ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 54/2020

N° Processo 1970000037698


Ementa

ICMS. BENEFÍCIOS FISCAIS. O ART. 35-B DO RICMS/SC FOI REVOGADO PELO DECRETO Nº 606/2020, COM EFEITOS A PARTIR DE 14 DE MAIO DESTE ANO. A APROPRIAÇÃO INTEGRAL DO CRÉDITO, PARA FATOS ANTERIORES A ESTA DATA, DEPENDE DA CONVALIDAÇÃO DO BENEFÍCIO FISCAL PELA UF DE ORIGEM, SEGUINDO RITO DISCIPLINADO NA LEI COMPLEMENTAR Nº 160/2017 E NO CONVÊNIO ICMS 190/2017. TODAVIA, NA HIPÓTESE DE O BENEFÍCIO NÃO TER SIDO CONVALIDADO, O CRÉDITO CONTINUA SENDO PASSÍVEL DE GLOSA, COM FUNDAMENTO NO ART. 35-A, HAJA VISTA QUE ESTE DISPOSITIVO AINDA SE ENCONTRA VIGENTE.


Da Consulta

Cuida-se de consulta formulada por empresa inscrita no Cadastro de Contribuintes do ICMS, no ramo de fabricação de alimentos e pratos prontos (CNAE 1096-1/00).

Informa a consulente que adquire matérias-primas de fornecedores situados em outras unidades federativas, e que algumas dessas mercadorias fruem de benefícios fiscais em inobservância ao disposto no art. 155, § 2º, XII, ‘g’ da Constituição Federal c/c art. 1º, p. ú., III, da Lei Complementar nº 24/75.

Diante disso, apresenta suas dúvidas:

a) É possível aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das entradas de produtos beneficiados por incentivos fiscais concedidos à revelia do CONFAZ pelos entes federados de origem, quando eles já cumpriram com o disposto na Lei Complementar nº 160/2017 e no Convênio ICMS 190/2017, com o que a autoridade fiscal fica impedida de aplicar as sanções do artigo 35-B do RICMS/SC?

 b) A apropriação e o aproveitamento dos créditos na hipótese da alínea anterior podem ocorrer a partir da data em que viger a lei estadual ou distrital que trata sobre reinstituição dos benefícios fiscais concedidos à revelia do CONFAZ ou a partir da data em que viger a lei estadual ou distrital que trata sobre a remissão e anistia dos créditos tributários decorrentes dos benefícios reinstituídos?

c) A Consulente pode aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das aquisições de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves do Estado do Paraná desde 19/12/2018, quando publicada a Lei Estadual nº 19.777/2018, momento em que aquele Estado cumpriu com todas as condições previstas na Lei Complementar nº 160/2017 e no Convênio ICMS 190/2017?

d) A Consulente pode escriturar e aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das aquisições de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves do Estado do Paraná de 19/12/2018 a 22/07/2019, que ainda não foram objeto de escrituração?

É o relatório. Passo à análise.


Legislação

Lei Complementar nº 160/2017;

Convênio ICMS 190/2017;

RICMS-SC, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, arts. 35-A e 35-B.


Fundamentação

Em primeiro lugar, devemos observar que o art. 35-B foi revogado pelo Decreto nº 606/2020, cujos efeitos se deram a partir do dia 14 de maio deste ano. Assim, a glosa constante do dispositivo não se aplica para fatos ocorridos após esta data; todavia, registre-se que o art. 35-A continua vigendo e, portanto, ainda é vedado o aproveitamento de crédito de benefícios irregulares, novos ou os que não passaram pelo rito de convalidação da LC nº 160/2017 e Convênio ICMS 190/2017. 

Feita essa observação, podemos responder às perguntas da consulente, em relação ao período do objeto da consulta:

a) É possível aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das entradas de produtos beneficiados por incentivos fiscais concedidos à revelia do CONFAZ pelos entes federados de origem, quando eles já cumpriram com o disposto na Lei Complementar nº 160/2017 e no Convênio ICMS 190/2017, com o que a autoridade fiscal fica impedida de aplicar as sanções do artigo 35-B do RICMS/SC?

No caso de remissão e anistia, que trata do passado, e da reinstituição, que resolve o futuro, é possível aproveitar a integralidade dos créditos de incentivos fiscais concedidos à revelia, observados os termos do Convênio ICMS 190/2017 e da Lei Complementar nº 160/2017. Ressalte-se, uma vez mais, que as sanções do art. 35-B não são mais aplicáveis, com sua revogação, para fatos ocorridos após a entrada em vigor do Decreto nº 606/2020, mas a consulente deve observar que o art. 35-A do Regulamento permanece vigente, ou seja, continua vedado o aproveitamento de favores fiscais concedidos à revelia do Confaz. Deste modo, os desagravamentos que não passaram pelo rito de convalidação podem ser objetos de glosa pela autoridade tributária, com fulcro também nos termos do art. 8º da LC nº 24/75, como qualquer outro benefício irregular.

A título de conhecimento, o assunto foi tema de recentes discussões pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal em ações ajuizadas antes da LC nº 160/2017. Quando da análise de procedência da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3692, o art. 8º da LC nº 24/75 foi considerado recepcionado pela Constituição Federal de 1988, em sessão virtual realizada pelo Pleno do STF, entre os dias 07/08/2020 e 17/08/2020. Outro julgamento importante se deu no bojo do RE 628075 (leading case do Tema 490), que, na mesma linha, considerou que o estorno proporcional de crédito de ICMS obtido por meio de benefício fiscal concedido sem autorização do Confaz é compatível com o princípio da não-cumulatividade. Importante dizer que, no seu voto vencedor, o ministro Gilmar Mendes sinaliza o respeito à nova legislação criada para dar fim à guerra fiscal:

Após a propositura da presente ação, entrou em vigor a Lei Complementar 160/2017, a qual buscou tratar das situações em que isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de ICMS foram concedidos em desacordo com o disposto na alínea “g” do inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição Federal.

