EMENTA: ICMS. SERVIÇO DE
RADIOCHAMADA. O FORNECIMENTO DO APARELHO E O ATENDIMENTO TELEFÔNICO DAS
CHAMADAS PELOS FUNCIONÁRIOS DA PRESTADORA CONSTITUEM ETAPAS DA PRESTAÇÃO DO
SERVIÇO DE RÁDIOCHAMADA. HIPÓTESE EM QUE HÁ UMA ÚNICA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO
TRIBUTADA, E NÃO PRESTAÇÕES DE SERVIÇO AUTÔNOMAS E DISTINTAS, TRIBUTADAS
SEPARADAMENTE.
CONSULTA Nº: 32/99
PROCESSO Nº: GR01
4.239/97-0
01. CONSULTA
A empresa acima identificada
opera neste Estado no ramo de prestação de serviços de radiochamada. Afirma que
na execução do serviço de radiochamada, em cumprimento do contrato firmado com
seus clientes, desenvolve três serviços distintos, a saber: a) serviço de
radiochamada; b) locação do aparelho (pager); e c) serviço de
secretaria, correspondente ao atendimento feito pelas atendentes da empresa aos
clientes via telefone. Afirmando que somente o serviço de radiochamada está
abrangido pela hipótese de incidência do ICMS, estando os demais sujeitos ao
ISS, consulta o contribuinte sobre ser possível a emissão de uma única nota
fiscal na qual sejam discriminadas cada uma dessas atividades, para serem
tributadas separadamente, a primeira pelo ICMS e as demais pelo ISS.
02. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL
Constituição Federal, art. 155,
inciso II;
Lei n° 5.172/66 (CTN), art. 109;
Lei Complementar no
87/96, arts. 2o, inciso III, e 13, inciso III;
Lei no
10.297/96, arts. 2o, inciso III, e 10, inciso, III
03. FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA
Ao contrário do que pretende a
consulente, a operação que esta realiza não se constitui, para fins tributários,
de três diferentes prestações de serviço, de molde a ter-se, na situação
descrita, três fatos geradores de obrigações tributárias distintos.
Conforme ensina Marçal Justen
Filho, “não é simples fato do serviço em si mesmo que está, na sua descrição ideal, inserido na
materialidade da hipótese tributária: o que se tributa é a prestação de serviço
como adimplemento de uma obrigação” (O Imposto Sobre Serviços na
Constituição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1985, p. 86).
De fato, na análise da situação fática
com vistas à verificação da configuração da hipótese legal de incidência do
tributo não se leva em conta aspectos meramente formais do negócio jurídico,
como, por exemplo, o tipo de contrato celebrado entre o contribuinte e seu
cliente. Isso porque a forma que se dê ao negócio, sua aparência, não constitui
elemento essencial do tipo tributário. Assim, ter-se-á uma prestação de serviço
tributada quando for essa a atividade realizada pelo contratado em favor do
contratante em cumprimento da obrigação assumida, pouco importando o fato de
haver sido celebrado um contrato de prestação de serviço, de empréstimo ou de
locação, ou mesmo que não tenha sido celebrado contrato algum.
Nesse sentido, lembramos mais uma
vez Marçal Justen Filho, que assevera:
“A norma tributária, como regra,
não se ocupa de determinar como deve ser executada a prestação nem como deve
efetuar-se a contratação - o que lhe importa é que se configure a execução de
uma obrigação, consubstanciando-se prestação de utilidade qualificável como
serviço. Caberá a outras normas regularem a forma do contrato e os requisitos
para qualificação jurídica da atividade como execução de obrigação.
Isso não quer significar, por
óbvio, que a norma tributária esteja compelida a aceitar a qualificação jurídica
efetuada por normas não-tributárias.” (ob. cit., p. 88-89)
Vê-se, assim, que ainda que se
celebrem diversos contratos, visando desmembrar a operação realizada em
diversas outras, com denominações e naturezas jurídicas distintas, não se
produzirá o pretendido efeito de se ter cada uma dessas etapas realizadas pelo
contribuinte tributadas como se fossem uma operação distinta e desvinculada do
fim visado pelo destinatário ao contratar o serviço.
No caso em tela, a obrigação
assumida pela consulente frente a seus clientes é a de prestar serviço de
radiochamada. As demais atividades referidas (entrega do aparelho ao usuário do
serviço e o atendimento realizado pelos funcionários da consulente) constituem
apenas etapas da realização desse objeto, e não prestações distintas e dele
desvinculadas. É absurdo pretender que alguém contrate a consulente apenas com
o objetivo de receber atendimento telefônico pelos funcionários desta ou que
alugue um pager apenas para tê-lo em casa.
Por outro lado, não se terá
concretizada a prestação do serviço de radiochamada sem a realização dessas
atividades. Resta claro, portanto, tratar-se de uma única prestação de serviço,
para cuja realização diversas atividades deverão ser desenvolvidas pelo
prestador. Estas são, contudo, obrigações subjacentes à obrigação principal
assumida pelo contratado, e que desta não se desvinculam para se tornar
prestações de serviço autônomas e distintas, como quer ver a consulente.
