ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 44/2020

N° Processo 1970000037495


Ementa

ICMS. CISÃO PARCIAL. POSSIBILIDADE DE APROVEITAMENTO DO SALDO CREDOR DE ICMS PELA EMPRESA QUE ABSORVEU PARTE DA EMPRESA CINDIDA CORRESPONDENTE À AQUISIÇÃO DAS MERCADORIAS DA SUCEDIDA QUE LHE COUBEREM NO PROCESSO DE CISÃO. NÃO ESTÃO AUTORIZADAS TRANSFERÊNCIAS DE CRÉDITO ACUMULADO DE ICMS, AS QUAIS DEVERÃO SEGUIR OS PROCEDIMENTOS PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA ESTADUAL. OPERACIONALIZAÇÃO QUE DEVE SEGUIR ORIENTAÇÃO DA RESPECTIVA GERÊNCIA REGIONAL.


Da Consulta

Trata-se a presente de consulta formulada por indústria de alimentos, por meio da qual questiona se, em um processo de cisão empresarial parcial, com o surgimento de cindida com notório interesse econômico:

(1) É possível distribuir à cindida parte dos créditos tributários acumulados, na empresa original, de ICMS e de outros tributos estaduais?

(2) Qual a proporção de distribuição dos créditos mencionados na questão anterior pode ser feita à cindida?

(3) É possível utilizar créditos tributários de ICMS da empresa original, da qual houve a cisão, para constituir capital na empresa cindida na forma do art. 997, III do Código Civil Brasileiro?

(4) Se os créditos cedidos à conta de integralização de capital podem ser aproveitados na empresa cindida para compensação de tributos próprios seus?

(5) Se a integralização pode ser diferida no tempo ou precisa ser realizada em um único movimento, quando da cisão?

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

É o relatório, passo à análise.


Legislação

Constituição Federal, art. 155, § 2°, II, "b"; Código Tributário Nacional, art. 132; Lei 10.297/96, art. 31; art. 229, da Lei nº 6.404/76; RICMS/SC, art. 40 e seguintes.


Fundamentação

Em primeiro lugar é preciso esclarecer que a consulta não se presta como instrumento de assessoria jurídico-empresarial e tributária em favor do consulente, conquanto destinada a dúvidas acerca da vigência, da interpretação e da aplicação da legislação tributária. Portanto, a presente não pode ser recebida como consulta no tocante aos itens 3, 4 e 5.

 

Para responder aos demais questionamentos propostos pela consulente devemos examinar a natureza dos créditos do ICMS. O crédito fiscal decorre do princípio da não-cumulatividade, nos termos do artigo 155, § 2°, I, da Constituição Federal. Referido dispositivo constitucional assegura ao sujeito passivo o direito de compensar o imposto devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores.

 

Portanto, o ordenamento jurídico-tributário brasileiro considera o crédito como um direito estritamente vinculado à compensação do imposto devido: o direito ao crédito somente existe se houver débito a compensar. Se não houver incidência do imposto na saída do estabelecimento, não haverá direito a crédito. Neste sentido, determina o art. 155, § 2°, II, "b", da Constituição Federal, a anulação do crédito correspondente à saída isenta ou não tributada.

 

O crédito que não se destinar à compensação do imposto devido na etapa subsequente, somente será mantido na escrita fiscal se houver "disposição da legislação em contrário". Neste caso, teremos um crédito que não corresponde a um débito, e tal crédito será crédito acumulado.

 

A Lei Complementar 87/96, em seu art. 24, inc. III trata do saldo credor de ICMS, determinando que "se o montante dos créditos superar os dos débitos, a diferença será transportada para o período seguinte". No art. 25, § 1º a LC 87 trata de crédito acumulado, garantindo sua manutenção e transferência somente se decorrente de operações e prestações de exportação.

 

A Lei Complementar autoriza, entretanto, a Lei estadual a prever outras hipóteses de saldos credores acumulados, para que "(i) sejam imputados pelo sujeito passivo a qualquer estabelecimento seu no Estado; (ii) sejam transferidos, nas condições que definir, a outros contribuintes do mesmo Estado".

 

A legislação tributária estadual prevê a possibilidade de transferência de créditos acumulados de ICMS no artigo 31 da Lei 10.297/96. Ademais, referida lei autorizou ao regulamento prever outras hipóteses de transferência de saldos credores (Art. 31, § 1º: Poderão ainda ser transferidos outros saldos credores acumulados, observando o disposto neste artigo e nas hipóteses prevista em regulamento.).

 

Há, portanto, uma clara distinção entre saldo credor de ICMS e saldo credor acumulado. Nos termos do art. 40 do RICMS/SC: "Consideram-se acumulados os saldos credores decorrentes de manutenção expressamente autorizada de créditos fiscais relativos a operações ou prestações subsequentes isentas ou não tributadas".

Ressalte-se, entretanto, que a disposição que autoriza a manutenção de crédito não implica necessariamente o direito a transferi-lo a terceiro. Para tanto, é necessária previsão legal específica.

 

Assim, é preciso analisar se é caso de saldo credor de ICMS ou créditos acumulados.

 

O saldo credor em conta gráfica somente poderá ser transferido ao estabelecimento sucessor, que assumirá a condição de estabelecimento filial da empresa cindida parcialmente, se houver a continuidade das atividades da empresa sucedida, com a transmissão dos estoques de mercadorias. Dessa forma, fica assegurado à sucessora o crédito fiscal correspondente à aquisição das mercadorias da sucedida que lhe couberem no processo de cisão, em homenagem ao princípio da não-cumulatividade.

