EMENTA: ICMS. O INSTITUTO DA CONSULTA OBJETIVA, EXCLUSIVAMENTE, DIRIMIR DÚVIDAS SOBRE A INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DOS DISPOSITIVOS DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA REFERENTES AOS IMPOSTOS DE COMPETÊNCIA ESTADUAL E NÃO A RATIFICAÇÃO DE PROCEDIMENTOS, ADOTADOS PELO CONTRIBUINTE, QUE VÃO DE ENCONTRO A MESMA.
- AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS, INERENTES AO INSTITUTO.
- IMPOSSIBILIDADE DE SE ANALISAR, ATRAVÉS DESTE, A CONSTITUCIONALIDADE, OU NÃO, DE CONVÊNIOS CELEBRADOS DE ACORDO COM A LEI COMPLEMENTAR N° 24/75, BEM COMO DE LEIS E/OU DECRETOS ESTADUAIS.

CONSULTA Nº: 84/96

PROCESSO Nº: UF15 -30003/94-6

01 - DA CONSULTA

A consulente, empresa dedicada à exploração dos serviços de transporte coletivo, vem, por meio deste instituto, "... expor suas dúvidas e obter esclarecimentos a respeito do direito à escrituração de créditos oriundos da entrada de mercadorias, na proporção da redução de sua base de cálculo do ICMS".

Insurgindo-se contra a edição dos Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89, os quais, segundo seu entender, condicionam a redução da base de cálculo do tributo à substituição do sistema normal de tributação, ou seja, desconsideram a não-cumulatividade do tributo, a consulente entende incontestável seu direito de escriturar, para fins de compensação, esses créditos na mesma proporção em que deve calcular seus débitos. Além disso, pelo fato de escriturá-los extemporaneamente, para que sejam resguardados seus direitos, tais créditos devem ser corrigidos monetariamente.

Após estas considerações, aqui expressas de forma sucinta, elenca uma série de perguntas que pretende ver respondidas através deste pedido.

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Constituição Federal, art. 155, § 2°, II, "a" e "b";

Lei Complementar 24/75;

Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89, cláusula segunda, parágrafo único;

RICMS/SC-89, Anexo IV, art. 10, §§ 1° e 2°.

Portaria SEF 68/79, de 29.06.79.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

Antes de adentrarmos ao mérito da discussão, é conveniente que visualizemos quais os objetivos (implícitos) da empresa ao formular a presente consulta .

Aparentemente, a consulente visa com este instituto, saber se é ou não possível, à luz da legislação tributária do imposto, utilizar-se de créditos fiscais na aquisição de mercadorias na mesma proporção da redução da base de cálculo aplicável nas prestações dos serviços de transportes, já que a empresa se beneficia desta redução opcional prevista no artigo 10, Anexo IV do RICMS/SC-89.

Se fosse realmente esta a dúvida suscitada, sua resposta não demandaria maiores discussões porque esta consta, de forma negativa, do parágrafo 2°, do mesmo artigo 10 do Anexo IV.

A utilização dos créditos fiscais relativos às entradas tributadas só seria possível se o contribuinte, ao invés de optar pela redução da base de cálculo prevista para as saídas, mantivesse o sistema de tributação normal previsto na parte geral do regulamento do ICMS, a teor do disposto no parágrafo 1° deste mesmo artigo.

Ora, se a empresa quisesse utilizar os créditos que porventura tivesse, por ocasião das entradas - e desde que fossem legais e legítimos -, poderia, desde que não optasse por esse benefício. Afinal, toda a legislação citada é bastante clara.

Não há dúvida quanto a aplicação e interpretação da mesma. Não havendo dúvida, não cabe consulta...

Se a consulente, de fato, achasse que o direito ao crédito do imposto decorrente de suas entradas fosse controvertido, aguardando a resposta da consulta para certificar-se de seu direito - que seria o lógico e o correto -, a mesma não teria, como fez, contrariando a legislação de regência vigente, lançado esses créditos em sua conta gráfica, conforme fica patente no seguinte trecho de seus argumentos (fls. 09): "Dessa forma, por entender seu esse direito, procedeu, na conformidade com a legislação vigente, em sua escrita fiscal, o lançamento do crédito de suas entradas, na proporção de seu encargo".

