EMENTA: ICMS - INCORPORAÇÃO SOCIETÁRIA - SUCESSÃO, DA INCORPORADORA, EM TODOS OS DIREITOS E OBRIGAÇÕES DA EMPRESA EXTINTA, INCLUSIVE DO SALDO CREDOR EM CONTA GRÁFICA - CULTURA DE ÁRVORES FLORESTAIS PELA EMPRESA INCORPORADA.
ATÉ O ADVENTO DA LEI COMPLEMENTAR N° 87/96, ERA VEDADO O APROVEITAMENTO DE CRÉDITO FISCAL RELATIVO AOS GASTOS INCORRIDOS COM A FORMAÇÃO DA CULTURA PERMANENTE (IMOBILIZADO).
ATÉ 01.01.98, É IGUALMENTE VEDADO O APROVEITAMENTO DE CRÉDITO RELATIVO À ENTRADA DE BENS OU MERCADORIAS DESTINADOS AO CONSUMO DO ESTABELECIMENTO.
ATÉ A ENTRADA EM VIGOR DESSE DIPLOMA LEGAL, O QUAL NÃO ESTABELECE RESTRIÇÕES, ERA PERMITIDO, MEDIANTE COMPROVAÇÃO, O APROVEITAMENTO DE CRÉDITO RELATIVO À ENERGIA ELÉTRICA CONSUMIDA, EM PERCENTUAL SUPERIOR AO ESTABELECIDO NO ARTIGO 52, § 5°, II, “a” DO RICMS/SC-89.
O SALDO CREDOR PORVENTURA EXISTENTE, DESDE QUE LEGÍTIMO, PASSA AO PATRIMÔNIO DA SOCIEDADE INCORPORADORA, INDEPENDENTEMENTE DA EMISSÃO DE NOTA FISCAL REGULAR.

CONSULTA Nº: 41/97

PROCESSO Nº: GR10-33.392/97-8

01 - DA CONSULTA

A consulente, empresa estabelecida neste Estado, dedica-se exclusivamente ao plantio, extração e venda de madeira de pinus e eucaliptus. Estas vendas são efetuadas para outros contribuintes do ICMS, também estabelecidos nesse Estado, pelo que dadas operações gozam do diferimento do imposto. Em virtude desse fato, a empresa, que não possui filiais, vem acumulando créditos do ICMS oriundos da aquisição de matérias-primas, materiais secundários e de embalagem (sementes de plantas, adubos, herbicidas, vermicidas,  combustível para moto-serras e para tratores, energia elétrica e ativo imobilizado desde novembro de 1996) utilizados na produção da madeira.

A empresa IGARAS PAPÉIS E EMBALAGENS S/A, principal cliente da consulente, detém 99,99% de participação no Capital Social dessa. Em 19.05.97, ocorreu a incorporação societária total da consulente pela IGARAS PAPÉIS E EMBALAGENS S/A, passando essa última a assumir todos os ativos e passivos da primeira, com efeito retroativo a 30.04.97, data do Balanço base para incorporação.

Em vista desse fato e com base na informação anterior,  indaga:

a) É correta a emissão de Nota Fiscal para transferência integral do crédito acumulado do ICMS da empresa incorporada para a incorporadora, no ato de incorporação societária?

b) Esta Nota Fiscal deverá ser visada pelo fisco?

c) Em caso negativo, qual o procedimento que deverá ser adotado?

02 - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

Convênio ICM 66/88, de 14.12.88, art. 31, incisos I, III e IV;
Lei n° 7.547, de 27.01.89, art. 34, incisos II, III, IV e parágrafo único;
RICMS/SC-89 (Decr. n° 3.017, de 28.02.89), art. 52, § 5°, itens I e II, letra “a”;
Lei Complementar n° 87, de 13.09.96, arts.: 20; 33, incisos I, II e III;
Lei n° 10.297, de 26.12.96, art. 103, II, “a” e “b” e inciso IV.

