EMENTA: ICMS. A TRANSFERÊNCIA DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO PARA OUTROS ESTABELECIMENTOS DO MESMO TITULAR NÃO CONSTITUI FATO GERADOR DO IMPOSTO,  OBSERVADO O DISPOSTO NA L.C. 87/96, ART. 21, § 1°.

CONSULTA Nº: 21/97

PROCESSO Nº  : GR04-14.223/97-0

01 - DA CONSULTA

A consulente em epígrafe, operando no ramo de fabricação de produtos de higiene e limpeza, produtos de toucador e cosméticos possui estabelecimentos em vários Estados da Federação, inclusive Santa Catarina. Esclarece que realiza habitualmente movimentação de bens do ativo imobilizado entre seus estabelecimentos, em operações dentro do Estado e interestaduais.

A consulta versa sobre a incidência ou não de ICMS sobre as transferências de bens do ativo imobilizado entre estabelecimentos da mesma empresa, face ao disposto no § 1° do art. 21 da Lei Complementar n° 87/96. Segundo a Súmula n° 166 do STJ, o simples deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte não configura fato gerador do imposto.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal, art. 155, II;
Lei Complementar n° 87/96, arts. 2°,I, 20, § 5°, e 21, § 1°;
Lei n° 10.297/96, arts. 2°,I, 22, § 1°, e 30, § 1°.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

O ICMS, conforme a competência impositiva dada aos Estados pela Constituição, tem por fato gerador a realização de operações de circulação de mercadorias e a prestação dos serviços que refere. Em obediência ao comando constitucional, para incidir o imposto não basta a circulação do bem, mas, deve ainda tratar-se de mercadoria, como definida na lei comercial.

A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, por ela utilizados (CTN, art. 110). Assim o conteúdo jurídico da expressão "mercadoria" deve ser pesquisado no direito comercial.

Entende-se por mercadoria o bem móvel adquirido para revenda. A atividade de compra e venda de mercadorias caracteriza a profissão de comerciante que daí ganha o seu sustento. A mercadoria é objeto do comércio, entendido como mediação entre produtor e consumidor, praticada habitualmente com fito de lucro. Ser mercadoria não é atributo de certa categoria de bens econômicos, mas qualquer bem pode adquirir essa qualidade, por certo tempo, enquanto não entregue ao consumidor final. A esse propósito leciona Roque Antônio Carraza (ICMS. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 27):

Não é qualquer bem móvel que é mercadoria, mas só aquele que se submete à mercancia. Podemos, pois, dizer que toda mercadoria é bem móvel, mas nem todo bem móvel é mercadoria. Só o bem móvel que se destina à prática de operações mercantis é que assume a qualidade de mercadoria.

Estamos, pois, percebendo que nada é mercadoria "pela própria natureza das coisas". De fato, como aguisadamente observa Paulo de Barros Carvalho, a natureza mercantil de um ser não deflui de suas propriedades intrínsecas, mas sim, de sua destinação específica. Assim, um jogo de xadrez será mercadoria, se colocado à venda pelo comerciante, em seu estabelecimento, mas não o será se ele o trouxer para sua casa, para seu deleite intelectual. Também uma máquina-operatriz é mercadoria quando a pessoa que a fabrica a vende ao industrial, para sua empresa. Nesta, porém, a máquina passa a ser bem de capital fixo, deixando de ser mercadoria, já que, mudando de finalidade, sai da circulação e entra na produção. Portanto, é a destinação do objeto que lhe confere, ou não, o caráter da mercadoria.

Para que um bem móvel seja havido por mercadoria, é mister que ele tenha por finalidade a venda ou revenda. Em suma, a qualidade distintiva entre bem móvel (gênero) e mercadoria (espécie) é "extrínseca", consubstanciando-se no propósito de utilização no comércio.

No caso da presente consulta, o bem de capital é mercadoria enquanto estiver posto à venda pelo seu fabricante ou pelo revendedor, mas, deixa de sê-lo quando imobilizado e posto em uso pelo seu adquirente. A transferência de bens do ativo imobilizado entre estabelecimentos do mesmo titular, embora haja uma circulação física dos bens, não se caracteriza como fato gerador do ICMS porque os referidos bens não têm mais a qualidade de mercadorias.

A isenção na saída de bens do ativo imobilizado, após doze meses de permanência no estabelecimento remetente, prevista no RICMS/89, Anexo IV, art. 1°, XXVII, e § 5°, I (Convênios ICMS 70/90, 80/91 e 151/94), caracteriza uma das chamadas isenções "didáticas". Isto porque a hipótese não é de isenção, mas de não-incidência. A rigor, a aludida regra isencional contém, de fato, uma regra de tributação. Consideram-se tributadas as saídas inferiores a doze meses. Antes de decorrido este período, a imobilização é dita "transitória ou aparente."

A inovação trazida pela Lei Complementar n° 87/96 não foi a exoneração das saídas do ativo imobilizado. Essas saídas nunca estiveram sujeitas à tributação. A nova lei integrativa da Constituição assegura, na verdade, o direito ao crédito fiscal decorrente da imobilização desses bens. Resolve-se, assim, a distinção entre créditos "físicos" e créditos "financeiros". Os bens do ativo imobilizado, apesar de não se integrarem ao produto final, nem serem consumidos no processo industrial, passaram a dar direito à apropriação do crédito do imposto. Diz a Lei Complementar 87/96:

Art. 20. Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada da mercadoria, real ou simbolicamente, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação.

Isto posto, responda-se à consulente:

a) a saída de bens do ativo imobilizado, nas transferências para outros estabelecimentos do mesmo titular não constitui fato gerador do ICMS;

b) a saída para outros contribuintes de bens do ativo imobilizado não se sujeita ao imposto, ressalvado o caso das imobilizações "transitórias ou aparentes";

c) a saída antes de completado o prazo de cinco anos de permanência no estabelecimento implica no estorno dos créditos fiscais correspondentes, proporcionalmente ao tempo faltante.

A superior consideração da Comissão.

Getri, em Florianópolis, 17 de abril de 1997.

Velocino Pacheco Filho

FTE matr. 184.244-7

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 13/05/97

Pedro Mendes                           Isaura Maria Seibel

Presidente                                Secretária Executiva