Na verdade, como se depreende da leitura de seu arrazoado, a consulente não tem, de fato, qualquer dúvida na interpretação e/ou aplicação dos dispositivos legais que regem a matéria, tanto é que em nenhum momento cita qualquer dispositivo específico da legislação tributária sobre o qual paire alguma incerteza nem sequer menciona a que mercadorias se referem estes créditos utilizados, ou qual a destinação das mesmas em seu estabelecimento. Pelo contrário, ciente de que a legislação ordinária não se coaduna com o entendimento por ela defendido tão arduamente, taxou de inconstitucionais todas as disposições infra-constitucionais que vão de encontro aos seus interesses, como é o caso dos Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89, e, através do instrumento da consulta, de forma camuflada, espera que o Estado ratifique integralmente os procedimentos até então adotados, ainda que ao arrepio das normas por ele editadas e defendidas.

É necessário que se esclareça à consulente que:

1- o instituto da consulta não se presta a analisar, muito menos declarar, se os Convênios celebrados e ratificados pelas Unidades da Federação, as leis ordinárias dos Estados, ou seus decretos, ferem, ou não, as disposições contidas na Carta Magna ou leis complementares, hierarquicamente superiores, mas, tão somente, a dirimir dúvidas acerca da aplicação destas disposições legais a casos específicos, porventura suscitados pelos contribuintes sujeitos a sua obediência;

2- a via legal para questionar a constitucionalidade da legislação tributária aplicável é a judicial e não a administrativa;

3- igualmente, e frisamos uma vez mais, o instituto da consulta não se presta a avalizar medidas adotadas de forma unilateral, que vão nitidamente de encontro à legislação vigente e, por fim,

4- ao sujeito passivo cabe, unicamente, cumprir as determinações contidas nos diplomas legais e apresentar consulta apenas nos casos em que a legislação for omissa ou gerar dúvidas de interpretação, o que não ocorre com o artigo 10 do Anexo IV do RICMS/SC-89, na medida em que este dispositivo é suficientemente claro e tem suas restrições estabelecidas de forma expressa e precisa.

É bom que se deixe claro, ainda, que o não cumprimento do disposto no parágrafo 1° do artigo 2°, bem como da infringência direta do parágrafo 2°, artigo 6°, ambos da Portaria SEF 68/79, de 29/06/79, que disciplinava o instituto da consulta à época da protocolização do pedido, resultam no fato de que a consulente não poderá se beneficiar dos efeitos inerentes ao instituto, conforme estabelecidos no art. 6° desse mesmo diploma legal.

No mérito, de qualquer forma, é conveniente que façamos algumas colocações para melhor situar a questão objeto da consulta:

a) em primeiro lugar, é bom que se frise, a "redução da base de cálculo" do ICMS na prestação de serviços de transporte concedida pelos Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89, na dicção da própria Lei Complementar 24/75 é um benefício, um favor fiscal que, uma vez utilizado, resulta numa redução, direta ou indireta, do respectivo ônus tributário.

A regra geral é, portanto, a tributação integral do serviço de transporte prestado, uma vez ocorrida a hipótese fática ensejadora da ocorrência do fato gerador do tributo.

Ora, no sistema de apuração "normal" do imposto, ou seja, naquele em que os créditos fiscais relativos às aquisições anteriores devem ser considerados, para fins de compensação, no momento do cálculo da apuração do imposto a recolher, de forma que o saldo devedor reflita apenas o valor do imposto que deve ser recolhido em função daquela etapa de circulação específica da mercadoria, não há que se falar em ofensa ao princípio da não-cumulatividade conforme insculpido na Constituição Federal, uma vez que é assegurado ao contribuinte do ICMS a manutenção integral do crédito do imposto lançado nas operações antecedentes desde, obviamente, que não expressamente vedados pela legislação de regência.

Em momento algum os indigitados Convênios negaram vigência ao art. 155, § 2°, I da Carta Magna, isto é, a faculdade de se liquidar o crédito tributário pelo sistema de compensação entre créditos e débitos sempre foi oferecida ao contribuinte, nunca lhe foi negada;

b) em segundo, é necessário ressaltar o caráter opcional do benefício da redução oferecida, ou seja, o aspecto de que o contribuinte não está obrigado a adotar o novo sistema; depende de sua exclusiva e inteira vontade, inclusive sua manutenção. Como a escolha é de seu inteiro talante, a opção utilizada depende somente de sua conveniência, o que é extremamente positivo pela ótica do contribuinte: se este adquire mensalmente muitos insumos sujeitos à tributação ou, se por qualquer motivo acumula saldos credores em conta gráfica, certamente lhe trará benefícios optar pelo sistema normal de tributação; se, em contrapartida, seus créditos são restritos e o volume de operações tributadas enseja constantes saldos devedores do imposto, o sistema alternativo seria, sem dúvida, a melhor opção;

c) em terceiro, justamente por ser um favor fiscal, uma exceção à regra, a fruição do benefício vem condicionada ao cumprimento de pré-requisitos. A recíproca é igualmente verdadeira: não obedecida a condição, o benefício se torna inaplicável.

