CONSULTA 20/2019

EMENTA: ICMS. PERIODICO. PUBLICAÇÃO ELETRÔNICA. CONFORME NOVO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, ESTÁ AO ABRIGO DA IMUNIDADE PREVISTA NO ART. 150, VI, “D” DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, HIPÓTESE QUE AFASTA A INCIDÊNCIA DE IMPOSTOS, DA COMPETÊNCIA DE QUALQUER DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO.

 

Pe/SEF em 17.04.19

Da Consulta

Noticia a consulente que é optante pelo regime do Simples Nacional e que desenvolve atividade empresarial de produção, edição e comercialização de periódico digital online hospedado em sítio eletrônico próprio. Informa que a sua receita majoritariamente decorre de assinatura pelos seus clientes. O conteúdo disponibilizado no site consiste em: fotos e vídeos de modelos, colunas jornalísticas com assuntos variados e um blog, com assuntos também variados. O site é disponibilizado em frequência predefinida, no formato de edição.

Posto isso, formula as seguintes questões:

1. Trata-se de prestação de serviços ou fornecimento de mercadorias, mediante contrato de compra e venda? Em outras palavras: incide ISS ou ICMS sobre a receita da comercialização do periódico eletrônico?

2. Caso corresponda a negócio jurídico de compra e venda, a revista eletrônica disponibilizada em seu sítio eletrônico corresponde a periódico, de forma que estaria afastada a incidência de ICMS, sob o manto da imunidade prevista na alínea “d” do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal?

Argumenta que foi inserido o subitem 1.09 a lista da LC 116/2003 que define como serviço tributável pelo ISS a “Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei no 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS)”. A alteração foi seguida pela legislação do Município de Florianópolis.

No tocante à imunidade de livros, jornais e periódicos, prevista na alínea “d” do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, invoca a decisão do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 330.817 RJ, rel. Min. Dias Toffoli, que estendeu a imunidade aos livros eletrônicos, inclusive aos suportes utilizados exclusivamente para sua leitura.

Legislação

Constituição Federal, arts. 150, VI, “d”, 155, II, e 156, III;

Lei Complementar 87/1996, art. 2º, IV e V;

Lei Complementar 116/2003, art. 1º, § 2º; Lista de Serviços anexa à LC 116/2003, item 1.09.

Fundamentação

O Supremo Tribunal Federal (STF), na ADI 1.945 MT, já em 2010, decidiu que é irrelevante a existência ou inexistência de bem corpóreo ou mercadoria em sentido estrito.

O Tribunal não pode se furtar a abarcar situações novas, consequências concretas do mundo real, com base em premissas jurídicas que não são mais totalmente corretas. O apego a tais diretrizes jurídicas acaba por enfraquecer o texto constitucional, pois não permite que a abertura dos dispositivos da Constituição possa se adaptar aos novos tempos, antes imprevisíveis.

Assim, a incidência do ICMS não está restrita a mercadorias com existência corpórea, mas pode incidir sobre bens digitais, adquiridos por transferência eletrônica de dados. Nesse sentido, o inciso VIII acrescido ao art. 2º da Lei 10.297/1996 estabelece a incidência do ICMS sobre a circulação de mercadorias digitais.

O ICMS incide sobre operações relativas à circulação de mercadorias, entendidas como bens móveis adquiridos (ou produzidos) para fins de mercancia. O que define a mercadoria é a finalidade para a qual foi adquirido. Um mesmo bem, pode em determinado momento ser mercadoria e não o ser no momento seguinte. É o que ocorre quando a mercadoria é adquirida para consumo final, hipótese em que o bem perde sua condição de mercadoria. Contudo, uma operação considera-se como de circulação de mercadoria quando há transferência da titularidade do bem o que, na maioria dos casos envolve a transferência da propriedade. Ora, a propriedade compreende os direitos de gozar, fruir, dispor e reaver o bem de quem injustamente o detenha.

Paulo de Barros Carvalho (Regra Matriz do ICM) define “circulação” como a passagem das mercadorias de uma pessoa para outra, sob o manto de um título jurídico, envolvendo mudança de patrimônio. Por outro lado, Geraldo Ataliba e Cleber Giardino (Núcleo da definição constitucional do ICM) entendem que circular significa para o direito, mudar de titular, acrescentando que a titularidade de uma mercadoria se refere à circunstância de alguém deter poderes jurídicos de disposição sobre a mesma.

Carvalho de Mendonça, por sua vez, oferece um conceito de circulação em que a mercadoria, em seu percurso dos produtores até os consumidores, sofre uma série continuada de transferência de propriedade ou posse das mercadorias (Tratado de Direito Comercial Brasileiro). Nesse mesmo sentido, decidiu o Supremo Tribunal Federal que “o simples deslocamento de coisas de um estabelecimento para outro, sem transferência de propriedade, não gera direito à cobrança de ICM” (AgR no AI 131.941, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 19.4.1991, p. 4583).

Quanto à abrangência da imunidade para livros, jornais e periódicos, o Supremo Tribunal Federal, revendo sua própria jurisprudência, decidiu no julgamento do Recurso Extraordinário 330.817 RJ, rel. Min. Dias Toffoli, pelo Tribunal Pleno (DJe 195, pub. 31-8-2017) ampliou o sentido da imunidade para incluir o livro eletrônico ou digital (e-book) e suportes de uso exclusivo (e-reader).

O acordão enfatiza a teleologia da imunidade que aponta para a proteção de valores, princípios e ideias de elevada importância, tais como a liberdade de expressão, voltada à democratização e à difusão da cultura. Acrescenta o acórdão que “ao se invocar a interpretação finalística, se o livro não constituir veículo de ideias, de transmissão de pensamentos, ainda que formalmente possa ser considerado como tal, será descabida a aplicação da imunidade”.

O art. 150, VI, d, da Constituição não se refere apenas ao método gutenberguiano de produção de livros, jornais e periódicos. O vocábulo “papel” não é, do mesmo modo, essencial ao conceito desses bens finais. O suporte das publicações é apenas o continente (corpus mechanicum) que abrange o conteúdo (corpus misticum) das obras. O corpo mecânico não é o essencial ou o condicionante para o gozo da imunidade, pois a variedade de tipos de suporte (tangível ou intangível) que um livro pode ter aponta para a direção de que ele só pode ser considerado como elemento acidental no conceito de livro. A imunidade de que trata o art. 150, VI, d, da Constituição, portanto, alcança o livro digital (e-book).

Resposta

Diante do exposto, responda-se à consulente que, independentemente de tratar-se de bem digital, a sua caracterização como periódico (publicada em períodos certos), conforme novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, está ao abrigo da imunidade prevista no art. 150, VI, “d” da Constituição da República, hipótese que afasta a incidência de impostos.

À superior consideração da Comissão.

VELOCINO PACHECO FILHO

AFRE IV - Matrícula: 1842447 

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 03/04/2019.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome                                                                                Cargo

ROGERIO DE MELLO MACEDO DA SILVA                         Presidente COPAT

CAMILA CEREZER SEGATTO                                            Secretário(a) Executivo(a)