03 - FUNDAMENTAÇÃO E RESPOSTA

Como ensinam os doutrinadores, a incorporação é um ato jurídico complexo, uma sucessão a título universal em todos os direitos e obrigações. Na incorporação, a sociedade incorporada não se dissolve, mas sim se extingue, passando o seu patrimônio a pertencer por inteiro à incorporadora, que a sucede o título universal. Uma sociedade (a incorporadora) nada compra no que diz respeito ao montante das mercadorias e outros bens do ativo da sociedade incorporada,  e esta, por sua vez, nada vende. Não há que se falar, portanto, em circulação de mercadorias dada a ausência de circulação econômica. O que se transaciona são as ações ou quotas da sociedade. Os bens da sociedade incorporada são conferidos para a realização do capital subscrito, quando for o caso.

A própria Lei n° 6.404, de 15.12.76 (Lei das S.A), em seu artigo 227, dispõe que “a incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos os direitos e obrigações”.

Não temos dúvida, portanto, que com a incorporação ocorrida, todos os bens, direitos e obrigações da sociedade incorporada (IGARAS AGRO-FLORESTAL LTDA) - incluindo aí, obviamente, os créditos fiscais - passaram ao patrimônio da sociedade incorporadora (IGARAS PAPÉIS E EMBALAGENS S/A), independentemente de qualquer solução de continuidade e de quaisquer outras formalidades.

É legítima, portanto, a transferência automática do saldo credor existente na conta gráfica da empresa incorporada para a incorporadora, que a sucede.

Resta saber, no entanto, qual é a origem desse saldo credor que a consulente pretende transferir, isto é, se o acúmulo desses créditos fiscais tem, ou não, base legal.

Segundo ela mesma esclarece, a empresa promove venda de madeira no mercado interno com o benefício do diferimento do ICMS, acumulando crédito do imposto oriundo da aquisição de matérias-primas, materiais secundários, e material de embalagem, utilizados na produção de pinus e eucaliptus.

A mesma tem como atividade econômica a silvicultura (cultura de árvores florestais) e o reflorestamento, basicamente, e como objeto do negócio, a venda dessa madeira.

Em interessante e exaustivo trabalho sobre contabilidade agrícola, onde se discute aspectos da cultura permanente (publicado no Boletim IOB 45/93 - Temática Contábil e Balanços - pgs. 369 a 375) José Carlos Marion, tecendo considerações genéricas sobre o assunto, conceitua ativo permanente “.. como sendo formado pelas aplicações de recursos feitas com a intenção de produzirem receitas, benefícios e utilidades pela sua manutenção dentro da empresa ou pela utilização da sua capacidade de produção. Devem ainda esses ativos, para poderem ser assim considerados, ter vida útil superior a um ano e serem capazes de produzir lucros ou benefícios que cubram seu custo de aquisição..”

Considera que, em última análise, todas as plantações, quase sem exceção, são, na realidade, como máquinas; “máquinas” essas que são construídas durante um tempo que varia de empresa para empresa, com o objetivo de produzirem os produtos que realmente a interessam, em termos de obtenção de receitas.

Partindo desses pressupostos, esse autor aduz que “do ponto de vista contábil, devem ser encaradas como culturas permanentes aquelas que:

a) tenham um prazo de maturação e produção (“construção da máquina” e elaboração do produto) superior a pelo menos um ano, e

b) produzam mais de uma vez na sua vida útil econômica, ou

c) mesmo que produzam uma única vez mas tenham prazo de maturação e produção acima do razoável (normalmente acima de dois anos)”.

Com isto, conclui, “o café é cultura permanente pela sua vida longa e produção por muitos anos. A cana-de-açúcar também é cultura permanente que precisa estar classificada como ativo permanente. A laranjeira também, bem como a macieira, a plantação de mamona, de  eucalipto, de pinho, etc”, embora reconheça que o florestamento não seja comumente chamado de cultura. No entanto, pensa, sua análise é feita de forma exatamente igual.

Com relação à classificação contábil propriamente dita dessas culturas, justamente por serem “máquinas” a produzirem, o autor entende que deverão figurar no subgrupo “Imobilizado” do Ativo Permanente e os produtos delas extraídos, estes sim, figurarão no Ativo Circulante.

Exemplificando, a floresta de eucalipto - a não ser que não se tenha intenção de explorá-la, ressalta (o que não é o caso, absolutamente, da consulente, se trouxermos essa discussão teórica para o nosso caso específico) - é classificada como imobilizado e o seu produto, a madeira, é que ficará, quando extraída, no Ativo Circulante. Conforme apregoa o próprio autor: “para o imobilizado deverá ir o valor referente a algo decididamente em uso ou sendo colocado em condições de ser usado ou explorado”.

