EMENTA: ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO NAS AQUISIÇÕES DE BOBINAS E CHAPAS DE AÇO, RECEBIDAS DA USINA PRODUTORA OU DE ESTABELECIMENTO COMERCIAL NÃO EQUIPARADO A INDUSTRIAL. O BENEFÍCIO NÃO SE ESTENDE ÀS IMPORTAÇÕES. HIPÓTESE EM QUE NÃO SE APLICA O DISPOSTO NO ART. 98 DO CTN OU A SÚMULA N° 575 DO STF.

CONSULTA Nº: 11/2000

PROCESSO Nº: GR05 18279/97-0

01 - DA CONSULTA

Cuida-se de consulta sobre crédito presumido do ICMS, nos termos da Alteração n° 1.471, introduzida no RICMS-SC pelo Decreto n° 1.535 de 30/12/96. O crédito presumido refere-se a aquisições, por estabelecimento industrial, de bobinas, chapas finas a quente e a frio, chapas grossas, chapas zincadas, tiras de bobinas a quente e a frio, zincadas, bobinas e tiras de aço inoxidável a quente e a frio, desde que recebidas diretamente da usina produtora ou de estabelecimento industrial. A consulente quer saber se aplica-se o mesmo benefício no caso de importação.

A autoridade fiscal, em suas informações de estilo, fls. 7, admite que a redação do art. 15 do Anexo IV, na redação dada pela Alteração n° 1.471, "deixa dúvidas sobre a extensão ou não do benefício às importações dos produtos arrolados". Mesmo assim, contudo, entende ser descabida a extensão do benefício às importações, justificando seu entendimento nos termos seguintes:

Entretanto, aprofundando-se sobre os objetivos da concessão deste benefício fiscal, verifica-se que este está baseado na eliminação das diferenças competitivas entre as empresas que operam com aço plano nas diversas regiões do país, de forma a eliminar as dificuldades de custos de transporte para as regiões mais distantes das unidades produtoras, concentradas nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.

Como o objetivo do benefício fiscal é dar condições de igualdade às empresas que utilizam ou comercializam aços planos, evitando que estas se concentrem nas regiões produtoras de aço, não teria cabimento estender este benefício às importações desta matéria prima, prejudicando a indústria nacional de aços planos.

O benefício foi justamente instituído para evitar o prejuízo de empresas consumidoras de aço plano e acabaria por prejudicar os fabricantes, uma vez que o limite do crédito presumido se-ria muito grande se fosse determinado pelo valor do serviço de transporte internacional.

É impossível crer que a intenção seria beneficiar os consumidores de aço plano e prejudicar as usinas produtoras nacionais.

Isto posto, embora o texto legal tenha sido omisso na especificação clara da situação geográfica do remetente das matérias-primas arroladas naquele dispositivo legal, não é difícil entender que este foi feito para evitar problemas sócio-econômicos internos brasileiros, razão pela qual torna-se descabido para casos de importação destas matérias-primas".

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

RICMS-SC/89, Anexo IV, art. 15;

RICMS-SC/97, Anexo 2, art. 18.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

O dispositivo regulamentar que prevê o benefício referido é do seguinte teor:

Art. 18. Até 31 de dezembro de 2002, fica concedido crédito presumido ao estabelecimento industrial que adquirir matéria prima, classificada na posição abaixo indicada da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias, Sistema Harmonizado - NBM/SH, desde que recebida diretamente da usina produtora ou de estabelecimento comercial que não se enquadre na hipótese prevista no § 1°, em montante igual ao que resultar da aplicação dos seguintes percentuais sobre o valor da operação de entrada (Lei n° 10.297/96, art. 43):

....................................................

§ 1° O benefício também se aplica ao estabelecimento equiparado a industrial, nos termos da legislação do IPI, que tenha recebido os produtos diretamente da usina produtora ou de outro estabelecimento da mesma empresa ou de empresa interdependente, situados em outra unidade da Federação.

§ 2° O crédito presumido fica limitado ao valor do correspondente serviço de transporte das mercadorias:

I - da usina produtora até o estabelecimento industrial ou equiparado a industrial;

II - da usina produtora até o estabelecimento comercial e deste até o estabelecimento industrial ou equiparado a industrial, devendo, neste caso, constar, no corpo da nota fiscal emitido pelo estabelecimento comercial, o valor do serviço de transporte da usina até o seu estabelecimento.

A questão levantada pela consulente envolve a discussão da recepção do art. 98 do Código Tributário Nacional pela novel Constituição brasileira promulgada em 1988.

Art. 98. Os tratados e convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha.

Assim, no caso de entender-se recepcionado o dispositivo transcrito, os tratados internacionais de que o Brasil seja signatário, desde que contenham cláusula prevendo reciprocidade de tratamento tributário, obrigam dar ao produto importado (de país signatário do tratado) o mesmo tratamento dado ao similar nacional. Nesse sentido, a Súmula n° 575 do Supremo Tribunal Federal:

À mercadoria importada de país signatário do GATT, ou membro da ALALC, estende-se a isenção do imposto sobre circulação de mercadorias concedida a similar nacional.

