ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 80/2022

N° Processo 2270000019058


Ementa

ICMS. DEBÊNTURES. COMPENSAÇÃO. ainda que o STF tenha declarado a inconstitucionalidade do art. 13, da Lei nº 17.302/2017, de modo a restaurar a vigência do art. 8º, da Lei nº 9.940/1995, permanece hígido o entendimento esposado por essa Comissão, no sentido de que as debêntures emitidas pela INVESC não constituem forma válida de liquidação do crédito tributário, seja na modalidade de compensação, prevista pelo art. 156, II, do CTN, seja na modalidade de dação em pagamento, prevista no inciso XI do mesmo artigo.


Da Consulta

Senhor Presidente,

 

Trata-se de consulta formulada por pessoa jurídica, cujo objeto social está voltado às atividades de armazém geral, agenciamento de carga e operação de transporte multimodal, entre outros. Tendo em vista a decisão do STF na ADI nº 5882, apresenta os seguintes questionamentos:

 

a) Estando a consulente na posse e titularidade das debêntures emitidas por Santa Catarina Participação e Investimentos S.A. (INVESC) é viável a apropriação em “conta gráfica”, do Preço Unitário atualizado dos referidos títulos de crédito ao amparo da Lei nº 9.940/95 e acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 5882, publicado em 02.06.2022, cuja eficácia erga omnes não possui efeito suspensivo e, portanto, vincula imediatamente a administração pública do Estado de Santa Catarina, a teor do expresso comando do art. 102, §2º, da CF, e art. 28, §único, da Lei Federal 9.868/99, para o fim específico de compensação dos débitos correntes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços originados a partir das operações efetivadas pelo Contribuintes consulentes?

b) Além da apropriação em “conta gráfica”, há forma alternativa de compensação do Preço Unitário atualizado dos referidos títulos de crédito emitidos ao amparo da Lei nº 9.940/95 com débitos correntes do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços originados a partir das operações efetivadas pelos Contribuintes consulentes?

 

O processo foi analisado no âmbito da Gerência Regional conforme determinado pelas Normas Gerais de Direito Tributário de Santa Catarina, aprovadas pelo Dec. nº 22.586/1984. A autoridade fiscal verificou as condições de admissibilidade.

 

É o relatório, passo à análise.


Legislação

Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966, arts. 156, II, e 170;  Lei 3.938, de 26 de dezembro de 1966, arts. 59 e 81; Lei 9.940, de 19 de outubro de 1995, arts. 2° e 8°.


Fundamentação

O questionamento apresentado pela consulente já foi objeto das Consultas nº 140/2011 e 51/2012, por esta Comissão.

 

A criação da Invesc foi autorizada pela Lei Estadual nº 9.940, de 1995, que, em seu art. 8º, II, permitiu que a Assembleia Geral da empresa atribuísse aos títulos por ela emitidos poder liberatório para quitação de dívidas tributárias.

 

Contudo, as hipóteses de extinção do crédito tributário estão taxativamente previstas no art. 156 do Código Tributário Nacional (CTN), dentre as quais não está o abatimento das debêntures emitidas por empresa pública vinculada ao ente tributante.

 

Tal abatimento não poder ser considerado dação em pagamento, nos termos do inciso XI do caput do art. 156 do CTN, pois, em matéria tributária, a modalidade abrange apenas bens imóveis, o que não é o caso das debêntures.

 

Também não pode ser considerado compensação, nos termos inciso II do caput do art. 156 do CTN, conforme fundamentos explicitados na Consulta nº 140/2011, reproduzidos abaixo, por sua pertinência e didática:

 

“A compensação rege-se pelo disposto no art. 170 do CTN, nos seguintes termos: “A lei pode, nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação, em cada caso atribuir à autoridade administrativa, autorizar a compensação de créditos tributários com créditos líquidos e certos, vencidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública”. Duas, portanto, são as condições para que o instituto possa ser utilizado: (i) autorização legal expressa e (ii) que os créditos do sujeito passivo contra a Fazenda Pública sejam líquidos e certos”

(...)

A Lei 9.940/1995 criou a INVESC (extinta pela Lei 13.335/2005) com o objetivo de gerar “recursos para alocação em investimentos públicos no território catarinense captados pela emissão de obrigações” (art. 2°). O art. 8°, II, dessa Lei, autorizou que a Assembleia Geral atribuísse “aos títulos de sua emissão as características de permutabilidade e de poder liberatório para quitação de dívidas tributárias”.

(...)

Portanto, as debêntures emitidas pela INVESC e adquiridas pela consulente, por serem representativas de empréstimo, ou seja, constituem-se em crédito exigível pela consulente. Resta saber se podem ser compensadas com créditos tributários. Inicialmente, devemos observar que a dívida é da INVESC, entidade privada que não se confunde com o Estado. Nos termos do art. 170 do CTN, a compensação de créditos tributários somente pode ser autorizada com “créditos líquidos e certos, vendidos ou vincendos, do sujeito passivo contra a Fazenda Pública”. Assim, para falarmos em compensação com créditos tributários, é necessário que o Estado tenha assumido expressamente a dívida, colocando-se no polo passivo da relação obrigacional.