Este é um dos erros que a consulente comete: se esquece que o Convênio que oferece ao contribuinte uma alternativa capaz de reduzir o montante do tributo que este deveria recolher aos cofres públicos, não fosse o benefício, pode impor a condição que entender necessária para o gozo do mesmo e, mais que isso, que as alternativas propostas são excludentes entre si, ou seja, a adoção de um sistema de apuração exclui, necessariamente, os pressupostos do outro e vice-versa.

Absurda, portanto, a propositura da empresa de se utilizar apenas da parte cômoda de ambos os sistemas (crédito fiscal ainda que aproveitável proporcionalmente ao percentual da exoneração tributária x redução da base de cálculo do imposto) como se estes pudessem ser adotados de forma concomitante.

Se esta considera indisponível o direito ao crédito do imposto que incidiu nas etapas anteriores da circulação da mercadoria, que adote o sistema da conta-corrente fiscal na apuração de seu imposto devido. Nada a impede de fazê-lo.

O que não é correto é se apropriar da parte do benefício que lhe é conveniente - benefício este, insistimos, opcional e alternativo - e desrespeitar sua condicionante sob o falacioso argumento de que esta afronta o princípio da não-cumulatividade, como se os contribuintes fossem compelidos a adotar esta segunda opção.

A propósito, é conveniente que transcrevamos recente decisão judicial exatamente sobre o assunto enfocado onde o ilustre Desembargador Tupinambá Miguel Castro do Nascimento, relator do processo, toca, com maestria, na questão da empresa utilizar o benefício apenas no que diz respeito ao seu lado mais cômodo:

BASE DE CÁLCULO REDUZIDA. PRINCÍPIO DA  NÃO-CUMULATIVIDADE.

A opção pelo sistema de redução de base de cálculo, por ser benefício utilizado pelo contribuinte a seu talante, não viola o princípio da não-cumulatividade. Apelação improvida.

O apelante, por manifestação voluntária, o que é incontroverso nos autos, utiliza-se do benefício de redução de base de cálculo do ICMS em substituição do sistema de tributação comum (fls. 9), ficando a base de cálculo reduzida a 80%. Pretende, objetivamente, com a ação, o aproveitamento de créditos relativos à entrada de insumos que fazem parte do ativo circulante e, em complementação, corrigi-los monetariamente quando aproveitados com atraso.

O benefício da redução da base do cálculo foi concedido com apoio nos Convênios ICM, 46/89 e 38/89, lendo-se, em ambos, além do caráter opcional ao talante do contribuinte, um efeito tributário: "O contribuinte que optar pelo benefício previsto na cláusula anterior não poderá utilizar créditos fiscais relativos a entradas tributadas" (cláusula 2ª, parágrafo único, fls. 75 e 76v.). O não poder utilizar os créditos fiscais é previsto, identicamente, no art. 34, I, letra n, do RICMS (Decreto n° 33.178, de 02.05.89).

O ora apelante, que se beneficia dos cômodos do benefício, quer afastar os incômodos, alegando-os ofensivos ao princípio constitucional da não-cumulatividade. Afasto este entendimento, como equivocado.

Com efeito, os Estados podem regular a respeito de benefícios fiscais (art. 155, § 2°, XII, g, da CF), obedecidas as regras da Lei Complementar n° 24/75, recepcionada pela atual Constituição (art. 34, § 8°, do ADCT), lei complementar esta que trata, também, da redução da base de cálculo (art. 1°, parágrafo único, I). E, como se viu, a regulação estadual, através de convênios, condiciona a opção do novo sistema à não-utilização dos créditos. (Apelação Cível n° 594051617 - 1ª Câmara Cível - Porto Alegre - RJTRGS n° 169);

E, ainda, a ementa da Apelação Cível n° 232.549-2, julgada pela décima oitava Câmara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em 2 de maio de 1994, rel. Des. Massami Uyeda (publ. na Lex 162, J.T.J., pg. 155):

IMPOSTO - Circulação de mercadorias e serviços - Operações de serviços de transporte - Direito de crédito pelo valor integral - Inadmissibilidade - Empresa que optou pelo benefício de reduzir a base de cálculo - Impossibilidade, ademais, de se creditar aquilo que não foi recolhido - Recurso não provido.

