ESTADO DE SANTA CATARINA
SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA
COMISSÃO PERMANENTE DE ASSUNTOS TRIBUTÁRIOS
RESPOSTA CONSULTA 8/2025

N° Processo 2470000019834


Ementa

ICMS. APROPRIAÇÃO DE CRÉDITO POR PRESTADOR DE SERVIÇO DE TRANSPORTE. TRANSFERÊNCIA DE CRÉDITOS ENTRE ESTABELECIMENTOS DE MESMA TITULARIDADE. AUSÊNCIA DE REMESSA INTERESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE.


Da Consulta

A consulente informa que tem por atividade principal o serviço de transporte rodoviário de cargas e opera uma complexa logística de entrega de mercadorias que abrange diversos estados do Brasil, estando sua matriz localizada em uma cidade do Estado do Paraná.

Aduz que é comumente contratada para a realização de transporte de carga para diversos municípios do Estado de Santa Catarina. O abastecimento inicial dos veículos é realizado na sua unidade de Curitiba, onde há um tanque para abastecimento de sua frota de caminhões.

Muitas vezes, cumprem frete do Paraná com destino a Santa Catarina e, na viagem de retorno do caminhão para o Paraná, iniciam novo serviço de frete em Santa Catarina com destino ao estado vizinho.

Ante a capacidade do tanque de combustível dos caminhões, por vezes não se mostra necessário o abastecimento do veículo para cumprir o frete de retorno, iniciado em Santa Catarina e destinado ao Paraná.

Assim, a consulente adquire no Estado do Paraná o combustível necessário para operacionalizar o frete, sendo que a apuração e o creditamento do ICMS sobre os insumos são realizados naquele Estado para as operações nele iniciadas. Já quanto aos fretes iniciados em Santa Catarina, a consulente realizada o pagamento do imposto decorrente da operação de frete e não possui crédito referente às entradas de combustível para abater do valor devido, uma vez que toda a aquisição de insumos ocorreu no Paraná e foi parcialmente consumida na operação iniciada naquele Estado.

A consulente entende legítima a possibilidade de tomada de crédito de ICMS gerado pela aquisição do combustível (insumo utilizado) proporcional ao frete iniciado em Santa Catarina, com a realização do rateio e transferência de crédito de ICMS entre as filiais, já que a aquisição do combustível foi realizada pela filial do PR. Argui os artigos 29, 34 e 36 do Regulamento do ICMS de Santa Catarina (RICMS/SC-01) e, diante de omissão da legislação tributária catarinense quanto à possibilidade de creditamento proporcional de ICMS em relação à aquisição de combustível utilizado no frete iniciado em Santa Catarina, mas abastecido no Paraná, apresenta os seguintes questionamentos:

1 - É possível, em um exemplo como o descrito, emitir uma Nota Fiscal de Transferência de Crédito de ICMS entre as filiais referente ao combustível utilizado no trecho SC-PR, para que possa alocar parte do crédito de ICMS gerado pelo abastecimento realizado no PR, de forma a poder utilizar esse crédito em Santa Catarina e otimizar o aproveitamento tributário, com a não cumulatividade do ICMS?

2 - Nessa situação, será realizado um controle proporcional e sistemático desse crédito de ICMS. Esse controle poderá ser registrado em uma conta gráfica, permitindo a emissão de uma Nota Fiscal única no final do mês pela filial (0003-60), consolidando os fretes realizados pela Consulente e os créditos de ICMS proporcionais, de forma que seja eficiente e transparente para o fisco e contribuinte?

A autoridade fiscal manifestou-se favoravelmente quanto às condições de admissibilidade, dando-lhe tramitação.

É o relatório, passo à análise. 


Legislação

RICMS/SC-01, aprovado pelo Decreto 2.870, de 27 de agosto de 2001, art. 29, § 8º; art. 34, V; art. 36, § 2º, II.


Fundamentação

A Lei Complementar nº 192, de 11 de março de 2022, em conformidade com a alínea “h” do inciso XII do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal, estabeleceu os combustíveis sujeitos à incidência única do ICMS. Essa lei determinou que as alíquotas do imposto seriam específicas (ad rem), definidas por unidade de medida adotada, e estipuladas mediante deliberação conjunta dos Estados e do Distrito Federal. Entre os combustíveis mencionados na referida lei está o óleo diesel.

Para regulamentar o regime de tributação monofásica do ICMS, o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) celebrou o Convênio ICMS nº 199, de 22 de dezembro de 2022. Esse convênio dispõe sobre a aplicação do ICMS nas operações com combustíveis e estabelece, em sua cláusula segunda, inciso II, que “em relação a cada combustível, as alíquotas serão específicas (ad rem) por unidade de medida (litro ou quilograma)”.

