EMENTA: ICMS/ISS. SERRAGEM DE MADEIRA POR ENCOMENDA, COM FORNECIMENTO DAS TORAS PELO  ENCOMENDANTE. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO ESTADUAL APENAS NA HIPÓTESE DA MADEIRA SE DESTINAR À INDUSTRIALIZAÇÃO OU COMERCIALIZAÇÃO PELO ENCOMENDANTE. CASO SE DESTINE A USO OU CONSUMO DO PRÓPRIO ENCOMENDANTE, INCIDE O ISS, DE COMPETÊNCIA MUNICIPAL.

CONSULTA Nº: 22/99

PROCESSO Nº: GR06 23821/97-3

01 - DA CONSULTA

A consulente em epígrafe é empresa estabelecida neste Estado, dedicada ao ramo de serraria. Noticia que “presta serviços de serração de toro para terceiros sendo estes proprietários dos toros”. Assim expostos os fatos, formula a seguinte consulta:

a) qual o imposto que incide sobre a referida operação: o ICMS, de competência estadual, ou o ISS, de competência municipal, caso em que se enquadraria no item 72 da Lista de Serviços anexa ao Decreto-lei n° 406/68, na redação dada pela Lei Complementar n° 56/87?

72 – Recondicionamento, acondicionamento, pintura, beneficiamento, lavagem, secagem, tingimento, galvanoplastia, anodização, corte, recorte, polimento, plastificação e congêneres, de objetos não destinados à industrialização ou comercialização.

b) caso a operação não seja tributada pelo ICMS, como poderá pedir a devolução do imposto recolhido indevidamente?

A consulente traz à colação documentos fiscais relativos à remessa de toras de pinus pelo encomendante  para o estabelecimento da consulente, bem como as relativa à devolução, ao encomendante, dos produtos resultantes do seu desdobramento (tábuas, pranchas e vigotes).

A informação fiscal, a fls. 21, confirma tratar-se de corte de pinus, por encomenda de empresa estabelecida neste Estado, contribuinte do ICMS, destinando-se ao ativo imobilizado do encomendante.

Subindo a consulta à apreciação da Comissão, esta decidiu, em 10 de março de 1998, por proposição da Secretária Executiva, baixar a mesma em diligência para que fossem juntadas mais provas sobre as operações objeto da consulta e que fosse verificado, contabilmente e in loco, “se as mercadorias foram destinadas à integração ao ativo permanente (imobilizado)” e “a que uso ou consumo se prestam as mercadorias em questão”.

Cumprida a diligência, a consulta retornou, em 22 de janeiro de 1999,  para apreciação por esta Comissão. Conforme informação fiscal a fls. 23 e documento a fls. 53, a encomendante dá à madeira retornada (serrada em tábuas, vigotes etc.) a seguinte destinação: uso em andaimes, calços para bobina (para evitar o deslocamento das bobinas durante o transporte) e em reparos de alojamentos, cercas etc.

A diligência confirmou, destarte, a natureza das operações descritas na consulta, corroborada pelos documentos fiscais então acostados e confirmada pela manifestação das autoridades fiscais na época do recebimento da consulta.

De qualquer forma, a consulta somente produz efeitos em relação aos fatos nela relatados. Se, em posterior verificação fiscal, for constatado outro uso para a madeira beneficiada, como comercialização ou industrialização, a consulta torna-se inaplicável e exigível o imposto correspondente.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal, art. 155, II;

Código Tributário Nacional, arts. 114, 121, 165 e 166;

Lei Complementar n° 87/96;

Decreto-lei n° 406/68, art. 8°;

Lei n° 10.297/96, arts. 2° e 8°;

Lei n° 3.938/66, arts. 73 e 74.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

A Constituição Federal, ao distribuir as competências tributárias, atribuiu aos Estados a tributação das operações relativas à circulação de mercadorias (ICMS) e, aos Municípios, a das prestações de serviços de qualquer natureza (ISS). Para o deslinde da questão consultada é irrelevante a competência atribuída aos Estados para tributar os serviços de transporte (exceto os intra-municipais) e de comunicação.

A distinção entre a tributação de mercadorias e a dos serviços nem sempre é clara. Na verdade existe uma área de penumbra que tem ensejado sobejas divergências, sobretudo quando a prestação de serviços é acompanhada de fornecimento de mercadorias ou quando a venda de mercadorias envolve uma prestação de serviços. A delimitação dos campos de incidência do ICMS e do ISS demanda o exame da definição dos respectivos fatos geradores, o que faremos resumidamente a seguir.

