CONSULTA 99/2014
EMENTA:
ICMS. REMESSA DE PRODUTOS PRIMÁRIOS PARA INDUSTRIALIZAÇÃO NOUTRO ESTADO DA
FEDERAÇÃO, PROMOVIDA POR ESTABELECIMENTO COMERCIAL.
Para
a determinação do valor que comporá a base de cálculo do imposto o contribuinte
deverá observar, sucessivamente: a) o preço FOB, à vista, cobrado pelo
estabelecimento remente na operação mais recente; b) o preço FOB, à vista,
praticado pelo mercado atacadista local ou regional; c) 75% do preço de venda
corrente no varejo.
Disponibilizado na página da Pe/SEF em 12.09.14
Da Consulta
A Consulente, devidamente
qualificada, realiza a atividade de comércio atacadista de fumo e mercadorias
em geral. Informa que adquire fumo em folha de produtores rurais catarinenses,
acobertado por nota fiscal de produtor, o qual é remetido para industrialização
noutro Estado, com retorno no prazo médio de 90 dias.
Para esse fim, vem emitindo as
notas fiscais e recolhendo o respectivo imposto sobre o valor da pauta fiscal
editada pela Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina. Não obstante,
entende que deveria recolher o ICMS sobre o valor da nota fiscal de compra da
mercadoria, conforme dispõe o artigo 9º, incisos I e artigo 11, do RICMS/SC.
Com base no exposto, requer manifestação desta Comissão acerca do seu
entendimento.
Destaca ainda que a matéria
objeto do pedido não está sujeita aos impedimentos do artigo 152-C do
Regulamento das Normas Gerais de Direito Tributário - RNGDT/SC.
A consulta foi informada na
GERFE de origem, conforme determina o artigo 152-B, § 2°, II, do RNGDT/SC,
aprovado pelo Decreto nº 22.586, de 27 de junho de 1984, manifestando-se
favoravelmente ao recebimento e análise do pedido, em face do atendimento dos
critérios de admissibilidade, e tecendo comentários
úteis para o deslinde da problemática.
Legislação
Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto n° 2.870, de 27 de agosto
de 2001, artigos 9º, inciso I; artigo 11; artigos 15 a 21.
Lei 10.297, de 26 de dezembro de 1996, artigo 15,
inciso III, §§1º e 2º; artigo 18.
Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996,
artigo 15, inciso I e §§1º e 2º.
Fundamentação
Para uma adequada compreensão da temática,
cabe inicialmente ressaltar que a base de cálculo é um elemento indispensável
para a composição do critério quantitativo da regra-matriz de incidência. Como explica Amaro "chama-se base de
cálculo a medida legal da grandeza do fato gerador. Dizemos legal porque só é
base de cálculo, dentro das possíveis medidas do fato gerador, aquela que tiver
sido eleita pela lei." (AMARO, Luciano. Direito Tributário.
14. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 264).
Nos termos do inciso I, do artigo 13, da Lei
Complementar nº 87/96, na circulação de mercadorias, a base de cálculo do ICMS
é o valor da operação. Todavia, em determinadas circunstâncias, a exemplo da
remessa de mercadoria para industrialização, não há um valor decorrente de uma
relação negocial que possa ser utilizado para fins de quantificação da base de
cálculo do imposto.
Para estas situações, o inciso III, e §§1º e
2º, do artigo 15, da referida Lei Complementar, estabelece que:
"Art. 15. Na falta do valor a que se referem os incisos I e
VIII do art. 13, a base de cálculo do imposto é:
[...]
III - o preço FOB
estabelecimento comercial à vista, na venda a outros comerciantes ou
industriais, caso o remetente seja comerciante.
§ 1º Para
aplicação dos incisos II e III do caput, adotar-se-á sucessivamente:
I - o preço
efetivamente cobrado pelo estabelecimento remetente na operação mais recente;
II - caso o
remetente não tenha efetuado venda de mercadoria, o preço corrente da
mercadoria ou de seu similar no mercado atacadista do local da operação ou, na
falta deste, no mercado atacadista regional.
§ 2º Na hipótese do inciso III do caput, se o estabelecimento
remetente não efetue vendas a outros comerciantes ou industriais ou, em
qualquer caso, se não houver mercadoria similar, a base de cálculo será
equivalente a setenta e cinco por cento do preço de venda corrente no varejo."
Da análise do citado dispositivo
legal, evidencia-se que na falta de um valor determinável da base de cálculo,
cabe ao estabelecimento comercial adotar o preço FOB praticado na venda à
vista, a outros comerciantes ou industriais. Expressa ainda nos seus §§ 1º e 2º
que os critérios a serem aplicados para definição do preço deve
observar a seguinte ordem: a) o preço FOB da operação, à vista, mais
recente; b) o preço FOB corrente da mercadoria, à vista, no mercado atacadista
local ou regional; c) 75% do preço praticado no varejo, se não ocorrerem vendas
a comerciantes ou industriais.