Com a nova sistemática, o óleo diesel, assim como os demais combustíveis previstos na Lei Complementar nº 192, de 2022, deixou de ser tributado pelo ICMS em cada etapa de sua cadeia de produção e circulação. A tributação passou a ocorrer de forma única, incidindo exclusivamente na saída do produtor e de agentes a ele equiparados, além do importador de combustíveis. Este Convênio foi internalizado na legislação catarinense no art. 112 do Regulamento do ICMS.

Ademais, foi celebrado o Convênio ICMS nº 26, de 14 de abril de 2023, internalizado na legislação catarinense no § 5º do art. 112 do Regulamento do ICMS, reconhecendo expressamente, na sistemática da incidência monofásica, o direito ao creditamento do ICMS decorrente da entrada do diesel utilizado como insumo pelo sujeito passivo:

Art. 112. Com fundamento na alínea “h” do inciso XII do § 2º  do art. 155 da Constituição da República e na Lei Complementar federal nº 192, de 11  de março de 2022, em substituição ao regime normal de incidência previsto neste Regulamento, o imposto incidirá uma única vez, qualquer que seja a sua finalidade, nas operações, ainda que iniciadas no exterior, com os seguintes combustíveis:

I – diesel e biodiesel;

(...)

§ 5º Observadas as condições e vedações estabelecidas na legislação tributária e nos convênios de que trata o § 1º deste artigo, é assegurado o direito de se creditar do imposto decorrente da entrada dos combustíveis relacionados nos incisos do caput deste artigo, submetidos ao regime de incidência de que trata este artigo, quando utilizados como insumo pelo sujeito passivo (Convênio ICMS 26/23).

Especificamente quanto à apropriação do crédito por parte do prestador do serviço de transporte, temos o § 8º do art. 29 do RICMS/SC-01:

§ 8º Para a apropriação, pelo prestador de serviço de transporte, do crédito do imposto incidente sobre a entrada de combustíveis, lubrificantes, aditivos, fluidos, pneus, câmaras de ar e peças de reposição, efetivamente utilizados na prestação de serviço de transporte em que o Estado seja sujeito ativo, o documento fiscal e eventuais documentos referenciados deverão conter (§ 3º do art. 22 da Lei nº 10.297, de 1996):

I – o nome ou a razão social, o endereço, a inscrição estadual e o CNPJ do destinatário; e

II – tratando-se de operações com combustíveis, a placa do veículo abastecido.

Nota-se que o dispositivo não trata da transferência de insumos entre estabelecimentos de mesmo titular.

Igualmente, não auxiliam o pleito da consulente as disposições presentes nos §§ 2º e 3º do art. 36 do RICMS/SC-01:

§ 2° Deverão ainda ser estornados, proporcionalmente ao respectivo faturamento, observado o disposto no art. 38, § 1º, os créditos incorridos:

I - na prestação do serviço, por estabelecimentos que praticarem operações e prestações sujeitas ao ICMS e ao imposto sobre serviços, de competência municipal;

II - na prestação de serviço de transporte iniciado em outro Estado.

§ 3º Deverão ser estornados, proporcionalmente ao respectivo faturamento, os créditos previstos no § 8º do art. 29 deste Regulamento incorridos na prestação de serviço de transporte em que o Estado não seja sujeito ativo.

No caso apresentado, a cadeia de apropriação do diesel adquirido no estado do Paraná é encerrada no momento em que ocorre o abastecimento dos caminhões a partir do tanque existente na filial situada em outra unidade da federação. Deixa-se de falar, portanto, em transferência de mercadoria.

Essa particularidade relacionada aos combustíveis é facilmente compreensível pela observação prática: nenhum caminhão é obrigado a portar documentação fiscal referente ao combustível abastecido diretamente no tanque, ou seja, ao que está sendo consumido durante a viagem. Diferentemente, quando o combustível mantém o status de mercadoria e é transportado em compartimento próprio, deve-se observar rigorosamente as normas aplicáveis ao transporte de combustíveis e à emissão de documentos fiscais.

Ademais, e ao contrário do que a consulente poderia argumentar, tal entendimento não implica na vedação ao crédito tributário. É perfeitamente permitido à empresa realizar o abastecimento de caminhões-tanque, apropriados para o transporte de combustíveis, a partir do tanque localizado na filial situada em outra unidade da federação, com a finalidade de remeter o combustível a outro tanque localizado no mesmo estado. Nesse caso, é necessário emitir a documentação fiscal apropriada antes da saída da mercadoria, observando estritamente as normas sobre o transporte e a transferência de mercadorias.

