EMENTA: ICMS. SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO. O SERVIÇO DE CONEXÃO À INTERNET CONSTITUI PRESTAÇÃO ONEROSA DE SERVIÇO DE COMUNICAÇÃO, CONFIGURANDO HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ICMS.

CONSULTA Nº: 34/99

PROCESSO Nº: GR02 8.435/97-9

01. CONSULTA

A empresa acima identificada, operando neste Estado no ramo de prestação de serviços de conexão à Internet, formula consulta à COPAT indagando:

a) se “os serviços de comunicação local, prestados pela consulente na conexão entre os seus clientes e a TELESC, exclusivamente para os que estiverem localizados no mesmo município” constitui hipótese de incidência do ICMS; e

b) se os demais serviços prestados pela consulente, citados em lista anexa à consulta, a fls. 6, incluem-se na hipótese de incidência do imposto.

Verifica-se que a dúvida da consulente quanto à incidência do imposto nas operações que realiza decorrem de seu entendimento no sentido de que tais operações estariam equiparadas a uma ligação telefônica local, adstrita ao território de um único município, cabendo à companhia telefônica realizar a conexão à rede de computadores. E assim equiparado a uma ligação telefônica intramunicipal, o serviço prestado pela consulente não estaria incluído no âmbito de incidência do ICMS, uma vez que constam do item 98 da lista de serviços sujeitos ao ISS, anexa à Lei Complementar no 56/87.

02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal, art. 155, inciso II;

Lei Complementar no 87/96, arts. 2°, inciso III, e 13, inciso III;

Lei no 10.297/96, arts. 2o, inciso III, e 10, inciso, III

03. FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

Em primeiro lugar, importa destacar que a referência feita pela consulente ao item 98 da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar no 56/87, pretendendo ver com isso afastada a incidência do ICMS no serviço de conexão à Internet, é totalmente descabida. De fato, referido item coloca dentre os serviços tributados pelo ISS as comunicações telefônicas realizadas entre aparelhos localizados em um mesmo município. É preciso atentar, contudo, que tais serviços deixaram de ser tributados pelo ISS após o advento da Constituição Federal de 1988. Até então os serviços de comunicação, à exceção da comunicação telefônica intramunicipal, estavam sujeitos ao Imposto sobre Serviços de Transportes e Comunicações, de competência da União, previsto no art. 21, VII da Constituição Federal de 1967, com a redação dada pela Emenda no 1, de 1969, que estabelecia:

Art. 21. Compete à União instituir imposto sobre:

(...)

VII - serviços de transporte e comunicações, salvo os de natureza estritamente municipal.

Assim, as comunicações intramunicipais estavam excluídas do campo de incidência do imposto sobre comunicações, tendo sido, contudo, incluídas dentre as espécies de serviços passíveis de tributação pelos Municípios por meio do ISS.

Contudo, com o advento da Constituição Federal de 1988, tem-se a extinção do antigo imposto cobrado pela União, passando os serviços de transporte e de comunicação a integrar o campo de incidência do ICMS, agora sem qualquer restrição em relação aos serviços de comunicação.

Uma vez que o ICMS passou a incidir sobre todo e qualquer serviço de comunicação, inclusive os intramunicipais, e considerando que o ISS somente pode alcançar os serviços não abrangidos pela competência tributária dos Estados e do Distrito Federal (CF, art. 156, III), deixou de viger o disposto na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar no 56/87, no que se refere aos serviços de comunicação.

Também não tem qualquer relação com a matéria objeto da consulta, qual seja a incidência do ICMS sobre as operações realizadas pela consulente, os serviços prestados  pela TELESC. O fato de a atividade desenvolvida pela TELESC ser ou não tributada, ou de estar ou não sendo pago o tributo devido, em nada interfere na configuração da hipótese de incidência do imposto na prestação de serviço pela consulente.

À consulente não compete discutir o tratamento tributário dos serviços prestados pela TELESC, sendo-lhe dado apenas questionar acerca da legislação tributária aplicável às suas atividades.

Deve-se observar que tratam-se de relações jurídicas distintas: de um lado aquela relativa à prestação de serviço realizada pela TELESC (que neste caso presta serviços tanto à consulente quanto ao cliente desta), e de outro o serviço prestado pela consulente ao seu cliente. São negócios distintos, prestações distintas, sujeitos distintos. A TELESC presta um serviço específico para os seus clientes e é natural que cobre para isso, assim como a consulente cobra de seus clientes pelo serviço a estes prestado.

Mesmo que a conexão entre a consulente e seus clientes fosse realizada sem a intervenção da TELESC (tem-se notícia de que já é possível essa conexão até mesmo por ondas de rádio), ainda restaria o serviço prestado pela consulente.

