização monetária de créditos relativos ao ICMS, e a absoluta conformidade dessa vedação aos princípios constitucionais invocados pela consulente.

Destaque-se, por fim, a absoluta impertinência da pretensão da consulente de ver-se investida no direito de corrigir  monetariamente saldos credos do ICMS baseada no emprego da equidade, uma vez inexistir disposição legal que autorize tal procedimento. Com efeito, o Código Tributário Nacional em seu art. 108, ao disciplinar os meios de integração da legislação tributária, admite o recurso à equidade, cuja aplicação, no entanto, encontra desde logo limitação expressa no § 2° do mesmo dispositivo, que estabelece que "o emprego da eqüidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido", o que inevitavelmente ocorreria caso a correção fosse admitida, e razão do reconhecimento de sua inadmissibilidade pela Corte Suprema.

Por todo o exposto, responda-se à consulente:

a) que inexiste tal classificação técnica a que se refere a consulente. O serviço de transporte coletivo de passageiros, quando interestadual ou intermunicipal, integra, juntamente com o serviço de transporte de cargas, o campo constitucional de incidência do ICMS;

b) que os critérios legais de apuração do ICMS são, naturalmente, aqueles estabelecidos pela legislação. Não cabe em sede de consulta repetir as disposições legais, facilmente ao alcance da consulente, mas tão somente oferecer solução para dúvidas relativas à aplicação dessa legislação;

c) que em relação ao ICMS cobrado em operações anteriores, o contribuinte do imposto que venha a realizar nova operação tributável, ou ainda em casos especiais expressamente autorizados pela legislação, como nas exportações poderá creditar-se do valor correspondente, para compensação com o imposto devido em sua própria operação;

d) que o estado preserva, obviamente, o princípio da não cumulatividade em relação ao direito ao crédito pelas empresas transportadoras.;

e) que a questão relativa à existência de ressalvas na legislação à utilização extemporânea de créditos fica prejudicada pela constatação de a consulente não tem direito aos créditos pretendidos. Esclareça-se, não obstante, que a Lei Complementar n° 87/96, em seu art. 23, parágrafo único, estabelece que "o direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento";

f) na hipótese de que trata a consulta, a restrição ao aproveitamento do crédito pretendido pela consulente é estabelecida pela própria legislação que estabelece o benefício a ser utilizado em substituição desses créditos, cuja constitucionalidade, como demonstrado, já foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal;

g) que em relação à possibilidade de aproveitamento de créditos pelo contribuinte destinatário da operação tributada não há qualquer distinção entre tributo devido e efetivamente cobrado na operação anterior;

h) que o contribuinte não está obrigado a fiscalizar o efetivo recolhimento do tributo na operação anterior, para só então efetuar o aproveitamento do crédito;

i) a resposta à questão i fica prejudicada em função da resposta dada à anterior;

j) que o estabelecimento pela legislação de um limite temporal para o aproveitamento de crédito não implica ofensa ao princípio constitucional da não cumulatividade. É apenas uma forma de evitar o prolongamento indefinido de uma situação, em prejuízo ao princípio da segurança jurídica, como ocorre em todos os casos em que a legislação prevê a decadência ou a prescrição de um direito. Com efeito, a imprescritibilidade é situação excepcionalíssima, restrita apenas a uns poucos casos expressamente ressalvados;

l) conforme demonstrado, não cabe correção monetária de créditos destinados à compensação com o ICMS devido. Essa impossibilidade foi, como se viu, determinada de forma definitiva pelo Supremo Tribunal Federal. A não atualização desses valores, assim, em nada contraria os princípios constitucionais apontados pela consulente, nem tampouco as disposições da legislação infraconstitucional;

m) a lei não trata diferentemente os créditos em função de seu aproveitamento imediato ou extemporâneo. Ressalve-se apenas a impossibilidade, já apontada na resposta ao item e, acima, de utilização de créditos crédito extingue depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento respectivo;

n) que o direito de compensação de créditos encontra limitações legais de caráter prescritivo ou decadencial no parágrafo único do art. 23 da Lei Complementar n° 87/96, já referido na resposta ao item e, acima;

o) que a resposta à questão de letra o fica prejudicada em função da resposta ao item anterior;

p) que seu procedimento, descrito na consulta, não encontra suporte legal na legislação. Ao contrário, a posição defendida pela consulente, em particular no que respeita à possibilidade de aproveitamento de créditos cumulativamente à fruição do benefício de redução da base de cálculo do imposto, contraria frontalmente disposição expressa da legislação, cuja constitucionalidade foi reconhecida pela mais alta corte do país, em decisão unânime da totalidade de seus membros. Melhor sorte não a assiste na defesa da correção monetária de créditos, cuja impossibilidade também foi já definitivamente afirmada pelo Supremo Tribunal Federal, conforme anteriormente demonstrado;

q) que a legislação vigente não admite a correção monetária de créditos do ICMS destinados à compensação com o imposto devido, e que a eventual ausência de autorização nesse sentido não pode ser suprida pelo emprego da equidade, como sugere a consulente. Com efeito, a referência que faz o Código Tributário Nacional à possibilidade de aplicação da equidade na interpretação da legislação tributária encontra limitação expressa no § 2° de seu art. 108, que estabelece que "o emprego da eqüidade não poderá resultar na dispensa do pagamento de tributo devido", o que inevitavelmente ocorreria caso a correção fosse admitida, e razão do reconhecimento de sua inadmissibilidade pela Corte Suprema.

É o parecer. À consideração da Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 29 de outubro de 2001.

Laudenir Fernando Petroncini

FTE -  Matr. 301.275-1

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 31 de outubro de 2001.

Laudenir Fernando Petroncini                                João Paulo Mosena

Secretário Executivo                                            Presidente da COPAT