Por fim, um último ponto merece especial atenção de nossa parte. A principal argumentação da consulente ao alegar a inconstitucionalidade do parágrafo único, da cláusula segunda, dos Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89 é que estes, ao restringirem, de forma absoluta, o aproveitamento dos créditos fiscais uma vez utilizado o benefício concedido, colidiram frontalmente com um princípio basilar do ICMS, de origem constitucional, que é o princípio da não-cumulatividade.

Além disso, estes mesmos Convênios, neste particular, vão de encontro ao que determina o artigo 32, inciso II, do Convênio ICM 66/88, com força de Lei Complementar, a teor do permissivo excepcional constante do art. 34, § 8°, do ADCT da CF de 88, o qual permite a utilização dos créditos de forma proporcional à redução da base de cálculo.

Para a peticionária, a "redução da base de cálculo" autorizada pelos referidos Convênios, é incompatível com a vedação irrestrita do aproveitamento dos créditos relativos às aquisições anteriores.

A interpretação literal que a mesma faz do texto desses diplomas legais, leva-a a basear suas argumentações em premissas que não são verdadeiras e, conseqüentemente, a chegar a conclusões precipitadas e igualmente errôneas.

Dentro de sua linha de raciocínio, podemos destacar três principais argumentos contrários à tese tão arduamente defendida pela consulente:

1 - a aparente incompatibilidade entre as normas dos Convênios ICM 46/89 e ICMS 38/89, no que se refere ao aproveitamento de créditos fiscais, e a do Convênio ICM 66/88, que regulamentou provisoriamente o ICMS, pode ser justificada na medida em que os primeiros são específicos e tratam da incidência do imposto sobre prestações de serviços de transporte, enquanto que o segundo é norma geral, aplicável a todo e qualquer caso. Sendo assim, a regra especial prevalece sobre a geral.

2 - a consulente parece não se ter apercebido que a Constituição Federal, em seu art. 155, § 2°, II, a e b, nos diz que "salvo determinação em contrário da legislação de regência do imposto, a isenção ou não-incidência não implicará crédito para compensação com o montante devido nas operações ou prestações seguintes ....".

Da mesma forma, no art. 32 e seu inciso II do Convênio ICM 66/88, está consignado de maneira harmônica com o comando constitucional que "salvo determinação em contrário da legislação, acarretará a anulação do crédito a operação ou prestação subseqüente com redução da base de cálculo, hipótese em que o estorno será proporcional à redução".

Ora, se tanto a Carta Magna quanto a Lei Complementar salvam as disposições da legislação em contrário, ao estabelecerem a regra geral, é mister concluírmos que os Convênios editados com base na Lei Complementar 24/75, recepcionada que foi pela Constituição de 88, tem respaldo legal tanto para anular todo o crédito compensável, como no caso em análise, quanto para autorizar o creditamento total, sem afronta à ressalva contida no inciso II, do § 2°, art. 155 da Constituição;

3 - a consulente, como dito, cria todo um arcabouço teórico partindo da premissa de que o que os Convênios previram foram reduções da base de cálculo do imposto nas prestações de serviços de transporte.

Não concordamos com essa assertiva. Em nenhum momento nem o Convênio ICM 46/89, nem o ICMS 38/89, previram reduções diretas da base de cálculo de forma a reduzir o tributo devido. A dicção de ambos os Convênios era de que a base de cálculo do imposto seria reduzida de forma que a incidência nominal do imposto ficasse também reduzida aos percentuais indicados, dependendo da alíquota aplicável em cada prestação.

Isto significa dizer que o que esses Convênios na verdade concederam foi uma redução indireta da base de cálculo o que, em outras palavras, representa uma técnica extrafiscal do tipo "crédito presumido" (e, portanto, ficto), colimando obter reduções indiretas do imposto a pagar.

Este o aspecto nodal da questão: importa verificar não o nome que é dado ao benefício mas a materialidade da norma em análise, a qual traz no seu bojo, de forma implícita, a concessão de créditos presumidos.

Tanto isso é verdadeiro, que a cláusula segunda de ambos - que é justamente o motivo da irresignação dela - em seu parágrafo primeiro, veda a apropriação dos créditos fiscais relativos à entradas tributadas.

O motivo é simples: a proibição não tem o intuito de ferir um princípio constitucional, como quer fazer crer a consulente, mas pura e simplesmente ratificar que se os créditos fiscais (estes dedutíveis), concedidos para ajustar a tributação à não-cumulatividade já estão absorvidos no percentual de redução do imposto a pagar - e é justamente esta a razão da edição do Convênio -, seria um contra-senso admitir que esses créditos pudessem ser novamente aproveitados.