A referida legislação previu quórum mais simplificado para remissão de créditos tributários e para restituição de isenções, incentivos e benefícios fiscais até então concedidos sem autorização do CONFAZ.

Diante desse quadro, a mim me parece que qualquer decisão a ser adotada por este Tribunal deve respeitar o que eventualmente fora decidido pelos Estados com base na Lei Complementar 160/2017

(STF. Minuta de voto do min. Gilmar Mendes, disponível em http://sistemas.stf.jus.br/repgeral/votacao?texto=4967444)

Dessa maneira, ao passar pelos procedimentos de convalidação da LC nº 160/2017 e do Convênio ICMS 190/2017, o benefício regulariza-se e passa a gozar do mesmo status daqueles que respeitaram, desde o início, o mandamento constitucional do art. 155, § 2º, XII, ‘g’, conforme já explicado na Resposta à Consulta COPAT nº 086/2019.

 b) A apropriação e o aproveitamento dos créditos na hipótese da alínea anterior podem ocorrer a partir da data em que viger a lei estadual ou distrital que trata sobre reinstituição dos benefícios fiscais concedidos à revelia do CONFAZ ou a partir da data em que viger a lei estadual ou distrital que trata sobre a remissão e anistia dos créditos tributários decorrentes dos benefícios reinstituídos?

Na verdade, ocorrem duas situações diferentes. A lei de remissão e de anistia na UF de origem impede a sanção imposta pelo ente da Federação de destino. Percebe-se, então, que são normas dotadas de nuances extraterritoriais, uma vez que a lei de remissão da unidade de origem impede a sanção do art. 8º da Lei Complementar pela unidade federativa de destino.

Igualmente, a reinstituição do benefício fiscal é efetuada na unidade da Federação de origem e, por isso, a apropriação deve ser contada da data da vigência da Lei que o reinstituiu, salvo disposição em contrário.

c) A Consulente pode aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das aquisições de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves do Estado do Paraná desde 19/12/2018, quando publicada a Lei Estadual nº 19.777/2018, momento em que aquele Estado cumpriu com todas as condições previstas na Lei Complementar nº 160/2017 e no Convênio ICMS 190/2017?

d) A Consulente pode escriturar e aproveitar a integralidade dos créditos de ICMS oriundos das aquisições de carne e produtos comestíveis resultantes do abate de aves do Estado do Paraná de 19/12/2018 a 22/07/2019, que ainda não foram objeto de escrituração?

Quanto às respostas das letras ‘c’ e ‘d’,  é entendimento dessa Comissão de que não é atribuição da COPAT analisar a legislação de outro ente da Federação, pois a apropriação do crédito depende da existência de remissão e anistia, para o crédito passado, e de reinstituição do benefício, para o crédito futuro, ambos no ente federativo de origem, como se percebe do trecho abaixo:

Ainda com relação à remissão, nota-se que a lei estabeleceu que a exoneração feita pela unidade federada concedente gerará efeitos retroativamente na unidade federada de destino que eventualmente tenha crédito constituído questionando o benefício fiscal irregular e glosando o crédito. Essa retroação valerá para a data em que o ato original foi concedido e terá como efeito a anulação de todos os créditos tributários constituídos ao longo dos anos e que eventualmente ainda estejam em discussão administrativa ou judicial.

 (CARVALHO, Osvaldo. MARTINELLI, Luís. A Lei Complementar nº 160 e seus reflexos nas Administrações Tributárias Estaduais. Será mesmo o fim da Guerra Fiscal?. IBET, 2017. p. 952 Disponível em: https://www.ibet.com.br/wp-content/uploads/2018/06/LC-160-Prof.-Osvaldo.pdf. Acesso em 18/03/2020)

 Além disso, pode o Estado concedente revogar ou modificar o seu alcance ou montante das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiros-fiscais antes do termo final de concessão, porquanto, revestidos os  benefícios ilegais da regularidade dada pelo Congresso em forma prescrita em lei, prescindem, ainda mais, da observância a qualquer expectativa de continuidade.

Assim, em relação ao período em que o art. 35-B vigeu, deve a consulente verificar a vigência da lei que reinstitui os benefícios fiscais na legislação tributária do Paraná, e, na permanência da dúvida, consultar o órgão competente da Secretaria de Estado de Fazenda paranaense.


Resposta

Diante do exposto, proponho que seja respondido à consulente que a apropriação integral do crédito, para fatos anteriores à revogação do art. 35-B do Regulamento, depende da convalidação (remissão, anistia e reinstituição) do benefício fiscal pela UF de origem. Para o período posterior, continua aplicável o art. 35-A, isto é,  pode ser objeto de glosa o crédito oriundo de benefício irregular.

É o parecer que submeto à elevada apreciação da Comissão Permanente de Assuntos Tributários.



GUILHERME OIKAWA GARCIA DOS SANTOS
AFRE III - Matrícula: 9576932

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 27/08/2020.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
LENAI MICHELS Presidente COPAT
CAMILA CEREZER SEGATTO Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 10/09/2020 13:47:12