ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
REPUBLICAÇÃO - RESPOSTA CONSULTA 83/2012

N° Processo 2200000122064

Motivo da Republicação

A fim de adequar a Consulta COPAT nº 083/2012 ao teor da Resolução Normativa nº 81/2020 e da Nota Técnica nº 01/2020, nos termos da Informação GETRI anexa.


Ementa

(REPUBLICAÇÃO) ITCMD. USUFRUTO. RESTAURAÇÃO DA PLENA PROPRIEDADE PELO NU-PROPRIETÁRIO, POR MORTE DO USUFRUTUÁRIO. A INSTITUIÇÃO E A EXTINÇÃO DO DIREITO REAL DE USUFRUTO SÃO FATOS GERADORES AUTÔNOMOS DO ITCMD, CONFORME ARTIGO 2º, II, DA LEI Nº 13.136/04. A INTEGRALIDADE DO PAGAMENTO DO IMPOSTO DEVIDO PELA INSTITUIÇÃO DO USUFRUTO DURANTE A VIGÊNCIA DA LEI 3.933/66, NÃO AFASTA A INCIDÊNCIA DO IMPOSTO QUANDO DA SUA EXTINÇÃO, NA VIGÊNCIA DA LEI NOVA - 13.136/04.


Da Consulta

A consulente, no momento da aquisição de um imóvel, instituiu usufruto vitalício em favor de seus genitores; ambos falecidos. Informa que, na oportunidade, ocorreu o recolhimento integral do ITCMD.

 

Mas se o ITCMD já foi pago na instituição do usufruto, integral e antecipadamente, conforme determinava a legislação da época, constando, inclusive, uma ressalva referente ao pagamento na escritura pública de compra venda, é legal a cobrança do imposto para a extinção desse direito real? É o questionamento que me é submetido à crítica.

 

O fisco local atestou o cumprimento dos quesitos para admissibilidade do pedido.

 

É o relato.


Legislação

Art. 155, §1º, I, da Constituição Federal. Art. 144, do CTN. Lei nº 3.933/66, art. 4º, VI. Lei nº 7.540/88, art. 8º, I. Lei nº 13.136/04, art. 7º, §2º. Resolução Normativa nº 81/2020.


Fundamentação

 A propriedade plena confere ao seu titular a faculdade de usar, gozar, dispor e reaver a coisa (art. 1.228, do Código Civil). Contudo, os poderes inerentes à propriedade podem ser desdobrados, daí a existência do rol de direitos reais no art. 1.225, do Código Civil.

 

O usufruto se caracteriza como um desmembramento dos poderes inerentes à propriedade, cindindo-se na figura do usufrutuário os poderes de uso e o gozo, e na pessoa do nu proprietário os poderes de dispor e reaver. O usufruto é o direito real que confere ao seu titular o direito de posse, uso, administração e percepção dos frutos (art. 1.394, CC/02) de um ou mais bens, móveis ou imóveis, em um patrimônio inteiro, ou parte deste, podendo ser temporário ou vitalício, jamais perpétuo.

 

O usufruto é direito real autônomo em relação à propriedade, podendo ser livremente transmitido, daí que suas transmissões, com base no artigo 155, §1º, I, da Constituição Federal, estão dentro do campo de competência tributária atribuída aos Estados quando diz que a estes compete o imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos relativamente a bens imóveis e respectivos direitos.

 

Nesse sentido, o fato gerador do imposto sobre transmissão do direito real de usufruto alcança (i) o momento de sua instituição ou reserva, quando os poderes de dispor e reaver são alienados a terceiro e os poderes de usar e gozar são mantidos na pessoa do ex-proprietário ou alienados a terceiros, bem como (ii) o momento de sua extinção, quando os poderes de uso e gozo são consolidados na pessoa do nu proprietário, podendo ou não ser coincidente com a pessoa que o instituiu.

 

Desse modo, tem-se bem claro que a competência tributária atribuída pelas diversas Constituições alcança todas as transmissões de direitos reais de usufruto, seja sua instituição ou reserva, seja sua extinção.

 

Assim, observado no mundo fenomênico dos fatos a hipótese abstratamente prevista em lei, ocorre o fato gerador do tributo. Vale dizer, observada a instituição ou reserva de usufruto, ocorre o fato gerador do imposto, assim como também ocorre seu fato gerador quando observada sua respectiva extinção.

 

O artigo 144 do Código Tributário Nacional determina a aplicação da lei vigente na data da ocorrência do fato gerador. Se o fato gerador “instituição” e o fato gerador “extinção” ocorreram sob a égide da mesma lei, esta, evidentemente é a lei aplicável. Se o fato gerador “extinção” ocorreu sob a égide de diploma legal diverso daquele que vigia quando da instituição, aplica-se o novo diploma legal, haja vista que o fato gerador “extinção” ocorreu sob a égide da nova lei.

 

A extinção do direito real de usufruto sempre foi tratada pela legislação tributária como fato gerador autônomo de incidência do imposto de transmissão em relação à sua instituição ou reserva, variando, tão somente, o tratamento dado pelas diversas legislações quanto (i) a redução ou não da dimensão da base de cálculo tributada (v.g. a Lei nº 13.136/04, art. 7º, §2º reduz em 50% o imposto devido quando da extinção do usufruto), ou (ii) a isenção do imposto na hipótese de a propriedade plena se consolidar na figura do próprio instituidor do usufruto (isenção prevista tanto na Lei nº 3.933/66, art. 4º, VI, como na Lei nº 7.540/88, art. 8º, I).