Nunca é demais lembrar que essa redução indireta da base de cálculo, e conseqüentemente os próprios Convênios, é justificável não só pelo fato de se procurar com essa medida reduzir o preço do serviço de transporte, seja pelo aspecto social deste, onde o custo é suportado pelo passageiro, seja com o intuito de minimizar o problema crucial de abastecimento, no caso do transporte de cargas, mas principalmente para procurar encontrar uma saída que fosse menos prejudicial aos contribuintes para o problema que se criou, com o advento da Carta de 88, com a possibilidade de o ICMS englobar não só as operações dos setores produtivos responsáveis pelo ciclo de produção e comercialização de riquezas, mas também os serviços de transporte e de comunicação.

Até então, adotava-se a concepção dos créditos físicos em oposição ao dos créditos financeiros, isto é, no sistema anterior, a incidência dava-se apenas sobre mercadorias que ingressavam e saíam do estabelecimento (crédito pelo primeiro e débito pelo segundo), sendo restrito a bens fisicamente transladáveis; agora, que o imposto engloba bens e serviços, sendo que estes não são fisicamente transladáveis, parece evidente que a noção de crédito físico transmudou-se em créditos financeiros .

Para evitar ou ao menos minimizar as discussões que certamente emergiriam em função de qual tipo de produto ou serviço daria direito ao crédito escritural, especialmente no caso do serviço de transporte de cargas ou passageiros em que a noção do que vem a ser "insumo" não tem contornos muito bem definidos, já que os produtos que ingressam no estabelecimento não correspondem fisicamente aos que saem (com efeito, o ingresso é de combustíveis e outros itens e a saída é de serviço), é que se autorizou a redução indireta da base de cálculo do imposto nesses serviços, via subsunção dos créditos compensáveis.

Nenhuma ofensa ao princípio constitucional da não-cumulatividade pode ser detectada.

Este, é princípio que deve ser examinado a partir da última operação, pois o que visou o constituinte foi, pura e tão somente, eliminar o efeito cumulativo de operação em operação até a última, conferindo ao imposto a característica da neutralidade.

O princípio da não-cumulatividade é portanto apenas isto. Hipóteses incidentes anteriores devem ser consideradas para evitar-se a tributação em cascata. Visa apenas não permitir a cumulação de impostos incidentes. E mais nada, pois nada mais está na Constituição.

Esse objetivo se encontra inatacado no caso sob enfoque, uma vez que lhe é assegurado o direito de manter os créditos do imposto que incidiu nas etapas anteriores, caso o sujeito passivo opte pelo sistema de apuração normal do imposto ou mesmo, caso opte pelo sistema alternativo, o crédito presumido embutido no percentual de redução autorizado através dos Convênios.

No mais, o que a consulente em última análise pleiteia é o direito de utilizar duplamente os créditos fiscais do imposto: o presumido, em função da redução da base de cálculo e o proporcional, autorizado pela regra geral do Convênio ICM 66/88.

Isto é inconcebível. A vingar a tese de que o dispositivo dos Convênios que vedam o aproveitamento dos créditos é inconstitucional (mas não, obviamente e por conveniência, o da "redução da base de cálculo" que a ele está íntima e indissociavelmente ligado), não há nenhum sentido em permanecer vigorando estes mesmos diplomas que teriam de ser revogados de pronto sob pena de autorizar tratamento desigual (escrituração de créditos fiscais em duplicidade), privilegiando os contribuintes prestadores deste tipo de serviço, em detrimento de todos os demais contribuintes do ICMS.

No que concerne às suas indagações, as quais se referem fundamentalmente a questões atreladas ao crédito do imposto e à correção monetária desses (limite temporal para gozo do direito, escrituração extemporânea, etc), as respostas reputam-se prejudicadas uma vez que os créditos fiscais que a consulente lançou espontaneamente em sua conta gráfica, ainda que proporcionalmente às saídas com base de cálculo reduzida, não encontram embasamento legal na legislação ordinária aplicável, jamais poderiam ter sido utilizados para compensação com seus débitos antes da obtenção da resposta, seja qual fosse, à consulta formulada e, por fim, não foram objeto de discussão, com sentença favorável, por via judicial; logo, ilegal seu aproveitamento sob todos os aspectos.

É o parecer que submeto à Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 01 de novembro de 1996.

Neander Santos

FTE - Matr. 187.384-9

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 13/11/1996

Lauro José Cardoso                        João Carlos Kunzler

Presidente da COPAT                   Secretário Executivo