Do exposto, é possível inferir
que, nas remessas para industrialização com posterior retorno, se o
contribuinte também vende a mercadoria a outro comerciante ou industrial,
aplicará diretamente este preço para aquelas operações (art.
15, §1º, inciso I). De igual modo, se apenas realiza vendas das mercadorias
para o comércio varejista, a base de cálculo será equivalente a 75% do preço de
venda no varejo (art. 15, §2º). Observe-se que nos dois casos o contribuinte
possui elementos suficientes, que podem ser extraídos das operações próprias,
para fins de identificação do preço das mercadorias.
Contudo, o mesmo não ocorre se o
comerciante não realiza a venda da mesma mercadoria, a exemplo de quando é submetida
a processo de industrialização, para posterior comercialização. Neste caso, a
alternativa legal é a adoção do preço corrente no mercado atacadista local ou
regional, ou na sua falta, 75% do preço corrente aplicado por outros
contribuintes nas vendas no varejo.
Feitas estas considerações
preliminares, cabe avaliar em que circunstâncias pode ser adotada
a pauta de valores para fins de fixação da base de cálculo. A autorização
para criação de pauta de valores, mediante arbitramento, tem seu fundamento no
artigo 148, do Código Tributário Nacional, que assim dispõe:
"Art. 148. Quando o cálculo do tributo tenha
por base, ou tome em consideração, o valor ou o preço de bens, direitos,
serviços ou atos jurídicos, a autoridade lançadora, mediante processo regular,
arbitrará aquele valor ou preço, sempre que sejam omissos ou não mereçam fé as
declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os documentos expedidos pelo
sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado, ressalvada, em caso de
contestação, avaliação contraditória, administrativa ou judicial."
A legislação estadual
catarinense disciplinou a matéria no artigo 18, da Lei nº 10.297, de 26 de
dezembro de 1996:
"Art. 18. Sempre que forem omissos
ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos prestados, ou os
documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro legalmente obrigado,
a base de cálculo do imposto será arbitrada pela autoridade fiscal, na forma
prevista no regulamento.
§ 1°
Para o arbitramento a que se refere este artigo, a autoridade fiscal valer-se-á
dos elementos e dados que possa colher junto:
I - a
contribuintes que promovam operações ou prestações semelhantes;
II -
ao próprio sujeito passivo, relativamente a operações ou prestações realizadas
em períodos anteriores;
III -
a outras fontes previstas em regulamento.
§ 3° A
Secretaria da Fazenda expedirá pauta fiscal cujos valores poderão ser
utilizados nas hipóteses e para os fins previstos neste artigo."
(grifo nosso)
Denota-se que a adoção do
arbitramento só é cabível quando forem omissos ou não mereçam fé as declarações
prestadas pelo sujeito passivo. Nestes casos, para obtenção do valor ou preço,
caberá ao Fisco a observância dos seguintes requisitos: a) a formalização de
processo de arbitramento; b) a demonstração objetiva dos meios e da forma
utilizados para obtenção dos valores ou preços arbitrados; c) a comprovação de
que as declarações prestadas pelo sujeito passivo não são verdadeiras d) a
garantia da ampla defesa ao sujeito passivo.
O arbitramento é usualmente
efetuado quando diante de verificação de ofício, o Fisco é confrontado com
informações prestadas pelo sujeito passivo que considera
inverídicas ou se estas forem inexistentes. É o que ocorre na
constatação de transporte de mercadorias sem documento fiscal ou na emissão de
documentos fiscais com valores supostamente inferiores aos praticados para a
operação.
Com a mesma finalidade, os entes
estatais têm adotado ainda pauta de valores genérica, que é elaborada
usualmente com base em levantamento de preços de mercado de bens, produtos,
mercadorias ou serviços. Após a sua elaboração, a pauta é publicada em órgão
oficial, com estipulação de prazo para contestação dos interessados.
Assim, a pauta de valores
apresenta-se como um parâmetro que pode ser utilizada pelo Fisco, mas sempre
limitada às situações previstas no artigo 148, do Código Tributário Nacional. Para os casos em
que ocorre uma venda firme, com preço certo e ajustado, a base de cálculo será
o valor da operação, salvo se comprovada a sua inveracidade.