 

Não há, portanto, conflito intertemporal de normas, há, somente, aplicação da lei tributária vigente na data da ocorrência do respectivo fato gerador. Dado que tanto a instituição, reserva e extinção de usufruto são fatos geradores autônomos do imposto sobre transmissões, incide a lei vigente à época da ocorrência dos respectivos fatos geradores.

 

Se, por exemplo, houve instituição de usufruto vitalício na data de 01.01.1968, ocorreu, neste momento, o fato gerador do imposto sobre a instituição, que incide sobre 100% da base de cálculo, conforme artigo 7º, inciso V, da Lei nº 3.933/66. Se houvesse a consolidação da propriedade em função da sucessão do usufrutuário em 01.01.2020, ocorreu, neste momento, novo fato gerador do imposto, agora sobre a extinção de usufruto, que incide sobre 50% da base de cálculo, conforme artigo 7º, §2º, da Lei nº 13.136/04.

 

Não seria pertinente e nem jurídica a alegação de que, no exemplo acima, a soma da base de cálculo da incidência tributária perfaz percentual superior a 100%, haja vista que:

 

(i) todas as leis que trataram da matéria definiram tanto a instituição como a extinção do usufruto como fatos geradores, distintos e autônomos, do imposto, haja vista que em uma ou outra hipótese há transmissão de direito real;

 

(ii) cada fato gerador tem necessariamente sua dimensão determinada por uma base de cálculo, sendo que a mesma base de cálculo pode servir de dimensão para incidências repetitivas, sem que isso contrarie qualquer princípio constitucional, desde que respeitado o desenho constitucional do tributo. Tomemos como exemplo o ICMS, que incide sobre 100% da base de cálculo nas sucessivas vendas da mesma mercadoria, com evidente cumulatividade, corrigida, neste caso, pelo sistema de créditos e débitos, ou o PIS e a COFINS que, além de incidirem ambos sobre a mesma base de cálculo, oneram repetidamente a receita obtida pela venda da mesma mercadoria até o consumidor final;

 

(iii) se a extinção do usufruto tivesse ocorrido sob a égide da mesma lei vigente à data da instituição (Lei nº 3.933/66), a soma dos percentuais das bases de cálculo alcançaria 200%, eis que a norma então vigente determinava a incidência do imposto tanto na instituição como na extinção de usufruto sem redução na base de cálculo, demonstrando que a soma dos percentuais da base de cálculo em patamar superior a 100% independe de a instituição e extinção ocorreram sob a égide de leis diferentes;

 

(iv) a instituição de usufruto com transmissão de nua propriedade e posterior extinção de usufruto ocorridas todas sob a égide da Lei nº 13.136/04, redundam numa soma de percentual de base de cálculo de 150%, demonstrando, novamente, que a soma de percentual não guarda ressonância com aplicação intertemporal de norma;

 

(v) a aplicação da lei vigente à data da ocorrência do fato gerador “extinção” (Lei nº 13.136/04) mostra-se mais benéfica ao contribuinte; eis que, se estivéssemos diante de aplicação intertemporal de norma, deveríamos aplicar a lei vigente à data da instituição do usufruto (Lei nº 3.933/66), que determinava a incidência do imposto no momento da extinção do usufruto sobre 100% da base de cálculo;

 

(vi) o CTN, norma geral em matéria de direito tributário, determina a aplicação da lei vigente à data da ocorrência do fato gerador, assim, se a Lei nº 13.136/05 prevê como fato gerador do imposto de transmissão a extinção do direito real de usufruto, temos que, ocorrido no mundo fenomênico dos fatos a hipótese abstratamente prevista em lei, incide, imediata e inafastavelmente, a norma de incidência tributária, não podendo o intérprete afastar sua aplicação em hipótese alguma, nem mesmo sob argumento de equidade, conforme artigo 108, §2º do mesmo Código; e, finalmente

 

(vii) entender que a situação sujeitar-se-ia à aplicação intertemporal de norma, acabaria por impedir a tributação do fato gerador “extinção de direito real de usufruto”, ou, em outras palavras, negaria eficácia ao artigo 7º, §2º da Lei nº 13.136/05, maculando a indisponibilidade do crédito tributário.


Resposta

Diante do exposto, responda-se à consulente que a instituição e a extinção do direito real de usufruto são fatos geradores autônomos do ITCMD, conforme artigo 2º, II, da Lei nº 13.136/04. A integralidade do pagamento do imposto devido pela instituição do usufruto durante a vigência da Lei nº 3.933/66, não afasta a incidência do imposto quando da sua extinção, na vigência da lei nova - 13.136/04.



DANIEL BASTOS GASPAROTTO
AFRE IV - Matrícula: 9507256

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 06/10/2022.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
LENAI MICHELS Presidente COPAT
BERNARDO FRECHIANI LARA MACIEL Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 11/10/2022 19:09:50