Finalmente - e isso nos interessa mais de perto - partindo do pressuposto que a plantação será destinada à exploração - ideal para a análise dessa consulta -, e de natureza permanente, ele discute aquilo que deve, em termos de valor, ser considerado como imobilização. Além dos gastos incorridos com a preparação do solo, todos aqueles incorridos com a formação da cultura permanente deverão ser incorporados a ela no imobilizado. Segundo Marion, com o qual concordamos plenamente, “os gastos incorridos desde a própria planificação (como se fosse o gasto com o projeto de um edifício) da cultura, com a mão-de-obra direta e indireta relativas a ela, as sementes, as mudas, as adubações, os herbicidas, os fungicidas, a depreciação ou o aluguel dos equipamentos utilizados, ....... deverão ser imobilizados. Nessa mão-de-obra são incluídos os serviços de limpeza e preparação do solo, de aração, de gradeação, de carpa, de irrigação, de desbaste, poda, de acompanhamento, de pesquisa de existência de elementos daninhos (formigas, fungos, ervas, doenças, etc) e outros. E, logicamente, todos os materiais e equipamentos (via depreciação ou aluguel) também relativos a todas essas fases.”

É fácil portanto, concluir que - aos menos até a advento da Lei Complementar n° 87/96 que, entre outras profundas modificações no que concerne ao ICMS, extinguiu a distinção entre os chamados “créditos físicos” e  “créditos financeiros” -, a consulente não tem direito de se creditar do imposto porventura incidente nas aquisições de sementes de plantas, adubos para plantas, herbicidas e vermicidas.

É bom lembrar que o Convênio ICM 66/88, em seu artigo 31, incisos II e III (a Lei n° 7.547/89 nada mais fez do que repetir estas disposições - art. 34, incisos II e III) era taxativo em estabelecer que não implicaria crédito para compensação com o montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes a entrada de bens destinados à integração no ativo fixo do estabelecimento ou destinados ao consumo dele e, igualmente, a entrada de mercadorias ou produtos que, utilizados no processo industrial, não fossem nele consumidos ou não integrassem o produto final na condição de elemento indispensável a sua composição.

Dito convênio, ao contrário do que se pensa, não inovou em relação ao tributo anterior (ICM). O tipo de tomada de crédito, ou melhor, a conta-corrente fiscal utilizada (até a edição da Lei Complementar mencionada, repetimos) foi o mesmo do antigo ICM, isto é, créditos físicos, pelo valor das mercadorias e serviços adquiridos em função da produção e/ou comercialização das mercadorias e serviços tributáveis. Com efeito, o artigo 155 da Constituição Federal em seu § 2°, inciso I, deixa claro que se “compensa” em cada “operação” o “montante cobrado” nas “operações anteriores”. Com dizer dessa forma, balizou o constituinte que a não-cumulatividade é feita no eixo das operações de circulação, não se estendendo ao crédito de imposto decorrente da aquisição de máquinas e bens do ativo fixo necessários ao funcionamento da empresa, nem tampouco ao dos produtos que não se incorporem fisicamente ao produto final ou não se consumam no curso do processo de industrialização, sinalizando, dessa maneira, que a matriz insumo/produto não podia extrapolar para o lado dos custos financeiros.

Como muito bem esclarece o Exmo. Sr. Ministro Carlos Mário Velloso, relator da Apelação Cível n° 60.872-CE, 3ª Turma do antigo TFR (excerto publicado na JTFR, Ed. Lex, n° 88, pg 142):

O crédito somente será admitido no que toca aqueles bens que, no processo de industrialização, se destroem, são absorvidos, de modo direto, integral, transformando-se em resíduos, assim de nenhuma valia econômica, jamais para aqueles outros que apenas se desgastam pelo uso natural, assim bens de produção, instrumentais da indústria, bens de capital, equipamentos, que se depreciam, que se acabam, pela inexorável lei do desgaste, mas que, nem por isso, ou por isso mesmo, podem ser classificados como produtos intermediários. Estes, sim, os produtos intermediários, como acima referidos, é que autorizam o crédito de que estamos cuidando.