A tais atividades desenvolvidas
pelo contribuinte com o objetivo de atingir o fim visado com o negócio jurídico
denomina Aires F. Barreto “atividades-meio”, afirmando a respeito:
“Os leigos tendem a confundir o
exercício de atividades-meio com prestação de serviço. Calcados na nomenclatura
dos serviços (...) misturam, embaralham, confundem, equiparam, tarefas-meio com
serviços. Na sua simplicidade ingênua, não distinguem a consistência do esforço
humano prestado a outrem, sob regime de direito privado, com conteúdo
econômico, das ações intermediárias que tornam possível o “fazer para
terceiros”.
(...)
A concreta indicação de uma ação
(datilografia, programação, organização, manutenção, operação, administração)
é, muitas vezes, configuradora de atos, fatos ou obras meramente constitutivos
de etapas necessárias para alcançar um fim. É inafastável - ainda que disso
muitos não se dêem conta - que o atingir um fim qualquer exija, empírica ou
cientificamente, atividades de planejamento, organização, administração,
controle, não obstante essas ações nada tenham a ver com o fim perseguido que,
por hipótese, poderia ser o de transportar pessoas.
Outras vezes, essas mesmas ações
humanas não mais se caracterizam como atividades condicionantes da
concretização de um fim, mas demarcam, ao revés, o próprio objeto colimado.
Nesses casos, a razão última dessas ações é a sua própria produção como
utilidade, para terceiros.
(...)
Para essas atividades-meio não há
cobrança de preço; mas, nem mesmo quando, em certos casos, para elas é
destacado preço, essas “ações-meio” se transformam em “ações-fim”. O serviço
médico não assume outra natureza pelo simples fato de os resultados de
diagnósticos serem fornecidos verbalmente, datilografados ou por listagem de
computador, mesmo que para os últimos houvesse uma cobrança adicional e
específica de tantos reais.
(...)
Não se pode decompor um serviço
(...) nas várias ações-meio que o integram para pretender tributá-las
separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço
autônomo”. (ISS - atividade-meio e serviço-fim, Revista Dialética de Direito
Tributário, São Paulo, n. 5, fev. 1996, p. 81-85)
A lição é de clareza meridiana,
não restando dúvida de que o fornecimento do aparelho ao cliente e a atividade
desenvolvida pelos funcionários da consulente constituem etapas da prestação de
serviço de radiochamada, tendo-se neste caso uma única prestação de serviço
tributada, e não prestações de serviço autônomas e distintas, sujeitas
isoladamente a tratamento tributário próprio, segundo a natureza jurídica
específica de cada uma delas.
Veja-se ainda que a Lei no
10.297, de 26 de dezembro de 1996, repetindo os termos da Lei Complementar no
87/96, fixa, em seu artigo 10, inciso III, como base de cálculo do ICMS na
prestação de serviço de comunicação o preço do serviço.
Bernardo Ribeiro de Moraes,
falando sobre a base de cálculo do ISS, que, tal como no serviço de
comunicação, é o preço do serviço, assevera:
“Preço do serviço é, pois, a
expressão monetária do valor auferido, imediata ou diferida, pela remuneração
ou retribuição do bem imaterial (serviço) oferecido (prestado, vendido).
(...)
O legislador utiliza a expressão
“preço do serviço”, sem qualquer outro adjetivo e silenciando quanto a deduções
permitidas. Evidentemente o legislador está dispondo sobre o preço bruto (sem
dedução de qualquer parcela, mesmo a título de carreto ou imposto), e não o
líquido. O preço do serviço vem a ser, desta forma, a receita bruta que lhe
corresponda, auferida pelo prestador do bem imaterial.
(...)
O preço do serviço abrange a
receita total auferida, sem quaisquer deduções da importância entrada para o
patrimônio do contribuinte, proveniente da prestação de serviços. Abrange,
pois, a soma de tudo quanto foi auferido pelo contribuinte como produto da
atividade prestada. Da receita bruta, diz o Prof. Rubens Gomes de Sousa, “não
se admite qualquer dedução”. (Doutrina e prática do ISS, São Paulo, RT, 1978,
p. 518-520)
Ora, não há negar que no caso,
todos os valores percebidos pela consulente (sua receita bruta) o são em função
da prestação do serviço de radiochamada. Uma vez que as demais atividades
referidas são apenas atividades necessárias à concretização dessa prestação,
todo o valor percebido pela consulente, seja a que título for (p. ex.,
remuneração pela locação do pager) estará sujeito à incidência do ICMS,
visto que a receita total auferida comporá o preço do serviço, base de cálculo
desse imposto.
Diante do exposto, responda-se à
consulente que não há na situação descrita na consulta mais de uma prestação de
serviço, tributadas cada uma delas separadamente, sendo, portanto indevido o
procedimento pretendido. Ao contrário, deverá constar no documento fiscal a
prestação de serviço realizada (serviço de radiochamada) sem a discriminação
das etapas (atividades-meio) desenvolvidas até sua concretização. Da mesma forma,
o ICMS deve ser calculado com base no preço total do serviço, sem qualquer
exclusão.
É o parecer. À consideração da
Comissão.
Gerência de Tributação, em
Florianópolis, 24 de agosto de 1999.
Laudenir Fernando Petroncini
FTE - Matr. 301.275-1
De acordo. Responda-se a consulta
nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 8 de setembro
de 1999.
Laudenir Fernando Petroncini João Paulo Mosena
Secretário Executivo Presidente da COPAT