O que não se pode admitir é que o próprio contribuinte consuma o insumo e, de forma livre, decida quando este estará sendo considerado uma mercadoria em transferência. É importante destacar que considerar o combustível já abastecido no tanque de um veículo como mercadoria em trânsito é uma argumentação que não se sustenta. Não há como o transportador prever, com exatidão, quanto será efetivamente consumido durante a viagem inicial e quanto permanecerá disponível para a viagem final. Assim, não é possível emitir uma documentação fiscal com base em meras estimativas ou suposições.

De todo modo, convém mencionar a Lei nº 18.900, de 13 de maio de 2024 (oriunda da Medida Provisória nº 263, de 22 de fevereiro de 2024), que passou a disciplinar a transferência de crédito decorrente da remessa de bens e mercadorias para estabelecimento de mesma titularidade. Houve o acréscimo do § 5º ao art. 4º da Lei nº 10.297, de 26 de dezembro de 1996, segundo o qual não há fato gerador quando da movimentação de bens e mercadorias de um estabelecimento para outro que pertença ao mesmo titular.

Nessa situação, o crédito referente às operações e prestações realizadas anteriormente é mantido em favor do contribuinte, inclusive nos casos de transferências interestaduais, sendo os créditos garantidos ao contribuinte quando o estabelecimento destinatário recebe, de outro estabelecimento do mesmo titular localizado em outro estado, bens ou mercadorias por transferência de crédito, limitado aos percentuais definidos pelo inciso IV do § 2º do art. 155 da Constituição Federal.

Ocorreu, também, a inclusão da Seção VI ao Capítulo IV da Lei nº 10.297, de 1996, com a introdução dos arts. 31-A e 31-B.

O art. 31-A[1] estabelece que, nas remessas interestaduais de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, o crédito do ICMS incidente nas operações anteriores pode ser transferido para o estabelecimento de destino.

No caso de combustíveis como o diesel, há a tributação no regime monofásico, que concentra a incidência do ICMS em uma única etapa da cadeia produtiva, geralmente no produtor ou importador, não havendo previsão legal para a transferência do imposto na forma estabelecida pelo art. 31-A, uma vez que o imposto já foi recolhido na origem (pelo produtor ou importador), e as operações subsequentes não geram crédito de ICMS. Ainda, o dispositivo se refere a situações em que há tributação regular do ICMS ao longo da cadeia, o que não ocorre no caso de produtos tributados no regime monofásico.



[1] Art. 31-A. Na remessa interestadual de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, deverá ser realizada a transferência de crédito do imposto incidente nas operações e prestações anteriores de que trata o § 5º do art. 4º desta Lei para o estabelecimento de destino, observados o disposto nesta Seção e a forma prevista na regulamentação desta Lei.

 

Parágrafo único. A apropriação do crédito recebido em transferência deverá observar as condições e os limites estabelecidos nesta Seção.

 


Resposta

Diante do exposto, informe-se à consulente que o combustível é considerado consumido no momento em que ocorre o abastecimento do veículo a partir do tanque localizado na filial. Nessa situação, fica vedada a emissão de documento fiscal para transferência de mercadoria.

Esclarece-se que somente o combustível que não tenha sido utilizado para abastecimento, ou seja, aquele ainda armazenado nos tanques da filial, pode ser transferido para outro tanque situado em filial localizada no mesmo estado. Para tanto, é necessário que o combustível a ser transferido esteja devidamente acondicionado em recipientes próprios para o transporte de combustíveis (ainda considerados como mercadoria) e que se observe rigorosamente as normas regulamentadoras do transporte desse tipo de produto, além da legislação tributária pertinente. Em especial, exige-se a emissão do documento fiscal correspondente antes do início da movimentação da mercadoria, conforme disposto no inciso I do art. 33 do Anexo 5 do RICMS.

Assim, não é possível emitir uma Nota Fiscal de Transferência de Crédito de ICMS entre as filiais referente ao combustível utilizado no trecho entre Santa Catarina e Paraná, já que a legislação catarinense exige, como condição para a transferência de crédito, que haja remessa interestadual de bens ou mercadorias. Ainda, o regime monofásico do diesel não permite o acúmulo ou a transferência de créditos de ICMS, uma vez que o tributo já foi recolhido na etapa inicial da cadeia produtiva ou distributiva, sem destaque de imposto em etapas subsequentes.

É o parecer que submeto à apreciação desta Comissão Permanente de Assuntos Tributários.



ANDRE CAPOBIANGO AQUINO
AUDITOR FISCAL DA RECEITA ESTADUAL - Matrícula: 6454275

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 20/02/2025.
A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586, de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Nome Cargo
DILSON JIROO TAKEYAMA Presidente COPAT
FABIANO BRITO QUEIROZ DE OLIVEIRA Gerente de Tributação
NEWTON GONÇALVES DE SOUZA Presidente do TAT
CAROLINA VIEITAS KRAJNC ALVES Secretário(a) Executivo(a)

Data e Hora Emissão 13/03/2025 14:50:02