ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 15/2025

N° Processo 2570000004907


Ementa

ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO CONCEDIDO NAS SAÍDAS DE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS EM CUJA FABRICAÇÃO HOUVER SIDO UTILIZADO MATERIAL RECICLÁVEL DE QUE TRATA O ART. 19 DA LEI Nº 14.967/2009. NOS TERMOS DO ART. 21, § 38, I A III, DO ANEXO 2 DO RICMS/SC-01, PARA FINS DE FRUIÇÃO DO BENEFÍCIO, SOMENTE PODE SER CONSIDERADO MATERIAL PRÉ-CONSUMO O RESÍDUO, MATERIAL RESULTANTE DA ATIVIDADE HUMANA QUE SERIA DESCARTADO. NÃO SE ENQUADRAM NO CONCEITO DE RESÍDUO COPAS, GALHOS, CASCAS E DEMAIS COMPONENTES RESULTANTES DO CORTE DA MADEIRA, UMA VEZ QUE ELES NÃO SÃO RESÍDUOS QUE SERIAM DESCARTADOS, MAS SIM A PRÓPRIA MATÉRIA-PRIMA PRINCIPAL DA FABRICAÇÃO DO MDF, CUJA UTILIZAÇÃO É ECONOMICAMENTE VIÁVEL INDEPENDENTEMENTE DA CONCESSÃO OU NÃO DE BENEFÍCIO FISCAL.


Da Consulta

A consulente se dedica à fabricação de móveis produzidos com o material Medium Density Fiberboard (MDF), utilizando “resíduos de reflorestamento, galhos, copas, cascas, restos de madeira e cavacos, adquiridos e reciclados em seu processo produtivo”.

Após detalhar tal processo produtivo e colacionar legislação ambiental relativa ao tema, argumenta, em suma, que tais materiais (que seriam desviados do fluxo do “processo de manufatura de reflorestamento” e que, segunda alega a consulente, se não fossem reciclados, seriam simplesmente descartados na natureza) se enquadrariam como “material pré-consumo”, e, portanto, no conceito de “material reciclável” para fins de fruição do benefício fiscal de crédito presumido concedido nas saídas de produtos industrializados em cuja fabricação houver sido utilizado material reciclável, nos termos do art. 19 da Lei nº 14.967, de 7 de dezembro de 2009.

A autoridade fiscal deu tramitação à consulta.

É o relatório, passo à análise. 


Legislação

Lei nº 14.967, de 7 de dezembro de 2009, art. 19;

RICMS/SC-01, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, Anexo 2, art. 21, caput, XII, e § 38; e

Lei federal nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, art. 3º, caput, XVI.


Fundamentação

O art. 19 da Lei nº 14.967, de 7 de dezembro de 2009, concede, nos termos e condições previstas em regulamento, crédito presumido nas saídas de produtos industrializados em cuja fabricação houver sido utilizado material reciclável que corresponda a, no mínimo, 50% da composição da matéria-prima utilizada:

Art. 19. Ao fabricante de produtos industrializados em que o material reciclável corresponda a, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) da composição da matéria-prima utilizada, poderá ser concedido, mediante tratamento tributário diferenciado autorizado pela Secretaria de Estado da Fazenda, e nos termos e condições previstas em regulamento, crédito presumido de até:

(...)


Ao regulamentar o mencionado dispositivo legal, o § 38 do art. 21 do Anexo 2 do Regulamento do ICMS (RICMS/SC-01), introduzido pelo Decreto nº 1.806, de 14 de março de 2022, estabelece os conceitos para definição de “conteúdo reciclado”, conforme as normas técnicas pertinentes:

Art. 21. (...)

§ 38. Para fins do disposto no inciso IX do § 22 deste artigo, considera-se conteúdo reciclado a proporção em massa de material reciclado em um produto ou uma embalagem, observado o seguinte:

I – somente materiais pré-consumo e pós-consumo devem ser considerados como conteúdo reciclado;

II – considera-se material pré-consumo o material desviado do fluxo de resíduos durante o processo de manufatura;

III – fica excluída do inciso II deste parágrafo a reutilização de materiais, tais como retrabalho, retrituração ou sucata, gerados em um processo e capazes de serem reaproveitados dentro do mesmo processo que os gerou;

IV – considera-se material pós-consumo o material gerado por domicílios ou por instalações comerciais, industriais e institucionais como usuários finais do produto, que já não pode mais ser usado para o fim ao qual se destina, incluindo-se as devoluções de material da cadeia de distribuição; e

 (...) Grifou-se


Como se vê, para fruição do benefício em análise, somente podem ser considerados como conteúdo reciclado os materiais pré-consumo e pós-consumo. E as copas, cascas galhos e outros componentes utilização na fabricação de MDF não se enquadram no conceito de material pós-consumo, tendo em vista que não são gerados pelos usuários finais do produto.