Seguindo esta mesma linha de raciocínio, linha essa consagrada pela doutrina, pela jurisprudência e pela lei, segundo a qual é lícito ao contribuinte creditar-se unicamente do tributo pago sobre os bens destinados à produção, excluídos os incorporados ao ativo permanente ou consumidos, é igualmente defeso à consulente apropriar-se de créditos fiscais referentes às aquisições de combustível para moto-serras e combustível para tratores até que entre em vigor o disposto no artigo 33, inciso I da Lei Complementar n° 87/96.

A energia elétrica, no entanto, é uma das exceções a essa regra. Típica despesa financeira, muito antes da edição dessa norma, a mesma Lei n° 7.547/89 já admitia, juntamente com os serviços de comunicação, o direito ao creditamento do imposto a eles relativo, desde que efetivamente empregados na comercialização ou industrialização (art. 34, § único, II).

Como fórmula simplificadora, em substituição ao levantamento da energia elétrica efetivamente empregada, é facultado ao contribuinte utilizar o percentual previsto no RICMS/SC-89, art. 52, § 5°, I e II, a. O dispositivo reconhece a dificuldade do levantamento dos créditos efetivos, mas não impede que esse seja efetuado. O contribuinte tem o direito de apropriar, desde o advento da Lei 8943/92, todo o crédito correspondente à energia elétrica efetivamente utilizada na produção ou comercialização, caso em que não fica restrito ao percentual estabelecido na legislação. No entanto, qualquer apropriação em valor superior a esse, depende, necessariamente, de comprovação.

Mais uma vez, entretanto, ressaltamos que a Lei Complementar n° 87/96, revogando disposições do Decreto-lei n° 406/68 e do Convênio ICM n° 66/88, inovou radicalmente a disciplina do regime de compensação do imposto. De acordo com o seu art. 33, inciso II, a energia elétrica usada ou consumida no estabelecimento (integralmente, portanto), dará direito de crédito a partir de 01.11.96, data em que esse diploma legal entrou em vigor.

Finalmente, a título de esclarecimento, ressaltamos que a legislação tributária estadual não exige a emissão de nota fiscal regular para transferência de saldo credor porventura acumulado em conta gráfica da empresa incorporada para a incorporadora. Sendo assim, havendo legitimidade na apropriação dos mesmos, segundo o parecer supra, é legal a transferência mediante mera formalização estatutária e/ou ata devidamente arquivada na JUCESC além, é claro, dos registros fiscais e contábeis pertinentes.

Isso posto, deve ser respondido à consulente que:

a) somente darão direito a crédito fiscal, as mercadorias destinadas ao ativo permanente, nele entradas a partir de 01.11.96, data em que passou a vigorar a Lei Complementar n° 87/96, incluídos, nesse conceito, as sementes de plantas, adubos, herbicidas, vermicidas e todos aqueles gastos incorridos com a formação da cultura permanente;

b) é vedado ao contribuinte apropriar créditos fiscais relativos à entrada de bens ou mercadorias destinadas ao consumo do estabelecimento (combustível para moto-serras, para tratores e outros “créditos financeiros”), ao menos até 01.01.98, data em que entrará em vigor o disposto no artigo 33, inciso I, desse mesmo diploma legal;

c) a Lei n° 7.547/89 assegura o direito ao crédito relativo à energia elétrica efetivamente consumida ou empregada na comercialização de mercadorias. O crédito poderá ser aproveitado nos percentuais indicados no RICMS/SC-89, art. 52, § 5° (Decreto n° 3.505, de 20.04.93, em vigor desde 01.01.93), sem necessidade de prévia comprovação. É lícito seu aproveitamento em percentuais superiores, desde que devidamente comprovado. Tal crédito passou a ser integral a partir de 01.11.96;

d) desde que legitimamente acumulados, o aproveitamento dos créditos fiscais entre as empresas envolvidas na incorporação societária far-se-á sem que haja a necessidade formal da emissão de nota fiscal modelo 1 ou 1A.

É o parecer que submeto à Comissão.

Gerência de Tributação, em Florianópolis, 01 de julho de 1997.

Neander Santos

FTE -  Matr. 187.384-9

De acordo. Responda-se a consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na sessão do dia 22/07/1997.

Pedro Mendes                       Isaura Maria Seibel

Presidente da COPAT            Secretária Executiva