 

O diploma de regência da sociedade limitada (Código Civil) é totalmente omisso em relação à figura da cisão, atraindo, destarte, a aplicação do artigo 1.053 do Código Civil, que manda aplicar as normas da sociedade simples à sociedade limitada “nas omissões deste Capítulo”, admitindo-se, contudo, a regência supletiva da sociedade pelas normas da sociedade anônima.

 

O art. 229, da Lei nº 6.404/76, por sua vez, prescreve:

 

[...]

Art. 229. A cisão é a operação pela qual a companhia transfere parcelas do seu patrimônio para uma ou mais sociedades, constituídas para esse fim ou já existentes, extinguindo-se a companhia cindida, se houver versão de todo o seu patrimônio, ou dividindo-se o seu capital, se parcial a versão.

 

§ 1º Sem prejuízo do disposto no artigo 233, a sociedade que absorver parcela do patrimônio da companhia cindida sucede a esta nos direitos e obrigações relacionados no ato da cisão; no caso de cisão com extinção, as sociedades que absorverem parcelas do patrimônio da companhia cindida sucederão a esta, na proporção dos patrimônios líquidos transferidos, nos direitos e obrigações não relacionados.

[...]

 

Neste caso o estabelecimento cindindo passa a suceder o estabelecimento cindido quanto aos direitos e obrigações relacionados no ato da cisão. Portanto, somente se o estabelecimento cindendo assumir a continuidade das atividades da empresa cindida a ele será conferido o direito ao saldo credor de ICMS, apurado na escrita fiscal pelo estabelecimento cindido que, repita-se, deve ser correspondente à aquisição das mercadorias da sucedida que lhe couberem no processo de cisão.

 

A propósito determina o art. 132 do Código Tributário Nacional que "a pessoa jurídica de direito privado que resultar de fusão, transformação ou incorporação de outra ou em outra é responsável pelos tributos devidos até à data do ato pelas pessoas jurídicas de direito privado fusionadas, transformadas ou incorporadas”.

 

A matéria já foi objeto de consulta a esta Comissão, que se pronunciou nas respostas de Consulta nº 41/97 e 29/2009, no sentido da sucessão da incorporadora em todos os direitos e obrigações da empresa incorporada:

 

COPAT 41/97: EMENTA: ICMS - INCORPORAÇÃO SOCIETÁRIA - SUCESSÃO, DA INCORPORADORA, EM TODOS OS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DA EMPRESA EXTINTA, INCLUSIVE DO SALDO CREDOR EM CONTA GRÁFICA - CULTURA DE ÁRVORES FLORESTAIS PELA EMPRESA INCORPORADA. (...)

 

COPAT 29/2009: ICMS. ARMAZÉM GERAL. MERCADORIA DEPOSITADA POR EMPRESA QUE FOI INCORPORADA POR OUTRA. A INCORPORADORA SUCEDE EM TODOS OS BENS, DIREITOS E OBRIGAÇÕES DA INCORPORADA, PASSANDO A R EVESTIR-SE DA CONDIÇÃO DE DEPOSITANTE DA MERCADORIA".

 

Ressalte-se, contudo, que não estão autorizadas transferências de crédito acumulado de ICMS, as quais deverão seguir os procedimentos previstos na legislação tributária estadual (Art. 40, 40-A, 40-B e 40-C do RICMS/SC).

 

Se o estabelecimento a ser transferido possuir créditos de ICMS em sua escrita fiscal, o sucessor terá direito a tais créditos na escrita fiscal desse mesmo estabelecimento, após a transferência, pois passam a pertencer a ele, visto que se tornará o novo titular do estabelecimento.

 

No entanto, considerando que o estabelecimento sucessor terá um novo número de inscrição estadual, para que tais créditos possam ser devidamente transferidos, conforme já esposado na resposta à Consulta nº 94/2019, a Consulente deverá obter orientação junto à respectiva Gerência Regional quanto aos procedimentos a serem seguidos, relativamente à transferência dos créditos existentes na escrita fiscal do estabelecimento “transferido” e encerrado para a escrita fiscal do novo titular (conforme previsto no §2º do artigo 6º do RICMS/SC, “É autônomo cada estabelecimento do mesmo titular”).

 

Saliente-se que a esta Consultoria Tributária compete a interpretação da legislação tributária deste Estado, cabendo à área executiva da administração tributária a análise de cada caso concreto e respectiva orientação quanto aos procedimentos a serem adotados quando inexiste previsão legal. Portanto, no que diz respeito à operacionalização da cisão parcial de empresa, com transferência de estabelecimento (operacionalização da transferência de créditos tributários de ICMS ou continuidade de negócios já iniciados), a Consulente deve seguir a orientação da Gerência Regional de vinculação do estabelecimento “transferido”.


Resposta

Diante do que foi exposto, proponho seja respondido ao consulente que:

(1)    O saldo credor em conta gráfica somente poderá ser transferido ao estabelecimento sucessor, que assumirá a condição de estabelecimento filial da empresa cindida parcialmente, se houver a continuidade das atividades da empresa sucedida, com a transmissão dos estoques de mercadorias.

(2)     Fica assegurado à sucessora o crédito fiscal correspondente à aquisição das mercadorias da sucedida que lhe couberem no processo de cisão.

(3)    Não estão autorizadas transferências de crédito acumulado de ICMS, as quais deverão seguir os procedimentos previstos na legislação tributária estadual.

(4)    A operacionalização deve seguir a orientação da respectiva Gerência Regional.

 

É o parecer que submeto à apreciação da Comissão.



DANIEL BASTOS GASPAROTTO
AFRE III - Matrícula: 9507256

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 23/04/2020.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
ROGERIO DE MELLO MACEDO DA SILVA Presidente COPAT
DANIELLE KRISTINA DOS ANJOS NEVES Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 18/05/2020 13:13:49