Além disso, mesmo o Estado assumindo a dívida, é necessária a existência de lei que autorize a compensação, “nas condições e sob as garantias que estipular, ou cuja estipulação em cada caso atribuir à autoridade administrativa” (ibidem).

Ora, o art. 8°, II, da Lei 9.940/1995, não fez nem uma coisa nem outra: ela deu poder discricionário à Assembleia Geral da companhia para atribuir a esses títulos “poder liberatório para quitação de dívidas tributárias”. Mas, se a competência para autorizar a compensação é da lei, ela não pode ser delegada à Assembleia Geral que, à evidência, não constitui corpo legislativo. Do mesmo modo, a estipulação de condições e garantias somente pode ser atribuída a “autoridade administrativa” (i.e. pela administração direta), conceito este que também não se aplica à Assembleia Geral da companhia.

Infere-se daí que, para se proceder à compensação de créditos tributários é necessária a edição de lei (em sentido formal) autorizando a compensação e, se tal for previsto na mesma lei, ato formal da autoridade administrativa. Na sua falta, torna-se inviável a compensação de créditos tributários com debêntures emitidas pela INVESC, ainda que dotados de poder liberatório pela Assembleia Geral. O princípio da legalidade estrita, que informa o direito tributário, não admite a delegação de atribuições privativas da lei à resolução de órgãos colegiados, mormente do setor privado.

Por conseguinte, o referido art. 8°, II, padece de ineficácia técnica sintática, já que depende de lei específica que autorize a compensação.

Então, se as debêntures da INVESC não constituem meio válido de liquidar o crédito tributário, seja na modalidade de compensação, seja como dação em pagamento, não se prestam para a extinção de dívidas tributárias.

(...)”

 

A referida discussão deu ensejo a diversos processuais judiciais. No julgamento da ação anulatória de débito fiscal nº 0016670-21.2011.8.24.0023, a Quarta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de Santa Catarina reconheceu à autora da ação o direito de quitação de tributos mediante a compensação com debêntures da Invesc.

 

Contudo, em sede de Recurso Especial interposto pelo Estado de Santa Catarina, o Superior Tribunal de Justiça determinou o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça, para que fosse analisada arguição de inconstitucionalidade do art. 8º da Lei Estadual nº 9.940, de 1995, e sua incompatibilidade com o art. 156 do CTN.

 

Posteriormente ao julgamento no STJ, foi aprovada a Lei nº 17.302, de 30 de outubro de 2017, que, em seu art. 13, revogou o art. 8º da Lei nº 9.940, de 1995, e, em seu art. 6º disciplinou novamente a compensação de débitos tributários por meio das debêntures Invesc.

 

O art. 6º foi vetado pelo Chefe do Poder Executivo, em razão da sua inconstitucionalidade, conforme os fundamentos acima expostos, e da contrariedade ao interesse público, mas o veto foi rejeitado pela Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (Alesc) e o referido dispositivo foi promulgado e publicado em 21/12/2017.

 

Diante da derrubada do veto, em 22/01/2018, o Governador do Estado ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.882, requerendo ao Supremo Tribunal Federal medida cautelar, suspendendo-se imediatamente os efeitos do referido dispositivo, com eficácia retroativa à data da publicação da derrubada do veto.

 

A liminar pleiteada foi deferida pelo Ministro Gilmar Mendes em 14/02/2018 (DJE de 19/02/2018) e, posteriormente, a Ação Direta de Inconstitucionalidade foi julgada procedente, confirmando a liminar para declarar a inconstitucionalidade do art. 6º da Lei nº 17.302, de 2017 (DJE de 02/06/2022).

 

Portanto, ainda que o STF tenha declarado a inconstitucionalidade do art. 13, da Lei nº 17.302/2017, de modo a restaurar a vigência do art. 8º, da Lei nº 9.940/1995, permanece hígido o entendimento esposado por essa Comissão, no sentido de que as debêntures emitidas pela INVESC não constituem forma válida de liquidação do crédito tributário, seja na modalidade de compensação, prevista pelo art. 156, II, do CTN, seja na modalidade de dação em pagamento, prevista no inciso XI do mesmo artigo.


Resposta

Diante do que foi exposto, proponho seja respondido que, ainda que o STF tenha declarado a inconstitucionalidade do art. 13, da Lei nº 17.302/2017, de modo a restaurar a vigência do art. 8º, da Lei nº 9.940/1995, permanece hígido o entendimento esposado por essa Comissão, no sentido de que as debêntures emitidas pela INVESC não constituem forma válida de liquidação do crédito tributário, seja na modalidade de compensação, prevista pelo art. 156, II, do CTN, seja na modalidade de dação em pagamento, prevista no inciso XI do mesmo artigo.

 

À superior consideração da Comissão.



DANIEL BASTOS GASPAROTTO
AFRE IV - Matrícula: 9507256

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 06/10/2022.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
LENAI MICHELS Presidente COPAT
BERNARDO FRECHIANI LARA MACIEL Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 11/10/2022 19:09:52