A Constituição de 1988, todavia, veda expressamente a chamada isenção heterônoma (art. 151, III), ressalvada a hipótese de exportação de bens e serviços para o exterior do país (arts. 155, § 2°, XII, e, e 156, § 3°, II), razão porque alguns entendem que o art. 98 do CTN não teria sido recepcionado pelo novo texto constitucional. Nessa linha de raciocínio argumenta o Procurador do Estado do Rio de Janeiro, Francesco Conte (O Tratado Internacional e a Isenção de Tributos Estaduais e Municipais: Breves Reflexões, RDDT n° 35: 33):

(...) a União, no atual regime constitucional, não pode mais conceder isenções de tributos estaduais e municipais. Somente pode isentar, em linha de princípio, a pessoa jurídica de direito público interno competente para tributar.

Em outras palavras, o sistema jurídico brasileiro não confere qualquer precedência hierárquico-normativa aos atos internacionais sobre o ordenamento constitucional, de sorte que é irrecusável a supremacia normativa da Constituição da República sobre todos os tratados internacionais celebrados pelo Estado brasileiro.

A corrente majoritária da doutrina, entretanto, entende que apesar da vedação contida no art. 151, III, o art. 98 do CTN foi recepcionado pela nova Constituição da República. Isto porque no plano internacional somente o Estado-nação, o Brasil, é dotado de soberania e pode negociar tratados. Os Estados federados têm apenas autonomia o que não os habilita como pessoas jurídicas de direito internacional. Os Estados e os Municípios não são reconhecidos como competentes para celebrar tratados com outras nações. Apenas o Estado-nação soberano pode fazê-lo. O art. 151, III, aplica-se exclusivamente ao plano interno. Esse entendimento foi sufragado por esta Comissão, como na Consulta n° 45/98, assim ementada:

IMPORTAÇÃO DE PEIXE E FILÉ DE PEIXE CONGELADOS DE PAÍSES MEMBROS DO MERCOSUL E ALALC. IDÊNTICO TRATAMENTO DADO ÀS OPERAÇÕES INTERNAS.  PREVALÊNCIA DOS TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS SOBRE A LEGISLAÇÃO INTERNA, NOS TERMOS DO ART. 98, DO CÓDIGO TRIBU-TÁRIO NACIONAL.

Entretanto, não é esse o caso presente. Não estamos diante de uma isenção, de uma redução na base de cálculo do imposto ou uma diferença na alíquota aplicável. O art. 18 do Anexo 2 do RICMS-SC trata de crédito presumido. Ora, por crédito entende-se, pela própria dicção constitucional (art. 155, § 2°, I), imposto que incidiu sobre a mesma mercadoria em fase anterior do ciclo de comercialização. Sucede que a incerteza quanto ao valor desse crédito leva ao seu arbitramento ou, na nomenclatura regulamentar, um crédito presumido. Por estarmos diante de mercadoria importada, não há que se falar em incidência anterior do imposto, ainda que presumida.

O crédito presumido têm como base o custo do transporte das mercadorias, possibilitando que as empresas consumidoras dessa matéria-prima possam obtê-la em igualdade de preços, independente de sua situação geográfica. Como nota com acuidade a informação fiscal, cuida-se de "dar condições de igualdade às empresas que utilizam ou comercializam aços planos, evitando que estas se concentrem em regiões produtoras de aços".

Em caso similar a Consultoria Tributária do Estado de São Paulo manifestou-se nos seguintes termos (Consulta n° 388/93):

Ora, a pedra angular do tratamento tributário convencionado pelos países integrantes do GATT e ALADE é a aplicação a um produto oriundo de um país, de tratamento não menos favorável ao dispensado ao seu similar nacional, em termos de sujeição aos tributos internos, como é o caso do ICMS.

Mas, não é de admitir-se que o tratamento tributário venha a favorecer o produto importado em detrimento do nacional, como é o caso presente. É ainda a autoridade informante que comenta:

O benefício foi justamente instituído para evitar o prejuízo de empresas consumidoras de aço plano e acabaria por prejudicar os fabricantes, uma vez que o limite do crédito presumido seria muito grande se fosse determinado pelo valor do serviço de transporte internacional.

Isto posto, responda-se à consulente que o crédito presumido nas aquisições de bobinas, chapas finas a quente e a frio, chapas grossas, chapas zincadas, tiras de bobinas a quente e a frio, zincadas, bobinas e tiras de aço inoxidável a quente e a frio recebidas diretamente da usina produtora ou de estabelecimento comercial não equiparado a industrial, prevista no art. 18 do Anexo 2 do RICMS-SC/97, não se estende à importação dos mesmos materiais do exterior do País.

À superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 24 de março de 2000.

Velocino Pacheco Filho

FTE - matr. 184244-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na Sessão do dia  31 de março de 2000.

Laudenir Fernando Petroncini                                                    João Paulo Mosena

Secretário Executivo                                                                Presidente da Copat