ESTADO DE SANTA CATARINA

SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA

DIRETORIA DE ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA - DIAT

GERÊNCIA DE TRIBUTAÇÃO - GETRI

 

 

 

 

NOTA TÉCNICA Nº 14/2017

 

Remessa para industrialização entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica.

 

1.  Introdução:

Ainda que possa parecer estranha a existência da figura de uma industrialização encomendada entre estabelecimentos de um mesmo titular, pois, compondo uma única pessoa, não poderia contratar consigo mesma, a questão deve ser analisada a partir das peculiaridades da legislação do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação - ICMS.

 

2. A autonomia dos estabelecimentos:

A Constituição Federal, através do inciso XII do §2º do art. 155, determinou que cabe à lei complementar definir, em relação ao ICMS, seus contribuintes, disciplinar o regime de compensação do imposto, fixar, para efeitos de cobrança  e definição do estabelecimento responsável, o local das operações relativas à circulação de mercadorias e das prestações de serviços.

Dando concretude ao comando constitucional, foi editada a Lei Complementar de nº 87, de 13 de setembro de 1996, que através do inciso II do §3º do art. 11 determinou a autonomia dos estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular:

Art. 11. O local da operação ou da prestação, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, é:

 § 3º Para efeito desta Lei Complementar, estabelecimento é o local, privado ou público, edificado ou não, próprio ou de terceiro, onde pessoas físicas ou jurídicas exerçam suas atividades em caráter temporário ou permanente, bem como onde se encontrem armazenadas mercadorias, observado, ainda, o seguinte:

...

II - é autônomo cada estabelecimento do mesmo titular;

 

Hugo de Brito Machado assim se manifestou acerca da autonomia dos estabelecimentos:

Na verdade, estabelecimento é objeto e não sujeito de direitos; entretanto, por ficção legal, admite-se que o estabelecimento seja considerado contribuinte. O que se quer realmente é tomar em consideração cada estabelecimento, e não a empresa, para os fins de verificação da ocorrência do fato gerador do imposto. Como esclarece Viana Neto, ‘a autonomia  de um estabelecimento para outro permite que créditos sejam transferidos concomitantemente  com as mercadorias de um estabelecimento para outro, dando cumprimento ao princípio da não cumulatividade’. (Machado, Hugo de Brito. O estabelecimento como contribuinte autônomo e a não-cumulatividade do ICMS. in Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, v. 82, p. 24-27. jul. 2002.)

 

Souto Maior Borges, para quem não se verifica a incidência do imposto na hipótese, admite a possibilidade de, por ficção legal, atribuir-se capacidade tributária passiva a cada estabelecimento do contribuinte do imposto. Nas palavras do autor:

A tributação dos estabelecimentos autônomos de um só contribuinte constitui aspecto particular do problema tormentoso, no âmbito doutrinário, da capacidade tributária dos entes desprovidos de personalidade jurídica. São os estabelecimentos autônomos de uma empresa organismos a que a lei tributária confere o caráter de sujeitos passivos, sem que tenham personalidade jurídica de direito privado, já que pessoa jurídica é a empresa, considerada como unidade econômica. Não são os estabelecimentos autônomos pessoas jurídicas. Todavia, a lei lhes confere aptidão para ser sujeitos passivos do imposto, o que importa em lhes reconhecer uma certa capacidade jurídica de direito tributário.

Por isso, só a figura da ficção de direito tributário explica a equiparação, por lei ordinária do Estado-membro, desses organismos, a contribuintes do ICM (fictio est falsitas pro veritate accepta).

 

 

3. Remessa para industrialização entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular:

Decorrência direta da autonomia dos estabelecimentos é a ocorrência do fato gerador do imposto mesmo nas saídas para estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular, o que, em outras palavras, significa atribuir sujeição passiva ao estabelecimento que a promover, conforme inciso I do art. 12 da mesma LC 87/96:

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

 

Ao explicitar a ocorrência do fato gerador do imposto, o inciso I do art. 12 é particularmente didático ao i. utilizar a expressão genérica: saídas, englobando, por conseguinte, suas diversas espécies, tais como transferências e remessas para industrialização, e; ii. ao afirmar que tais saídas constituem fatos geradores ainda que ocorram para outro estabelecimento do mesmo titular, demonstrando a separação inicialmente elucidada entre estabelecimento e pessoa jurídica.

Nesse compasso, o inciso I do artigo 27 do Anexo 2 institui a suspensão do imposto na saída de qualquer mercadoria, para conserto, reparo ou industrialização, desde que retorne ao estabelecimento de origem no prazo de 180 dias.