Segundo informa a consulente, sua atividade consiste na prestação de serviços de comunicação local para acesso à Internet e serviços de informática. Declara a fls. 2 que tais serviços de informática, relacionados a fls. 6, destinam-se a melhorar o atendimento de seus clientes no acesso à Internet.

De fato, a consulente realiza verdadeira prestação onerosa de serviço de comunicação, sujeita, portanto, ao ICMS.

A realização de qualquer espécie de comunicação, seja a mensagem emitida, transmitida, retransmitida, repetida, recebida etc. e independentemente de qual seja seu conteúdo, será alcançada pelo ICMS quando realizada, mediante remuneração, como cumprimento de uma obrigação nesse sentido assumida para com terceiros. Não é outra a lição de Roque Antônio Carrazza:

“Note-se que o ICMS não incide sobre a comunicação propriamente dita, mas sobre a “relação comunicativa”, isto é, a atividade de, em caráter negocial, alguém fornecer, a terceiro, condições materiais para que a comunicação ocorra.

Isso é feito mediante a instalação de microfones, caixas de som, telefones, radiotransmissores etc. Tudo, enfim, que faz parte da infra-estrutura mecânica, eletrônica e técnica necessárias à comunicação.

O serviço de comunicação tributável por meio do ICMS se perfaz com a só colocação à disposição do usuário dos meios e modos aptos à transmissão e recepção de mensagens. Embora o sistema seja arcaico, um serviço de pombos-correio posto à disposição de uma pessoa (física ou jurídica), para a transmissão ou recepção de mensagens, pode perfeitamente ser tributado por meio do ICMS.

São irrelevantes, para fins de ICMS, tanto a transmissão em si mesmo considerada (“relação comunicativa”), como o conteúdo da mensagem transmitida.” (grifos nossos) (ICMS, São Paulo, Malheiros, 4. Ed, p. 115 e 116)

No caso em tela, é o serviço prestado pela consulente que possibilita a realização da comunicação, com a veiculação de dados diversos, mensagens eletrônicas, fac-símiles etc., e não o serviço realizado pela companhia telefônica, que poderia mesmo ser substituído por outros meios de conexão, como cabos de fibra ótica ou ondas de rádio.

É extreme de dúvidas que se realiza, na hipótese, de fato uma comunicação. Através de seu computador, o usuário dos serviços da consulente envia e acessa informações contidas em computadores localizados nas mais diversas partes do globo, recebe e transmite mensagens, imagens, fac-símiles etc., consulta bancos de dados, comunica-se em tempo real com outras pessoas através dos denominados chats, enfim, as possibilidades de troca de informações através da Internet são incontáveis.

Por outro lado, também não se pode negar que essa comunicação somente ocorre em função dos serviços prestados pela consulente, que através de seus equipamentos, e programas específicos realiza, em favor do cliente e mediante remuneração, o roteamento, o armazenamento e encaminhamento de informações, implementa e gerencia protocolos e rotinas destinadas a administrar as conexões à rede, fornece os meios para a transmissão de correio eletrônico, acesso a computadores remotos, transferência de arquivos, acesso a banco de dados, acesso a diretórios etc.

Trata-se, pois, positivamente de uma prestação onerosa de serviço de comunicação, hipótese descrita como fato gerador do ICMS no art. 2o, III, da Lei no 10.297/96, verbis:

Art. 2o O imposto tem como fato gerador:

(...)

III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza.

 Quanto aos demais serviços referidos, vê-se que fazem parte do conjunto das atividades realizadas pela consulente tendo em vista um único fim, qual seja a concretização da conexão dos seus clientes à Internet. Não há aí uma série de prestações autônomas, distintas e desvinculadas umas das outras. Veja-se, nesse sentido, que a Norma 004/95, do Ministério das Comunicações, que disciplina o uso de meios da rede pública de telecomunicações para acesso à Internet estabelece constituir-se o serviço de conexão à Internet:

a) dos equipamentos necessários aos processos de roteamento, armazenamento e encaminhamento de informações, e dos "software" e "hardware" necessários para o provedor implementar os protocolos da Internet e gerenciar e administrar o serviço;

b) das rotinas para administração de conexões à Internet (senhas, endereços e domínios Internet);

c) dos "softwares" dispostos pelo PSCI: aplicativos tais como - correio eletrônico, acesso a computadores remotos, transferência de arquivos, acesso a banco de dados, acesso a diretórios, e outros correlatos -, mecanismos de controle e segurança, e outros;

d) dos arquivos de dados, cadastros e outras informações dispostas pelo PSCI;

e) do "hardware" necessário para o provedor ofertar, manter, gerenciar e administrar os "softwares" e os arquivos especificados nas letras "b","c" e "d" deste subitem;

f) outros "hardwares" e "softwares" específicos, utilizados pelo PSCI.