É nessa linha que tem seguido a
jurisprudência, a exemplo de recente decisão do Supremo Tribunal Federal, no
Recurso Extraordinário nº 278.348, de 05/03/2013:
"ICMS. Pauta de valores. A vedação à
utilização das pautas e as hipóteses excepcionais que permitem o
arbitramento da base de cálculo pelo Fisco constam
de diplomas infraconstitucionais. Eventual desacerto da tese firmada
implicaria tão somente uma ofensa reflexa. Contencioso que repousa no âmbito da
legalidade. 1. A pauta de valores só é admitida nos casos previstos no art. 148
do CTN, em que, mediante processo regular, seja arbitrada a base de
cálculo." (AG. REG. RE nº 278.348, 05/03/2013. Espírito Santo. Relator:
Min. Dias Toffoli.)
Corroborando o mesmo
entendimento, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina proferiu diversos
acórdãos, em que delimita o campo de aplicabilidade da pauta de valores aos
estritos termos do disposto no artigo 148, do Código Tributário Nacional:
"ICMS. Pauta de valores mínimos.
Processo regular de arbitramento. Excepcionalmente, admite-se a quantificação
do ICMS com base em pauta de valores mínimos, mediante
processo regular de arbitramento, sempre que sejam omissas ou inidôneas as
declarações prestadas pelo contribuinte." (Tribunal de Justiça SC.
Apelação Civil nº 2001.010590-0, Des. Sônia Maria Schmitz;
Publicação: 02/08/2005)
"TRIBUTÁRIO. ICMS. Pauta de Valores Mínimos.
Lançamento após processo administrativo regular de arbitramento, instaurado com
observância do art. 148 do CTN. Legalidade, no caso concreto, apesar da base de
cálculo do tributo ser o valor que decorrer da saída da mercadoria.
[...] Apesar da ilegalidade
da pauta de valores mínimos como base de cálculo
do ICMS, nada obsta sua utilização, após o devido processo administrativo
de arbitramento, na forma do art. 148 do Código Tributário Nacional, como
parâmetro para a fixação do quantum devido, se inidôneos os documentos e
declarações prestadas pelo contribuinte." ( TJ-SC
- Apelação Civel nos autos nº 1988.087036-0, Des.
Pedro Manoel Abreu. Publicação: 30/04/1997)
"TRIBUTÁRIO - ICMS -
TRANSPORTE DE MERCADORIAS COM DOCUMENTAÇÃO FISCAL FRAUDULENTA (SUBFATURAMENTO)
- BASE DE CÁLCULO ARBITRADA
CONFORME PAUTA DE VALORES MÍNIMOS - POSSIBILIDADE - EXEGESE
DO ART. 148 , DO CTN - AUSÊNCIA DO DEVIDO PROCESSO
LEGAL - INOCORRÊNCIA. O transporte de mercadorias com documentação fiscal
fraudulenta caracteriza infração tributária, autorizando o Fisco, com base no
que dispõe o art. 148, do CTN, a utilizar a pauta de valores mínimos
para arbitrar a base de cálculo do ICMS. Para tal arbitramento exige-se o
processo administrativo em que se permita a ampla defesa do contribuinte. O
devido processo legal administrativo e o contraditório devem ser considerados
cumpridos, no entanto, se o contribuinte, ao assinar a notificação fiscal,
ficou cientificado para impugnar o lançamento no prazo dado, e não exerceu seu
direito de defesa." (TJ-SC - Embargos Infringentes nos autos nº
2005.011006-9. Des. Jaime Ramos. Publicação: 12/07/2006)
Dos fundamentos trazidos à apreciação,
há argumentos suficientes para concluir que nas remessas de produtos a serem
industrializado em outro Estado, não há que se cogitar a utilização de preços
de mercadorias fixados em pauta de valores.
Do mesmo modo, também não há
possibilidade de aplicação da sistemática pretendida pela Consulente, qual seja, utilizar o preço de compra do fumo em folha do
produtor rural, como critério definidor da base de cálculo, por ausência de
autorização legal. A determinação da base de cálculo, para o caso em análise,
far-se-á de acordo com o disposto no inciso III, do artigo 15, da Lei
Complementar nº 87/96.
Resposta
Isto posto,
responda-se à Consulente que na remessa de produtos primários para
industrialização noutro Estado da Federação, sendo o contribuinte
estabelecimento comercial, para a determinação do valor que comporá a base de
cálculo do imposto deverá observar, sucessivamente: a) o preço FOB à vista
cobrado pelo estabelecimento remente na operação mais recente; b) o preço FOB à
vista praticado pelo mercado atacadista local ou regional; c) 75% do preço de
venda corrente no varejo.
JOACIR SEVEGNANI
AFRE IV - Matrícula: 1849336
De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela
COPAT na Sessão do dia 28/08/2014.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do §
4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT),
aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer
tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à
consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de
Resolução Normativa que adote diverso entendimento.
Nome |
Cargo |
CARLOS ROBERTO MOLIM |
Presidente COPAT |
MARISE BEATRIZ KEMPA |
Secretário(a) Executivo(a) |