Vê-se, portanto, que a legislação tributária previu textualmente a possibilidade de remessas para industrialização entre estabelecimentos e como estes, por sua vez, podem coexistir no âmbito da mesma pessoa jurídica, há decorrência lógico-estrutural do que se busca afirmar: a possibilidade de remessa para industrialização entre estabelecimentos pertencentes à mesma pessoa jurídica.

A contrario sensu, se a remessa para industrialização somente pudesse ocorrer entre pessoas jurídicas distintas, a legislação retro citada não utilizaria a expressão “retorno ao estabelecimento de origem”, mas sim “retorno à empresa/pessoa jurídica de origem”. A legislação tributária utiliza corretamente os termos técnicos “estabelecimento” e “empresa”, como se pode colher, por exemplo, na instituição do diferimento do imposto nas transferências internas entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular, prevista no inciso III do art. 8º do Anexo 3:

Art. 8° Nas seguintes operações, o imposto fica diferido para a etapa seguinte de circulação:

...

III - saída de mercadorias de estabelecimento de contribuinte para outro estabelecimento da mesma empresa;

 

Interessante notar que a legislação federal que cuida do imposto sobre produtos industrializados – IPI também prevê a possibilidade de remessa para industrialização entre estabelecimentos da mesma titularidade, conforme prescreve o artigo 43, X do RIPI/2010:

Art. 43. Poderão sair com suspensão do imposto:

(...)

X - os produtos remetidos, para industrialização ou comércio, de um estabelecimento industrial ou equiparado a industrial para outro da mesma firma;

 

Ademais, os Estados e o Distrito Federal, reunidos no Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, através do Convênio s/nº, de 15 de dezembro de 1970, criaram o Sistema Nacional Integrado de Informações Econômico-Fiscais – SINIEF. O Ajuste SINIEF de nº 05/05, alterando as notas explicativas do Anexo do Convênio s/nº acima mencionado, determinou em sua cláusula primeira:

Cláusula primeira

Os Códigos Fiscais de Operações e Prestações – CFOP e as Notas Explicativas constantes do Anexo do Convênio s/nº, de 15 de dezembro de 1970, que instituiu o Sistema Integrado de Informações Econômico-Fiscais – SINIEF, passam a vigorar com a seguinte redação:

1.150 – TRANSFERÊNCIAS PARA INDUSTRIALIZAÇÃO, PRODUÇÃO RURAL, COMERCIALIZAÇÃO OU PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS

1.151 – Transferência para industrialização ou produção rural

Classificam-se neste código as entradas de mercadorias recebidas em transferência de outro estabelecimento da mesma empresa, para serem utilizadas em processo de industrialização ou produção rural.

 

A cláusula segunda deste mesmo Ajuste previu a obrigatoriedade da utilização das alterações promovidas pela cláusula primeira:

Cláusula segunda

Este ajuste entra em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial da União e a sua aplicação será obrigatória em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de janeiro de 2006, ficando facultado ao contribuinte a sua adoção para fatos geradores ocorridos a partir de 1º de novembro de 2005.

 

Já a Seção II do Anexo 10 do Regulamento do ICMS/SC internalizou as disposições da cláusula primeira do Ajuste SINIEF nº 05/05 na legislação tributária catarinense. De modo que, diante da autonomia dos estabelecimentos dada pela Lei Complementar nº 87/96 e a internalização do Ajuste SINIEF nº 05/05 não parece restar dúvida acerca da possibilidade de remessa para industrialização entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular.

A base de cálculo do imposto a ser utilizada nas remessas e nos retornos de industrializações por encomenda entre estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular em operações interestaduais é aquela definida no inciso II do §4º do art. 13 da LC 87/96:

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

§ 4º Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo do imposto é:

I - o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;

II - o custo da mercadoria produzida, assim entendida a soma do custo da matéria-prima, material secundário, mão-de-obra e acondicionamento;

III - tratando-se de mercadorias não industrializadas, o seu preço corrente no mercado atacadista do estabelecimento remetente.

 

4. Conclusão:

A legislação tributária permite operações de remessa de mercadoria, para conserto, reparo ou industrialização, entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica.

 

 

 

 

 

Getri, em Florianópolis, 06 de fevereiro de 2017.

 

 

 

 

        Paulo Vinicius Sampaio                                  Vandeli Rohsig Dannebrock

         AFRE – mat. 950719-1                                          Gerente de Tributação