Resta, portanto, definir se se enquadram no conceito de material pré-consumo, que é aquele “desviado do fluxo de resíduos durante o processo de manufatura”. E, conforme a legislação juntada pela própria consulente, o conceito de resíduo sólido está previsto no inciso XVI do caput do art. 3º da Lei federal nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: (...)

XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível;

(...) Grifou-se

 

Como se vê, apenas pode ser considerado como material pré-consumo o resíduo, material resultante das atividades humanas que, em condições normais, seria descartado. É justamente para evitar esse descarte, reintroduzindo no processo produtivo algo que não seria aproveitado, que as cadeias de logística reversa e reciclagem são incentivadas, e, do ponto de vista tributário, é concedido benefício fiscal na industrialização de produtos que utilizem tal matéria-prima reciclável.

Especificamente no caso em análise, copas, galhos, cascas e demais componentes gerados no corte da madeira não se enquadram no conceito de material pré-consumo, uma vez que, ao contrário do que afirma a consulente, não são resíduos que seriam “simplesmente descartados na natureza”.

Na verdade, eles são a própria matéria-prima principal utilizada na fabricação do MDF, tipo de material amplamente utilizado na indústria de móveis, e sua utilização é economicamente viável independentemente da concessão ou não de benefício fiscal.

O fato de o objetivo principal de o corte da madeira ser a “produção de madeira, tabuas, vigas para uso na construção civil e fabricação de móveis e outros”, como afirma a consulente, não significa que as cascas, galhos e demais sejam resíduos que seriam descartados. Como a grande maioria dos produtos vegetais e animais, a madeira de reflorestamento tem diversos componentes que podem ser economicamente aproveitados de variadas formas, e tais materiais são apenas uma das formas.

Ademais, veja-se que, nos termos do inciso III do § 38 do art. 21 do Anexo 2 do RICM/SC-01, nem mesmo os materiais gerados em um processo e capazes de serem reaproveitados dentro do mesmo processo podem ser considerados material pré-consumo, pois o reaproveitamento desses materiais já seria economicamente vantajoso em qualquer cenário – e o intuito do benefício, conforme dito, é incentivar que seja dado fim diverso a materiais que, não fosse o incentivo, seriam descartados na natureza.

Ressalte-se, por fim, que o mencionado dispositivo do Regulamento foi submetido à análise do Poder Judiciário catarinense, que entendeu pela sua legalidade e compatibilidade com as normas ambientais, uma vez que os materiais que não seriam descartados não podem ser considerados material reciclável para fins de fruição de benefício fiscal:

(...) Adiro à divergência inaugurada pelo eminente Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, refluindo do posicionamento inicialmente adotado para considerar que as sobras do processo de acabamento não podem ser consideradas como resíduos para fins de obtenção do benefício fiscal, materiais que possuem maior valor para as fundições do que a própria matéria-prima original, em virtude de sua composição química refinada.

 

Na prática, tais materiais não são descartados pelas fundições, como exige a Lei n. 12.305/10, ao definir resíduo como "material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido".

 

Sob o ponto de vista da norma ambiental, realmente não haveria nenhum sentido considerar como material reciclável as sucatas geradas em um processo e capazes de serem reaproveitados dentro desse mesmo processo industrial. (...)

(TJSC - 2ª Câmara de Direito Público; Apelação nº l 5005134-43.2022.8.24.0054; Relator Des. Carlos Adilson Silva; Data de julgamento: 18/07/2023) Grifou-se


Resposta

Pelos fundamentos acima expostos, responda-se à consulente que que copas, galhos, cascas e outros materiais utilizados para a fabricação de MDF são umas das matérias-primas principais resultantes do corte da madeira, e não resíduos que seriam comumente descartados caso não fosse incentivada sua reutilização, razão pela qual não se enquadram no conceito de material pré-consumo para fins de fruição do benefício fiscal de crédito presumido nas saídas de produtos industrializados em cuja fabricação houver sido utilizado material reciclável, concedido pelo art. 19 da Lei nº 14.967, de 2009.

É o parecer que submeto à apreciação desta Comissão Permanente de Assuntos Tributários.



ERICH RIZZA FERRAZ
AUDITOR FISCAL DA RECEITA ESTADUAL - Matrícula: 6170536

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 20/02/2025.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
DILSON JIROO TAKEYAMA Presidente COPAT
FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA Gerente de Tributação
NEWTON GONÇALVES DE SOUZA Presidente do TAT
CAROLINA VIEITAS KRAJNC ALVES Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 13/03/2025 14:50:24