Assim, o serviço de conexão à Internet abrange em si todas as demais atividades descritas a fls. 6 pela consulente. Estas são obrigações de fazer subjacentes à obrigação principal assumida pela consulente, e que desta não se desvinculam. São as denominadas atividades-meio, referidas por Aires F. Barreto, que a respeito afirma:

“Os leigos tendem a confundir o exercício de atividades-meio com prestação de serviço. Calcados na nomenclatura dos serviços (...) misturam, embaralham, confundem, equiparam, tarefas-meio com serviços. Na sua simplicidade ingênua, não distinguem a consistência do esforço humano prestado a outrem, sob regime de direito privado, com conteúdo econômico, das ações intermediárias que tornam possível o “fazer para terceiros”.

(...)

A concreta indicação de uma ação (datilografia, programação, organização, manutenção, operação, administração) é, muitas vezes, configuradora de atos, fatos ou obras meramente constitutivos de etapas necessárias para alcançar um fim. É inafastável - ainda que disso muitos não se dêem conta - que o atingir um fim qualquer exija, empírica ou cientificamente, atividades de planejamento, organização, administração, controle, não obstante essas ações nada tenham a ver com o fim perseguido que, por hipótese, poderia ser o de transportar pessoas.

Outras vezes, essas mesmas ações humanas não mais se caracterizam como atividades condicionantes da concretização de um fim, mas demarcam, ao revés, o próprio objeto colimado. Nesses casos, a razão última dessas ações é a sua própria produção como utilidade, para terceiros.

(...)

Para essas atividades-meio não há cobrança de preço; mas, nem mesmo quando, em certos casos, para elas é destacado preço, essas “ações-meio” se transformam em “ações-fim”. O serviço médico não assume outra natureza pelo simples fato de os resultados de diagnósticos serem fornecidos verbalmente, datilografados ou por listagem de computador, mesmo que para os últimos houvesse uma cobrança adicional e específica de tantos reais.

(...)

Não se pode decompor um serviço (...) nas várias ações-meio que o integram para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço autônomo”. (ISS - atividade-meio e serviço-fim, Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 5, fev. 1996, p. 81-85)

 Portanto, o armazenamento temporário em suas máquinas das mensagens eletrônicas destinadas a seu cliente, por exemplo, não constitui uma outra prestação de serviço, desvinculada do serviço-fim, contratado pelo cliente. Trata-se de uma atividade-meio necessária à realização da atividade-fim. Ninguém contrata alguém para o armazenamento de e-mails, sem que esta atividade esteja inserida no conjunto de atividades relativas ao acesso à Internet. Não se tem, no caso, duas hipóteses de incidência tributária, mas apenas uma, relativa à prestação do serviço de comunicação.

A propósito, lembramos ainda a lição de Marçal Justen Filho:

“A norma tributária, como regra, não se ocupa de determinar como deve ser executada a prestação nem como deve efetuar-se a contratação - o que lhe importa é que se configure a execução de uma obrigação, consubstanciando-se prestação de utilidade qualificável como serviço. Caberá a outras normas regularem a forma do contrato e os requisitos para qualificação jurídica da atividade como execução de obrigação.

Isso não quer significar, por óbvio, que a norma tributária esteja compelida a aceitar a qualificação jurídica efetuada por normas não-tributárias.” (O Imposto Sobre Serviços na Constituição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1985, p. 88-89)

Vê-se, assim, que ainda que se celebrem diversos contratos, visando desmembrar a operação realizada em diversas outras, com denominações e naturezas jurídicas distintas, não se produzirá o pretendido efeito de se ter cada uma dessas etapas realizadas pela consulente tributadas como se fossem uma operação distinta e desvinculada do fim visado pelo destinatário ao contratar o serviço.

Diante do exposto, responda-se à consulente:

a) que os serviços de comunicação realizados pela consulente, possibilitando a conexão de seus clientes à Internet, enquadra-se na hipótese legal de incidência do ICMS;

b) que os demais serviços mencionados constituem atividades necessárias à realização do objeto da obrigação assumida para com seu cliente, não podendo, para efeitos tributários, dela apartar-se.

É o parecer. À consideração da Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 19 de agosto de 1999.

Laudenir Fernando Petroncini

FTE -  Matr. 301.275-1

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 8 de setembro de 1999.

Laudenir Fernando Petroncini          João Paulo Mosena

Secretário Executivo                     Presidente da COPAT