O imposto municipal tem por hipótese de incidência a prestação de serviços, ou seja, contratos que tem por objeto uma obrigação de fazer (fornecimento de bem imaterial) que pode ou não ser acompanhado de fornecimento de mercadorias. Já no caso do imposto estadual, o núcleo do aspecto material da hipótese de incidência reside na “circulação” de mercadorias, por tal entendido qualquer movimento, seja físico ou não, direcionado ao consumidor final. Esclarece Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS, 1997, p. 25) que se trata de operação relativa à circulação. “Uma operação que impulsione a mercadoria, na marcha normalmente por esta desenvolvida desde a fonte de produção até o consumidor”. Prossegue o mesmo autor:

Operações relativas à circulação de mercadorias são quaisquer atos ou negócios, independentemente da natureza jurídica específica de cada um deles, que implicam na circulação de mercadorias, vale dizer, o impulso destas desde a produção até o consumo, dentro da atividade econômica, as leva da fonte produtora até o consumidor.

A circulação, no caso, refere-se a mercadorias, entendendo-se por tal os bens destinados ao comércio (revenda). Infere-se, pois, que não é qualquer movimentação de bens, de conteúdo econômico, que constitui operação de circulação de mercadorias e, portanto, sujeita à incidência do ICMS. Assim, uma operação de venda entre pessoas físicas, não comerciantes, não se caracteriza como hipótese de incidência do ICMS por falta do elemento subjetivo do negócio (bem adquirido com intenção de revenda).

No caso em pauta, a consulente recebe toras de madeira de terceiro para serragem e posterior devolução. Trata-se de uma obrigação de fazer (serragem das toras). Não se deve, entretanto, concluir apressadamente que estamos diante de uma operação tributável pelo ISS. Deve-se cogitar da finalidade do serviço prestado. Se o encomendante da serragem pretende utilizar a madeira serrada em suas instalações (ampliação, reforma das mesmas ou outros usos semelhantes), temos uma prestação de serviço, pura e simples. Porém, se o encomendante pretende utilizar a madeira serrada para revendê-la ou utilizá-la como insumo ou matéria-prima na fabricação de produtos que serão posteriormente comercializados, estamos diante de uma etapa do processo industrial, realizada fora do estabelecimento. A operação, nesta última hipótese, corresponde ao conceito de circulação de mercadorias. A serragem de madeira não se destina, no caso, à satisfação direta de uma necessidade do encomendante, mas constitui etapa da movimentação da mercadoria em direção ao consumidor final.

A operação praticada pela consulente, como descrita na consulta, caracteriza claramente uma prestação de serviços. O encomendante do serviço fornece as toras e utiliza o produto resultante do seu desdobramento em seus estabelecimentos (andaimes, calços para bobinas, reparos de galpões, cercas e outras benfeitorias etc.).

Diversa seria a situação se a consulente não recebesse as toras do encomendante, mas estas tivessem outra origem. Embora destinando-se ao consumo ou integração ao ativo fixo do destinatário (consumidor final das mercadorias), estaríamos diante de uma operação tributável pelo ICMS. Em resumo, o tratamento tributário seria o seguinte, de acordo com as diferentes hipóteses:

QUADRO RESUMO

ORIGEM DA MADEIRA

DESTINO DO PRODUTO

TRIBUTO

Fornecida pelo encomendante

Revenda ou industrialização

ICMS

Fornecida pelo encomendante

Uso ou consumo do encomendante

ISS

Fornecida pela consulente

Revenda ou industrialização

ICMS

Fornecida pela consulente

Uso ou consumo do destinatário

ICMS

Quanto aos valores recolhidos indevidamente ao Estado (caso da operação não estar sujeita à tributação pelo ICMS), segunda questão levantada pela consulente, a legislação tributária assegura a restituição do indébito, mediante requerimento, respeitados os direitos de quem tenha efetivamente suportado o ônus do tributo, nos termos dos arts. 73 e 74 da Lei n° 3.938/66. A requerente deverá provar, em cada operação, que o recolhimento do ICMS foi indevido e que não repassou o respectivo ônus ou que está autorizada por quem efetivamente o suportou.

Isto posto, responda-se à consulente:

a) se o produto resultante da serragem da madeira for destinado ao uso do próprio encomendante, a hipótese é de incidência do ISS, não cabendo cobrança de ICMS;

b) se, pelo contrário, a madeira serrada for destinada à comercialização ou industrialização, o tributo que incide é o ICMS;

c) qualquer importância recolhida ao erário estadual, indevidamente ou em valor maior que o devido, pode ensejar pedido de repetição do indébito, na forma e nos termos previstos na legislação tributária catarinense.

À superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 9 de abril de 1999.

Velocino Pacheco Filho

FTE - matr. 184244-7

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela Copat na sessão do dia   3 de maio de 1999.

 João Paulo Mosena       Laudenir Fernando Petroncini

Presidente da Copat       Secretário Executivo